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Projeto de Lei dos Estados Unidos sobre o GPS – Geolocational Privacy and Surveillance Act

18/11/2020

Ericson Scorsim. Advogado e Consultor no Direito da Comunicação. Doutor em Direito pela USP. Autor da Coleção de Livros sobre Direito da Comunicação.

            O sistema de geolocalização por GPS (Global Positioning System) foi criado pelo Departamento de Defesa dos Estados Unidos. Sua finalidade principal é assegurar informações de geolocalização de pessoas, objetivos, veículos, entre outros. Até hoje, está sob supervisão do Departamento de Defesa e da Força Aérea.  Porém, a tecnologia é autorizada para uso civil.[1] Apesar dos benefícios civis e militares do GPS, é uma das tecnologias símbolo da era da vigilância eletrônica por estados e empresas, uma das mais invasivas à medida que proporciona informações em tempo real sobre a localização de pessoas.  Deste modo, a tecnologia mestre em coleta de dados em tempo real, por redes de telecomunicações.  É uma tecnologia considerada de dual-use, isto é, de uso civil e militar. Registre-se que o GPS tem inúmeras aplicações na economia: transportes (rastreamento de veículos e cargas), comércio (geolocalização de consumidores para fins de publicidade comercial), navegação aérea, transporte marítimo (navegação de navios), agricultura de precisão, geosensoriamento, espacial, ferrovias, mapeamento, serviços ambientais, segurança pública, entre outros.  Por exemplo, máquinas agrícolas contam com sistema de GPS. Sem conectividade, no entanto, este equipamentos agrícolas não podem se conectar à rede de internet.  O sistema de GPS é totalmente compatível com as infraestruturas de telecomunicações móveis, por celulares. Há projetos da Força Aérea norte-americana para avançar na eficiência do sistema de GPS e as redes móveis de celulares. Assim, qualquer celular do globo poderá ser localizado pelo sistema GPS. Neste aspecto, a tecnologia de GPS é relevantíssima para a coleta de sinais de inteligência pelo governo norte-americano. Serve como instrumento em operações militares em teatros de guerra.

            O sistema de geocalização baseia-se em infraestrutura de telecomunicações por satélites distribuídos por todo o globo. Atualmente, há uma constelação de 33 (trinta e três) satélites espalhados ao redor do globo que garantem o funcionamento do GPS. Há antena de GPS na ilha Ascensão situada no Atlântico, com capacidade de coletar sinais de inteligência na região.  

            Há projetos de lei sobre o GPS. Um deles é o Geolocational Privacy and Surveillance Act – GPS Act.[2] Há normas sobre interceptação e divulgação de informação geolocalização. Também, o projeto de lei  proíbe da utilização informação de geolocalização como prova. Além disto, previsão de cobertura de danos civis por interceptação, divulgação ou violação das informações sobre geolocalização. Ademais, há norma sobre fraudes para obtenção de informação sobre geolocalização.

            Mas, qual é a razão deste projeto de lei? Frequentemente, autoridades de investigação norte-americanas utilizem a tecnologia para obter informações sobre movimentos de geolocalização de pessoas suspeitas de práticas de crimes, algumas inclusive sem autorização judicial. Houve um caso levado aos Tribunais de implantação de sistema de rastreamento de veículo por GPS, para monitorar as movimentações de um suspeito de crime. Houve abusos na utilização do GPS que motivaram entidades de direitos civis a buscar colocar limites legais, em defesa da privacidade e segurança de cidadãos norte-americanos.[3]

            Em outro caso, as autoridades de investigação criminal adotaram software que simulam o sinal das torres de telefonia celular, a fim de promover a interceptação das comunicações, sem autorização judicial, o que ensejou a judicialização do caso.[4]

            Igualmente, no projeto de lei acima referido, refere-se aos limites na implantação de instalações no território dos Estados Unidos de estações de recepção de sinal de satélite por governo estrangeiro. A finalidade da regra é controlar o acesso à tecnologia de GPS por governos de outros países.

            Por outro lado, o projeto de lei The Fiscal Year 2019 prevê que os fundos relacionados ao setor de transporte não podem ser utilizados para financiar o rastreamento por GPS de passageiros em veículos motores. Assim, a medida busca estabelecer parâmetros para a privacidade dos cidadãos norte-americanos.

            Na Lei norte-americana National Defense Authorization Act for fiscal year 2020 propõe a criação de um protótipo de programa global de navegação por satélite capaz de receber sinais para ampliação da capacidade de resistência de posições militares. Os sistemas de países aliados ao GPS norte-americano: sistema Galileu da União Europeia, o GZSS do Japão, o Navic da India. O Reino Unido estuda a criação de um sistema próprio de navegação por satélite. Os sistemas não alinhados aos Estados Unidos são: o GLONASS da Rússia e o Beidou da China.

            O Brasil não possui sistema próprio de posicionamento por satélite. Assim, é mero usuário do sistema de GPS dos Estados Unidos. Por isso, há riscos geopolíticos para o Brasil na adoção da tecnologia de GPS dos Estados Unidos.  Registre-se que os Estados Unidos possuem a legislação Foreign Intelligence Surveillance Act, a qual permite a interceptação das comunicações de estrangeiros.  Neste aspecto, por razões de defesa nacional do Brasil e da defesa da confidencialidade das comunicações nas redes de telecomunicações móveis brasileiras é fundamental a atuação mais efetiva das autoridades nacionais na proteção das comunicações de brasileiros, contra o risco de interceptação por autoridades estrangeiras.

            Em relatório do Departamento de Segurança Interior ao Congresso dos Estados Unidos, explica a perda do sinal do GPS implica em sérios danos à economia norte-americana. Trinta dias sem sinal de GPS poderia custar U$ 1 (hum) bilhão de dólares por dia à economia norte-americana.[5]

Com a tecnologia de 5G e IoT, ampliam-se os riscos de monitoramento por GPS em invasão à privacidade de pessoas e empresas, bem como os riscos de ataques cibernéticos às redes de telecomunicações móveis. Por isso, a necessidade atuação firme do legislador para proteger dados pessoais e dados não pessoais.

            Enfim, a tecnologia de GPS, sem dúvida alguma, proporciona inúmeras utilidades econômicas. Há informações valiosas nas redes de telecomunicações móveis. Porém, esta tecnologia lida com dados pessoais, relacionadas à geolocalização de pessoas. É a tecnologia símbolo da hipervigilância eletrônica estatal e empresarial, inclusive à coleta de dados em tempo real.  Há, ainda, riscos de ataques cibernéticos às redes de telecomunicações móveis. Por isso, a proteção à privacidade, confidencialidade das comunicações e a segurança dos dados pessoais relacionados à geolocalização é um fator significativo a ser considerada pelo legislador e pela Anatel, agência responsável pelo setor de telecomunicações.             


[1] www.gps.gov

[2] Nos termos da lei, geolocation information:  “geolocation information” means with respect to a person, any information that is not the content of a communication, concerning the location of a wireless communication device or tracking device (as that ther is defined section 3177) that, in whole or in parte, is generated by or derived from the operation of that device and that could be used to  determine or infer information regarding the location of the person”.

[3] Sobre o tema, ver: Farivar, Cyrus. Habeas Data. Privacy the rise of surveillance tech. New York: Melville Publishing, 2018.

[4] Habeas data, privacy the rise of surveillance tech, obra citada, p. 174.

[5] Homeland Security. Report on Positioning, Navigation, and Timing (PNT) Backup and Complementary Capabilities to the Global Positioning System (GPS). National Defense Authorization Act Fiscal Year 2017 Report to Congress: PNT Requirements, and Analysis of Alternatives, april, 8, 2020.

Ericson M. Scorsim

Advogado e Consultor em Direito da Comunicação. Doutor em Direito pela USP. Autor da Coleção Ebooks sobre Direito da Comunicação com foco em temas sobre tecnologias, internet, telecomunicações e mídias.