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Serviço de televisão por assinatura e licitação

20/02/2014

Ericson Meister Scorsim

Resenha – Embargos de Declaração – Omissão – Tribunal ad quem que não se manifesta em acórdão acerca do argumento de que a licitação para a exploração de serviço de televisão por assinatura seria inexigível por inviabilidade de competição, ante a possibilidade de sua exploração por todos os interessados que preencham as condições impostas pela lei.

1. Síntese do Recurso Especial

No Recurso Especial n. 1.153.443 – DF, por maioria, deliberou que a questão jurídica relacionada à exigência de licitação para a outorga dos serviços de televisão por assinatura por satélite (DTH) não foi decidida pelo acórdão recorrido do Tribunal Regional Federal da Primeira Região, razão pela qual deu provimento ao recurso em razão da omissão, nos termos do art. 535, do CPC, determinando-se a nulidade do acórdão do tribunal a quo.

2. Contexto dos Fatos

Registre-se a importância do histórico dos fatos para a compreensão do julgamento do STJ.

Em 1996, o Ministério das Comunicações editou portarias administrativas para fins de outorga de permissão para exploração do serviço de telecomunicações DTH (direct to home) às empresas TVA Sistema de Televisão S/A, Globo Comunicação e Participações S/A. A outorga aconteceu antes da vigência do Decreto n. 2.196/96 que tratou dos serviços de distribuição de sinais de televisão e de áudio por satélites.

Uma ação popular questionou a legalidade das referidas portarias, sob a alegação da ausência de regular procedimento licitatório prévio à outorga dos serviços  acima mencionados.

A sentença julgou improcedente do pedido dos autores populares.  Acolheu-se o entendimento de que em razão da natureza especial do serviço não seria aplicável a exigência legal das licitações.

Em remessa oficial, o Tribunal Regional Federal da Primeira Região declarou a nulidade das portarias questionadas, determinando-se a realização do procedimento licitatório  no prazo de noventa dias, pois o mesmo seria indispensável à exploração do serviço de televisão por assinatura, via satélite, objeto da ação. Segundo o acórdão recorrido, devido à ausência de regulamentação do serviço de telecomunicações, que utiliza a tecnologia DTH, no momento da edição das portarias, não poderia ter ocorrido a outorga de permissão para sua exploração. Vale dizer, a outorga da exploração do serviço somente poderia acontecer após a edição de regulamentação da matéria.

3. Questão Central : a exigência da licitação nos serviços de TV por assinatura via satélite não foi decidida pelo tribunal a quo

A questão central consiste na ofensa causada pelo acórdão recorrido do tribunal a quo ao art. 25 da Lei 8.666/93, eis que no caso não poderia ser exigida a licitação por inviabilidade de competição. Em razão da natureza do serviço de DTH haveria a possibilidade de sua exploração por todos os interessados que preencham as condições impostas pela lei.

Nos termos do voto do Relator para o acórdão Min. Mauro Campbell Marques, seguido pela maioria dos Ministros, esta questão não foi decidida no acórdão recorrido, daí a sua nulidade e necessidade de novo julgamento pelo tribunal o quo.

De modo divergente, o voto do Min. Cezar Asfor Rocha manifestou-se: “o fundamento do acórdão regional foi a da exigência de licitação, por isso que, mesmo não havendo a imposição legal desse procedimento administrativo, ainda assim deveria se observar a seleção pública, porquanto, ao que disse a Corte, essa exigência resultaria da própria Carta Magna de 1988 (arts. 21, XI, 37, XXI, e 175).

E, ainda, o Min. declarou que a outorga dos serviços estaria enquadrada no art. 25 da Lei de Licitações e Contratos Administrativos, “porque o serviço de TV, prestado no Sistema DTH, não comporta concorrência entre diversos agentes privados prestadores”.  Em seu voto, deliberou pelo provimento do recursos das empresas para declarar a legalidade das portarias do Ministério das Comunicações.

Ademais, o voto do Min. Delgado afirmou: “Tratando-se – como se trata neste caso – de atividade, serviço ou obra do interesse da administração pública, em que não ocorre o mecanismo da competição entre diversos prestadores ou a concorrência entre eles, a licitação se mostra incabível, por lhe faltar o elemento finalístico específico, que é a escolha da melhor da proposta, quando há mais de uma (ou várias) posta à seleção administrativa”.

4. Conclusões

Lateralmente, o acórdão do STJ salientou as diferenças de regimes jurídicos entre os serviços de TV por assinatura por satélite, dos serviços de TV a cabo e dos serviços de radiodifusão (televisão aberta), porém limitando-se à análise da incidência do art. 25 da Lei 8.666/93. Porém, a grande questão a ser discutida (e não foi por que não alegada),  é sobre o afastamento integral da aplicação da Lei 8.666/93 aos serviços de telecomunicações por satélite. Isto porque eles constituem atividade econômica em sentido estrito. Serviço de TV por satélite não é serviço público. Estes não são ofertados para a administração pública, mas tão-somente para seus respectivos assinantes. E, ainda, poder-se-ia questionar a própria constitucionalidade da exigência de licitação para a prestação dos serviços de TV por satélite. Todavia, esta questão poderia ser discutida no Resp por razões processuais, mas em outras vias processuais.

Revista de Direito das Comunicações, vol. 6, São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, RDCom, pág. 246-262, julh-dez, 2012.