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Ruídos e poluição acústica. Grave lesão aos direitos fundamentais à qualidade de vida, saúde, trabalho, descanso, propriedade e meio ambiente

17/01/2022

Ruídos são causa de ameaça e lesão a diversos direitos fundamentais.  Alguns exemplos de ruídos: roçadeiras, podadeiras, sopradores de folhas, utilizados em serviços de jardinagem[1], fogos de artifício, ruídos de carros e motocicletas com escapamentos vazados, ruídos de motores de ônibus do transporte coletivo de passageiros[2], helicópteros, equipamentos elétricos/mecânicos utilizados na construção civil.[3]

O autor do presente artigo vive esta experiência da cultura tóxica dos ruídos, sendo cercado por cinco (5) condomínios poluidores acústicos com serviços de jardinagem. Mais os serviços de jardinagem e limpeza de vias públicas barulhentos realizados pela Prefeitura. Em praticamente todas as direções norte, sul, leste e oeste, o domicílio do autor é invadido pelas ondas de poluição acústica. Ruídos são causa de poluição atmosférica, elevando o nível da poluição sonora, aumentando-se a pressão sonora ambiental.

A energia sonora é refletida pelo espaço e atravessa janelas. Ruídos se propagam em ondas sonora e se propagam em diversas direções.  Ruídos violam o direito à vida, todo ser humano, especialmente, em seu lar sagrado tem o direito à qualidade de vida. O lar sagrado é o único refúgio humano. É o habitat humano é sagrado. Porém, constantemente o domicílio sofre diversas ameaças causadas por ruídos. Ruídos ofendem o direito à moradia e ao bem-estar. Ruídos ofendem o direito à saúde, pois são agentes estressores e afetam todo o sistema biológico humano, desde o sistema nervoso, digestivo, cardíaco, entre outros aspectos.[4] O stress acústico é capaz de desencadear uma série de danos à saúde física e mental. Há riscos significativos para a população de pessoas autistas. Há riscos de perda auditiva com os ruídos. Ruídos afetam o direito ao trabalho, especialmente no contexto de regime de home office. Ruídos negam o direito ao descanso.  Ruídos afetam o direito ao meio ambiente, considerando-se o direito à quietude da paisagem sonora das cidades, bem como o direito à não degradação ambiental.

Além disto, ruídos violam o direito à propriedade, considerando-se o direito dos proprietários ao uso, gozo e usufruto. Ruídos representam a violência e agressão aos vizinhos. São uma espécie de violência psicológica acústica. Causam a invasão do espaço acústico do domicílio alheio, bem como invasão de propriedade, o que seja inclusive o direito à legítima defesa para repelir a invasão de propriedade.

Deste modo, ruídos, ao ser uma ameaça, violam o direito à segurança e à integridade física e psicológica das pessoas. Lembrando-se que os crimes de perturbação ao sossego alheio e o crime ambiental, fatores para configuram a ameaça à segurança. Ruídos causam restrições à autonomia privada de moradores e proprietários em áreas residenciais. Por todas estas razões é necessária uma política ambiental para garantir a efetividade destes direitos fundamentais (direito à vida, direito ao bem-estar, direito à moradia, direito à saúde, direito ao meio ambiente, direito à propriedade), para a contenção dos ruídos urbanos e ruídos indoor, por exemplo, em condomínios, com o design de normas e procedimentos adequados às melhores práticas de inovações tecnológicas e práticas de sustentabilidade ambiental acústica. Os condomínios precisam pensar em práticas de eco sustentabilidade ambiental de seus serviços.  

As pessoas são vulneráveis diante de ameaças e lesões a seus direitos causadas pelos ruídos. Veja-se o exemplo de pessoas em regime de trabalho em home office, afetadas pelos ruídos. Observe-se o caso de estudantes em regime de escolar domiciliar (home schooling), prejudicados com os ruídos. Note-se a hipótese de pacientes em tratamento de saúde afetados pelos ruídos. Perceba-se o impacto dos ruídos na população de autistas. Também, verificam-se os danos dos ruídos ao bem estar dos animais.  Há diversas técnicas para a eliminação, substituição e isolamento dos ruídos.[5] Por isto, a relevância da atuação do poder público para a prevenção e a repressão de atos ilícitos relacionados aos ruídos.

A partir destes direitos fundamentais (direito à vida, direito à saúde, direito ao descanso, direito ao trabalho, direito ao meio ambiente), previstos na Constituição Federal, é que a legislação deve ser interpretada.

A doutrina constitucional proclama a interpretação da legislação conforme a Constituição. Assim, algumas premissas essenciais. Primeira, a interpretação do Código Civil contexto do regime de direitos fundamentais. O Código Civil, ao tratar dos direitos de vizinhança e do uso anormal da propriedade dispõe o seguinte: “Art. 1.277. O proprietário ou o possuidor de um prédio tem o direito de fazer cessar as interferências prejudiciais à segurança, ao sossego e à saúde dos que o habitam, provocadas pela utilização de propriedade vizinha. Parágrafo único. Proíbem-se as interferências considerando-se a natureza da utilização, a localização do prédio, atendidas as normas que distribuem as edificações em zonas e os limites ordinários de tolerância dos moradores da vizinhança”.

Como se observa, há a garantia legal à proteção da segurança, sossego e saúde de proprietários e moradores contra interferências em sua posse e/ou propriedade aí incluída a proteção contra ruídos. Há o direito legal à cessação dos ruídos. Por sua vez, o Código Civil em outro dispositivo: “Art. 1.279. Ainda que por decisão judicial devam ser toleradas as interferências poderá o vizinho exigir a sua redução ou eliminação, quando estas de se tornarem possíveis”. Ou seja, há o direito do vizinho exigir a redução e/ou eliminação de ruídos causados por equipamentos elétricos/mecânicos.   

Por outro lado, a Lei de Curitiba nº 15.852/2021 dispõe sobre a política municipal de proteção, conservação e recuperação do meio ambiente. Há diversas regras sobre o controle do nível de poluição sonora (ver art. 3º, V). É da responsabilidade da Secretaria do Meio Ambiente a fiscalização das atividades poluidoras acústicas. Nesta lei há a previsão do direito à participação comunitária e controle social nas ações em defesa do meio ambiente (art. 2º, inc. II). Esta lei local tem que ser interpretada de modo a garantir a efetividade dos direitos fundamentais à vida, à saúde, moradia, propriedade, bem estar, descanso, trabalho, meio ambiente e segurança.  Outra lei de Curitiba, a Lei n. 14.771/2015 dispõe sobre o Plano Diretor, com a previsão de elaboração de mapa de ruído urbano, bem como a preservação dos direitos à paisagem natural e cultural.  Nesta lei, há o princípio da proibição do retrocesso ambiental. Também, esta lei municipal deve ser interpretada de modo a maximizar o regime de proteção aos direitos fundamentais. Outra lei de Curitiba é a Lei n. 10.625/2002, a qual dispõe sobre ruídos urbanos, com a previsão do zoneamento acústico da cidade. Nesta Lei 10.625/2002 dispõe que compete à Secretaria do Meio Ambiente “estabelecer o programa de controle dos ruídos urbanos e exercer o poder de controle e fiscalização das fontes de poluição sonora”, “aplicar as sanções previstas na legislação vigente” e “organizar programas de educação e conscientização. Ora, a omissão do Município em exercer o poder de polícia administrativa para a contenção dos ruídos  configura um estado de inconstitucionalidade por falta de proteção adequada aos direitos fundamentais à vida, saúde, trabalho, sossego, meio ambiente, entre outros.

Um dos pilares do  direito ambiental é o princípio da prevenção e precaução quanto aos danos ambientais e proibição do retrocesso ambiental.

Por isto, é fundamental a atuação do poder público municipal na contenção dos ruídos, sob pena de cometer ilegalidade e inconstitucionalidade.  No caso de Curitiba, não há um mapa de ruídos urbanos, o que por si só é uma ilegalidade e inconstitucionalidade. Também, falta a fiscalização preventiva para a contenção de ruídos, o que por si só é uma ilegalidade e inconstitucionalidade.  

A título exemplificativo de boa prática ambiental é o caso da Lei de Curitiba n. 15.585/2019 que proibiu a utilização de fogos e artificio e artefatos de alto impacto ou com efeitos de tiro. Esta lei de um importante passo para o controle da poluição sonora. Sobre o tema, o Supremo Tribunal Federal ao analisar a Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental 567/SP, Rel. Alexandre de Moraes, que trata da  constitucionalidade da Lei do Município de São Paulo de proibição de fogos de artifício barulhentos, registro o seguinte: A jurisprudência desta CORTE admite, em matéria de proteção da saúde e do meio ambiente, que os Estados e Municípios editem normas mais protetivas, com fundamento em suas peculiaridades regionais e na preponderância de seu interesse. A Lei municipal 16.897/2018, ao proibir o uso de fogos de artifício de efeito sonoro ruidoso no Município de São Paulo, promoveu um padrão mais elevado de proteção à saúde e ao meio ambiente, tendo sido editada dentro de limites razoáveis do regular exercício de competência legislativa pelo ente municipal”. Prossegue a decisão: “Comprovação técnico-científica dos impactos graves e negativos que fogos de estampido e de artificio com efeito sonoro ruidoso causam às pessoas com transtorno do espectro autista, em razão de hipersensibilidade auditiva. Objetivo de tutelar o bem-estar e a saúde da população de autistas residentes no Município de São Paulo”. Outro fundamento a amparar a decisão foi a proteção ao bem estar animal:  “Estudos demonstram a ocorrência de danos irreversíveis às diversas espécies animais. Existência de sólida base técnico-científica para a restrição ao uso desses produtos com medida de proteção ao meio ambiente. Princípio da prevenção”.

A partir deste precedente do Supremo Tribunal Federal, a lei de Curitiba e de São Paulo de proibição de fogos de artifício barulhentos, entendo que deveria haver legislação proibitiva de sopradores de folhas/resíduos, roçadeiras, podadeiras, cortadores de gramas/galhos com efeitos sonoros ruidosos, em proteção ao direito à saúde e o direito à qualidade ambiental. O Município com base em seu interesse local e promoção do direito ao meio ambiente pode editar lei com a proibição da utilização destes equipamentos elétricos/mecânicos em serviços de jardinagem, em maior proteção aos direitos fundamentais.

Um dos atributos do regime de direitos fundamentais é o direito à edição de normas e procedimentos para justamente garantir a efetividade dos direitos fundamentais. Estes procedimentos têm que ser adequados à prevenção da lesão dos direitos fundamentais. Outro atributo  do regime de direitos fundamentais é a vinculação do poder público e dos particulares à efetivação dos direitos fundamentais.[6] Isto significa, na prática, a vinculação da Secretaria Municipal do Meio Ambiente à adoção de medidas de poder de polícia para a efetivação da proteção máxima aos direitos fundamentais.

Também implica na vinculação dos particulares: condomínios, prestadores de serviços e fornecedores de equipamentos elétricos/mecânicos à observância do regime de direito fundamentais. Igualmente, outra eficácia do regime de direitos fundamentais (vida, bem estar, saúde, descanso, trabalho e meio ambiente)  é sobre os condomínios. Os condomínios são obrigados a adotarem medidas para a cessação imediata da lesão aos direitos fundamentais causadas por ruídos. A gestão do condomínio deve estar comprometida com a proteção ao regime dos direitos fundamentais.

Por isto, o condomínio está obrigado a adotar normas de governança e compliance ambiental acústica, como derivação do direito à normas e procedimentos dos proprietários e moradores, bem como seus direitos de proteção e de defesa contra abusos. Por todas estas razões não podemos permitir práticas abusivas contra os direitos fundamentais à vida, ao bem estar, à saúde, ao descanso, ao trabalho, e contrárias ao regime de sustentabilidade ambiental. Precisamos fazer vale o princípio da precaução/prevenção de dano ambiental e o princípio do poluidor pagador.[7]

A propósito, o Superior Tribunal de Justiça tem precedentes no sentido de inversão do ônus da prova em matéria ambiental, de modo a garantir o acesso à justiça em temas ambientais, aplicando-se por analogia das regras de inversão da prova em proteção aos direitos dos consumidores[8].

A partir do acima exposto podemos apresentar as seguintes teses. Primeira tese, a proteção deficiente de direitos fundamentais à vida, à saúde, à moradia, propriedade, ao meio ambiente, ao trabalho, descanso, direito cultural à quietude residencial, entre outros, por lei local é inconstitucional. Diante disto, a técnica de apontamento de limite de decibéis em lei local significa a proteção deficiente aos direitos fundamentais. Por que não estabelecer o limite zero de ruídos? A melhor medida em proteção efetiva aos direitos fundamentais é a proibição da utilização de equipamentos mecânicos/elétricos e/ou produtos com efeitos sonoros ruidosos. Veja-se o caso da proibição da utilização de fogos de artifício com efeitos sonoros ruidosos.

É um ótimo exemplo a proteção eficaz dos direitos fundamentais. Segunda tese, proprietários, moradores e cidadãos têm o direito à qualidade ambiental com quietude, inclusive têm o direito subjetivo a adoção de normas e procedimentos em proteção e defesa de seus direitos fundamentais.  A propósito, o Código Civil consagra o direito à redução e/ou eliminação dos ruídos (art. 1277 e 1279). Por isso, a obrigação legal dos condomínios em adotar soluções de redução e/ou eliminação de ruídos. Há ainda o direito à edição de normas de compliance ambiental acústica por parte dos condomínios. Terceira tese, a omissão do Município em exercer o poder de polícia administrativo em proteção ao regime de direitos fundamentais à vida, saúde, trabalho, descanso, meio ambiente, propriedade e moradia, configura um estado de coisas inconstitucional e ilegal. Por isto, a responsabilidade do município em fiscalizar as atividades poluidoras acústicas. Neste sentido, o dever do município de adotar inovações tecnológicas para facilitar o exercício do poder de polícia administrativa para a contenção dos ruídos urbanos.

Há diversas soluções possíveis, desde a utilização de drones para serviços de inspeção e monitoramento dos ruídos, adoção de sensores acústicos, implementação do sistema de radares acústico, entre outras. Quarta tese, há ainda a regulamentação do aspecto criminal dos ruídos, para a proteção aos direitos fundamentais.  De um lado, há crime de perturbação do sossego alheio. De outro lado, há o crime ambiental. É necessário que a jurisdição criminal seja mais efetiva para inibir e diminuir as fontes de poluição sonora, com a aplicação de sanções mais eficazes.

O direito criminal deve atuar como função preventiva. Quinta tese, para a assegurar a efetividade da proteção ambiental, bem como o direito dos cidadãos na fiscalização da proteção ambiental, deve-se garantir a inversão do ônus da prova em matéria ambiental acústica, para facilitar o acesso à Justiça. O poluidor é quem deverá provar que não está poluindo, e não ao contrário: a exigência que a vítima da poluição sonora arque com os custos de defesa e de processos judiciais, consumindo-se seu tempo e seus recursos.  O poluidor é infrator, por isto sua conduta se adequar à lei.  

A autodefesa é em muitos casos inviável, pois é necessário se garantir o acesso à jurisdição em proteção aos direitos fundamentais.  Sexta tese, no contexto de cidades sustentáveis (metas da ONU para o desenvolvimento sustentável), cidades inteligentes (inovações tecnológicas aplicadas no âmbito local), é necessário o incentivo à organização do engajamento dos cidadãos para a solução de questões comunitárias. Na Europa, há o projeto Making Sense para incentivar a participação da cidadania em questões públicas para a promoção da inovação social digital, com o incentivo ao Smart Citizen Kit (uma plataforma colaborativa aberta).[9]

A título ilustrativo, na cidade de Barcelona, na Espanha, há iniciativas de engajamento dos cidadãos para projetos de controle da poluição acústica, mediante a instalação de sensores. O projeto é denominado Barcelona Beta Pilot com a instalação de 25 (vinte e cinco sensores) pela cidade, no contexto do projeto Fab Lab Barcelona. O objetivo é o monitoramento dos ruídos para a detectar infrações à legislação local que define limites de decibéis. A comunidade ao redor da Praça do Sol é que organizou quanto à efetivação do projeto.[10] Os objetivos comunitários são a participação da comunidade, a co-criação, co-design de soluções e o crescimento sustentável. De fato, um dos caminhos para a sustentabilidade ambiental é o eco-design das cidades, serviços, produtos e procedimentos.

A coleta de dados ambientais é uma importante etapa para a afirmação de políticas públicas ambientais para o controle da poluição atmosférica, poluição sonora, poluição visual, entre outras. Neste aspecto, há oportunidades para o florescimento de ecossistemas de startups vocacionadas à promoção da cidadania para promoção da sustentabilidade ambiental (civic techs, govtechs, entre outras).  Sétima tese, é necessário o fortalecimento de programas de educação ambiental acústica em condomínios. Este é um ponto de atenção focal para a conscientização a respeito da poluição sonora e das medidas de responsabilização. Em nível maior de amadurecimento, a demanda por programas de compliance ambiental acústica em condomínios.

Resumindo-se: o problema da contenção de ruídos urbanos demanda: inovações tecnológicas, engajamento da cidadania em plataformas colaborativas, aplicação efetiva da legislação pelos municípios, programas de educação ambiental em larga escala. A defesa de valores comunitários (como qualidade do ar, contenção de ruídos e ambiente de quietude residencial) é uma condição fundamental para a qualidade de vida e saúde. Por isto, a necessidade de se combater ineficiências tecnológicas mecânicas causadoras de poluição acústica. Oitava tese, precisamos mudar a cultura tóxica dos ruídos urbanos por uma cultura mais saudável e sustentável com a promoção da quietude no espaço urbano. Cidades sustentáveis e inteligentes são aquelas garantem o direito à quietude residencial urbana.[11] 

O direito à cidadania implica no direito à quietude urbana. Ruídos são o símbolo do subdesenvolvimento tecnológico mecânico. Ruídos é o sintoma de mal estar e deseducação ambiental. Ruídos propagam a cultura do mal estar. Ruídos são o sintoma da ineficiência tecnológica das máquinas. Ruídos representam o aspecto “cultural lag”, isto é, o atraso cultural em lesão aos direitos fundamentais. Precisamos superar a cultura de mal estar causada pelos ruídos urbanos. O direito à cidade sustentável exclui a poluição sonora, isto é, é contrário à toxicidade dos ruídos e demanda a responsabilização ambiental dos poluidores.  Nona tese, o aspecto da psicoacústica deve ser considerado. Um dos aspectos, é o comportamento psicopatológico do poluidor acústico, o qual adota uma conduta prejudicial a si mesmo.

A patologia encontra-se em considerar a subcultura do ruído como algo normal, corriqueiro, aqui há uma inversão de valores, pois o não saudável predomina sobre a cultura saudável da quietude.  Um verdadeiro absurdo máquinas predominando sobre o ambiente da natureza e ambiente humano. Adota-se uma hierarquia de valorização das máquinas barulhentas sobre o bem-estar humano dentro dos condomínios. O morador e/propriedade paga suas taxas de condomínio mensalmente e premiado com serviços barulhentos.

Outro aspecto é o comportamento do agente responsável pela contenção dos ruídos, no caso os gestores de condomínios e/ou síndicos, que autorizam serviços de jardinagem com equipamentos elétricos/mecânicos barulhentos. Este grupo deve ser alvo de uma campanha de reeducação pedagógica ambiental acústica para aprender os efeitos tóxicos dos ruídos. Ruídos são danos ambientais que se repetem semana a semana. Por isto, a urgente necessidade de mobilização para a contenção, prevenção e educação quanto a estes riscos de danos à qualidade de vida, saúde, trabalho, descanso. Décima tese, contratos de serviços de jardinagem firmados pelos condomínios com emissão barulhenta dos equipamentos elétricos/mecânicos devem ser considerados nulos de pleno direito, pois ofenderem os princípios da prevenção/precaução de dano ambiental, vedação do retrocesso ambiental. 

Também, estas cláusulas são nulas de pleno direito por ofenderem o Código de Defesa do Consumidor, o qual garante o direito à prestação de serviços com qualidade. Igualmente, equipamentos elétricos/mecânicos adotados em serviços de jardinagem barulhentos são ofensivos ao Código de Defesa do Consumidor, o qual garante o direito à produção em falhas de segurança. Por isso, a comercialização de tecnologias ineficientes acusticamente é vedada pelo Código de Defesa do Consumidor, garantindo-se ao consumidor e/ou terceiro o direito à reparação das falhas e/ou indenização por danos.  Décima primeira tese, a repetição dos ruídos e a continuidade mensal da lesão aos direitos fundamentais à vida, à saúde, ao trabalho, ao descanso, ao meio ambiente, ensejam a indenização por danos morais, em valores a serem arbitrados judicialmente, o monitoramento ambiental, bem como a imposição de reeducação ambiental acústica dos ofensores. Décima segunda tese, a insalubridade acústica no meio ambiente de trabalho gera o direito à indenização para as pessoas atingidas pelos ruídos.

Neste aspecto, há responsabilidade do condomínio contratada e a empresa/pessoa contratada pela salubridade das condições de trabalho.

** Todos os direitos reservados, não podendo ser reproduzido ou usado sem citar a fonte.

Ericson M. Scorsim. Advogado e Consultor no Direito do Estado. Doutor em Direito pela USP.


[1] A empresa Stihl está a realizar recall de diversos produtos por falhas de segurança, com o risco de soltura de lâminas que podem ferir o operário e/ou terceiros, equipamentos elétricos/mecânicos, tais como: sopradores, podadores, roçadeiras, pulverizadores, conjunto de corte, entre outros. Ver: www.stihl.com/recall

[2] Sobre o tema, conferir: Souza, Renato e Souza, Ms. Claudete. Responsabilidade civil sobre a poluição sonora provocada pelo transporte público na região metropolitana de São Paulo. Revista do Curso de Direito da Universidade da Metodista de São Paulo, v. 15, n. 15, 2020, edição especial.

[3] Em janeiro de 2022, o governo francês adotou um programa para a contenção da poluição acústica no trânsito, mediante a instalação de radares acústicos.  Ver: Lutte contre la pollution sonore: le gouverment lance l’expérimentation de radars  sonores. www.ecologie.gouv/fr, 4 de janeiro de 2020.  Ver, também: Ayuso, Silvia. Francia instala radares sonoros para limitar el ruído de motores. www.elpais.com/clima-y-medio-ambiente.

[4] Morata, Thais e Zucki, Fernanda (organizadoras). Saúde auditiva. Avaliação de riscos e prevenção. São Paulo: Plexus Editora, 2010.

[5] Bistafa, Sylvio. Acústica aplicada ao controle do ruído, terceira edição revista e ampliada, Blucher, 2018.

[6] Ver: Alexy, Robert. Teoria de los derechos fundamentales. Centro de Estudios constitucionales, Madrid, 1997.

[7] Ver: Sarlet, Ingo Wolfang e Fensterseifer, Tiago. Princípio do direito ambiental. Saraiva, 2018. Também, consultar: Weduy, Gabriel. O princípio constitucional da precaução como instrumento de tutela do meio ambiente e da saúde pública. Belo Horizonte, Editora Fórum, 2009.

[8] Sarlet, Ingo Wolfang e Fensterseifer, Tiago, obra citada, p. 196.

[9] Citizen sensing. A toolkit.

[10] Sensing operation manuals. Why is it relevant?

[11] Ver: Tsalligopoulos, Aggelos e outros. Revisiting the concept of quietness in the urban environment – toward ecosystemas health and human well-being. International Journal of Environmental Research and Public Health. MDPI, 18 march 2021.

Crédito de Imagem: Adonis Nóbrega

Ericson M. Scorsim

Advogado e Consultor em Direito da Comunicação. Doutor em Direito pela USP. Autor da Coleção Ebooks sobre Direito da Comunicação com foco em temas sobre tecnologias, internet, telecomunicações e mídias.