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Em defesa de uma nova Agência Ambiental do Brasil.

07/08/2025

Ericson M. Scorsim. Advogado e Consultor no Direito Público. Doutor em Direito pela Universidade de São Paulo. Co-fundador da Associação Monitor Ambiental Antirruídos. Autor do ebook Cidades livres de poluição sonora, publicado na Amazon, 2022.

A questão ambiental é existencial para o Brasil e os brasileiros. Em risco os direitos fundamentais e ambientais das futuras gerações e das atuais gerações.   É o momento da consciência ambiental em larga escala. Ainda mais agora no momento histórico da Conferência das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas (COP 30), a ser realizada no Brasil. As mudanças climáticas e o aquecimento global demandam medidas urgentes de adaptação.  Em 2020, a pandemia do coronavírus causou a tragédia com a morte de milhões de pessoas no Brasil e no mundo. Esta pandemia mostrou que um agente biológico tem o poder de matar milhões, bem como geram infinitas doenças. Daí surgiu a necessidade de pensar medidas em prol da biossegurança das cidades e sua população. Também, em 2024 os incêndios e as queimadas ocorridos no Brasil com fumaça atingindo praticamente toda as cidades brasileiras demandam ações de prevenção que este dano volte a ocorrer. Há riscos imensos com secas e falta de água para a população. Veja-se o caso das secas na Amazônia e no Pantanal, em magnitude impressionante. Em 2024, enchentes que atingiram o Rio Grande do Sul, causando prejuízos de intensa magnitude. Por outro lado, as praias brasileiras vêm sendo poluídas, ano a ano. A qualidade do ar vem piorando ano a ano. Também, a poluição sonora é um fator de degradação da qualidade ambiental e da qualidade de vida, com riscos à saúde pública. A poluição química está presente em alimentos, produtos; sequer a população tem conhecimento desta contaminação química. A poluição do solo é problema crônico.  Há poluição por plásticos que contaminam os oceanos. Há a perda de florestas, as quais vem sendo destruídas ano a ano. O paradigma institucional ambiental não está adequado às urgentes demandas de proteção ambiental. O design da lei ambiental deve garantir a eficiência, eficiência e efetividade da proteção ao meio ambiente. Enfim, o design da lei ambiental deve garantir a competência ambiental efetiva em proteção do meio ambiente. E mais, a composição da agência ambiental deve contar com a participação de cientistas renomados em sua área de atuação: poluição atmosférica, poluição química, poluição sonora,  epidemiologia,  biodiversidade, engenharia florestal, oceonagrafos, biólogo, químicos, engenheiros ambientas,  medicina ambiental, psicologia ambiental, entre outros. Atualmente, há uma multiplicidade de órgãos ambientais, porém falta a unidade de comando e controle quanto à política ambiental.  Outro ponto essencial é antecipação ambiental, neste aspecto o papel das inovações tecnológicas como sensores, inteligência artificial, big data, satélites, radares quanto à previsão de mudanças ambientais, bem como o monitoramento do fluxo de águas e áreas verdes, bem como detectar riscos de enchentes e incêndios.  São necessários padrões de governança ambiental, com indicadores de qualidade ambiental, em nível federal, estadual e municipal.   Há problemas de falta de alinhamento entre as políticas ambientais, políticas de trânsito, políticas de transporte público, políticas de mobilidade urbana, políticas de infraestruturas elétricas, ente outras. Também, é importante o alinhamento entre a política ambiental e a política energética, quanto ao uso de fontes renováveis de energias limpas e a questão dos combustíveis fosseis, no contexto da transição energética justa.

 É necessário garantir a coerência e unidade das políticas ambientais. Há deficiências estruturais quanto [1]à organização da proteção ambiental. Da análise dos julgados do Supremo Tribunal percebe-se inúmeros casos a demonstrar as deficiências estruturais do Estado Brasileiro quanto à proteção ambiental: Ação Direta de Inconstitucionalidade – ADI 6.148/DF contra a Resolução n. 491/2018 do Conselho Nacional do Meio Ambiente que adotou padrões de qualidade do ar inferiores àqueles definidos pela Organização Mundial da Saúde,  ADPF n. 623 determinou, em unanimidade, a inconstitucionalidade do Decreto Federal nº 9.806, de 29 de maio de 2019, cujo teor alterava a composição do Conselho Nacional do Meio Ambiente (CONAMA)[2] para aumentar a representatividade do governo e diminuir a representação da sociedade civil (a decisão do STF consagrou o princípio da proibição do retrocesso ambiental e o direito à participação ambiental), a a ADPF 708/DF sobre a omissão da União em relação à não alocação integral de recursos do Fundo Clima no período de 2019 e as ADPFs nºs. 743,746 e 857 (igualmente por unanimidade), contra omissões no combate aos incêndios[3] e a ADPF nº 109 quanto à questão do uso do amianto[4].   E mais, há inúmeros atos internacionais a serem seguidos pelo Brasil. A Resolução nº 76, de 2002, da ONU que consagra o direito ao meio ambiente limpo, saudável e sustentável. Há ainda a Resolução da ONU que trata da educação em desenvolvimento sustentável. E também a Resolução da ONU que trata do direito à paz. E ainda, há o Acordo de Paris sobre mudanças climáticas,  Declaração do Rio de 92, o Tratado de Escazu[5] (sobre direito à informação ambiental, direito à participação ambiental, direito à transparência ambiental, o Tratado Aarhaus, oficialmente chamado de Convenção de Aarhus sobre Acesso à Informação, Participação Pública no Processo Decisório e Acesso à Justiça em Assuntos Ambientais[6] (embora aplicável aos países da União Europeia, mas é uma referência), Princípios de Maastricht [7] (obrigações dos Estados em relação aos direitos humanos e aos direitos ambientais, em relação aos direitos das futuras gerações.  E mais, a agência ambiental deve estar vinculada aos objetivos de desenvolvimento sustentável da Agenda 2030 da Organização das Nações Unidas: trabalho decente (inclusive os trabalhos “verdes”), saúde e bem estar (saúde e bem estar ambiental), fome zero e agricultura sustentável, educação de qualidade, cidades e comunidades sustentáveis (cidades livres de poluição do ar e poluição sonora), produção e consumo responsável (economia circular e responsabilidade quanto ao produto sustentável), inovação, indústria e infraestrutura (inovação técnica e responsável, com o ecodesign dos produtos industriais, em prol a ecoeficiência ambiental,  indústria limpa, saudável e sustentável e infraestrutura limpa, saudável e sustentável), energia limpa e acessível, mudanças climáticas (conjunto de leis, regulamentações, ações e práticas responsáveis), igualdade de gênero, paz e instituições eficazes (paz ambiental e instituições ambientais efetivas, eficazes e eficientes, redução das desigualdades (equidade ambiental e justiça ambiental,  acesso à água e saneamento ambiental, proteção à vida terrestre, proteção à vida na água, parceiras e meios de implementação.

Por isto, é fundamental a inovação ambiental para criar uma agência ambiental autônoma, inclusive a instituição de mandato para seus dirigentes, com independência dos governos e do setor privado. Reprise-se o design institucional ambiental deve maximizar a proteção ambiental e dos bens ambientais, e seu contexto ecossistêmico. É uma instituição ambiental, o qual deve ser  multisetorial, com poderes normativos e fiscalizatórios.[8] Alguns dos pilares para sua estruturação: o direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, o princípio do federalismo ambiental cooperativo,  os princípios desenvolvimento sustentável, a economia sustentável, a descarbonização da economia, a ecoeficiência ambiental, a sustentabilidade ambiental, os princípios da proibição do retrocesso ambiental, dever de progressividade ambiental, prevenção de dano ambiental, precaução de dano ambiental, defesa ambiental, segurança ambiental, poluidor pagador.  Sobre este tema do poluidor-pagador deve ser estabelecido um sistema de pagamento de indenizações e compensações ambientais pelos poluidores, inclusive um fundo ambiental instituídos com a arrecadação de multas e outras receitas para o financiamento de ações de proteção ambiental. Deve ser garantida a autonomia financeira desta agência ambiental, garantindo recursos orçamentários próprios. E mais, deve haver a transparência ambiental quanto à quantificação dos danos ambientais. O valor econômico do capital natural deve ser, rigorosamente, mensurado. Assim, quando houve a perda do capital natural ou a degradação da qualidade ambiental natural é possível quantificar os custos ambientais, os danos ambientais e as indenizações e reparações ambientais, de modo justo e equitativo.

Esta agência ambiental federal deve servir de inspiração para agências ambientais dos estados e dos municípios.  Esta agência ambiental deve, obrigatoriamente, aprovar indicadores de qualidade da proteção ambiental, qualidade das normas ambientais, qualidade da fiscalização ambiental.  Para, além disto, a futura agência ambiental deve incentivar o ecossistema de inovação, com o uso de tecnologias e inovações tecnológicas para a máxima proteção ambiental, bem como o ecossistema de serviços ambientais.  Também, para incentivar serviços ambientais, isto é, serviços dedicados à proteção ambiental. Outro ponto é monitorar os investimentos ambientais na máxima proteção ambiental.  Outro tema é realizar a defesa ambiental diante de produtos e serviços nocivos ao meio ambiente. Outro ponto é a diplomacia ambiental para inserir o Brasil e sua participação com outros países em ações ambientais, com a definição de padrões, protocolos e normas.

  Em síntese, a reestruturação das funções ambientais do Estado Brasileiro é uma condição fundamental para o desenvolvimento sustentável e o direito do povo brasileiro ao meio ambiente ecologicamente equilibrado e saudável, em garantia da defesa ambiental e segurança ambiental adequadas para todos. Em risco os direitos humanos e ambientais das futuras gerações e das atuais gerações.   


[1] O Supremo Tribunal Federal definiu na ADI 6.148/DF que a Resolução n. 491/2018 estava em vias de se tornar inconstitucional, por adotar parâmetros de controle da qualidade do ar inferiores aqueles definidos pela Organização Mundial da Saúde. Assim, fixou prazo para que o CONAMA editasse nova Resolução adequada aos parâmetros da OMS.

[2] Supremo Tribunal Federal (STF), ADPF 623 disponível em: https://jurisprudencia.stf.jus.br/pages/search/sjur483570/false

[3] Supremo Tribunal Federal (STF), ADPF 743, disponível em: https://jurisprudencia.stf.jus.br/pages/search/sjur504935/false ,

[4] Supremo Tribunal Federal (STF), ADPF 109, disponível em: https://jurisprudencia.stf.jus.br/pages/search/sjur397313/false

[5]Ver:https://www.un.org/en/development/desa/population/migration/generalassembly/docs/globalcompact/A_CONF.151_26_Vol.I_Declaration.pdf

[6] Ver: https://unece.org/fileadmin/DAM/env/pp/documents/cep43e.pdf

[7] Ver: https://www.etoconsortium.org/wp-content/uploads/2023/07/Maastricht-Principles-on-the-Human-Rights-of-Future-Generations_EN.pdf

[8] Ver, por exemplo, a Agência Ambiental da União Europeia. A Corte de Auditores da União Europeia fiscaliza o cumprimento das metas ambientais pelos países.

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Ericson M. Scorsim

Advogado e Consultor em Direito da Comunicação. Doutor em Direito pela USP. Autor da Coleção Ebooks sobre Direito da Comunicação com foco em temas sobre tecnologias, internet, telecomunicações e mídias.