As ruas são integrantes das infraestruturas das cidades. É comum nas cidades serviços de limpeza das ruas. Porém, e quanto à sujeira das ruas causadas pelos ruídos? Ruídos também sujam as ruas. Não há nenhuma medida adotada pelas prefeituras para a “limpeza” da paisagem sonora da cidade. Residências próximas às ruas sentem o impacto dos ruídos de veículos. Há a interação entre o sistema de habitação (o lugar, o habitat humano e o meio ambiente humano) e o sistema de mobilidade urbana.
O sistema de mobilidade urbana causa danos colaterais para o sistema de habitação, como os efeitos colaterais da poluição atmosférica e poluição sonora. Para agravar temos o caso de bairros atravessados por vias de expressa de ônibus de grande porte (apelidos de ligeirinhos), como é o caso de Curitiba. Estas vias expressas de transporte coletivo impactam com ruídos os edifícios de apartamentos residenciais. Há danos colaterais do sistema de transporte coletivo, por via expressa, em áreas predominantemente residenciais. Por isto, precisamos da mudança na percepção a respeito dos ruídos. E da interseção entre casa, rua, bairro e o impacto dos ruídos das máquinas sobre a vida humana. Precisamos superar a subcultura de mal estar nas cidades causada pela poluição sonora dos veículos à combustão. As ruas sem ruídos e com quietude urbana são um direito dos cidadãos.
O direito à sustentalidade ambiental nas cidades. O bem estar urbano é tema uma multidimensional, há aspectos físicos, psicológicos, fisiológicos e imateriais. A legislação proíbe a poluição sonora nas cidades. Ruídos afetam a saúde pública, o bem estar público e o meio ambiente. Ruídos são o sintoma de subdesenvolvimento urbano. Ruídos de máquinas em tecnologias mecânicas ineficientes são o sintoma patológico e tóxico nas cidades. O que temos é uma inversão patológica da hierarquia das máquinas sobre o sistema de vida humano, em prejuízo à saúde pública e bem estar público. Ruídos causam a degradação ambiental das cidades ano a no com o aumento da frota de veículos.
Ruídos aumentam a carga de estímulos sensoriais sonoros nas cidades, aumentando-se a pressão sonora, como se houvesse por analogia o aumento da pressão arterial nas cidades, o que ocasiona diversos perigos. Ruídos causam sensações corporais e mentais péssimas. Ruídos aumentam a sobrecarga de estímulos sensoriais para o organismo humano, em detrimento da saúde. Há o impacto direto dos ruídos no organismo humano. Por isto, a necessidade de proteção às infraestruturas urbanas no aspecto de sua sustentabilidade ambiental e saúde pública. No âmbito das Nações Unidas, há diversos programas de desenvolvimento sustentável para a saúde, bem estar, inovações tecnológicas, proteção ambiental, entre outros objetivos.
Os objetivos de desenvolvimento sustentável da ONU, mais o aquecimento global e as mudanças climáticas, demandam ações urgentes nas cidades para a mudança da mobilidade urbana, substituindo-se veículos à combustão por veículos elétricos. Por isto, para termos cidades sustentáveis, saudáveis e resilientes precisamos de programas para a contenção de ruídos urbanos. Uma boa opção regulatória são leis de incentivos à inovação tecnológica para a mobilidade por veículos elétricos. Carros, motocicletas e ônibus elétricos não causam poluição atmosférica, nem poluição acústica. Diferentemente, veículos à combustão (automóveis, motocicletas e ônibus) são fontes de degradação ambiental urbana. Veículos à combustão causam a degradação da qualidade de vida nas cidades, na medida em que são fontes de ruídos e produção de emissão de gases poluentes.
Há evidências da superioridade da tecnologia elétrica em veículos, comparando-se com a tecnologia mecânica do motor à combustão. Por isto, as prefeituras em programas de mobilidade urbana devem priorizar a sustentabilidade ambiental, para a eliminação da poluição atmosférica e poluição acústica. Há o dever da administração pública maximizar a eficiência da ação pública de modo a conter a poluição atmosférica e poluição acústica. Veículos elétricos representam a solução de máxima eficiência tecnológica para a eliminação da poluição atmosférica e poluição acústica nas cidades. A título ilustrativo, ônibus elétricos revolucionarão o sistema de transporte coletivo de passageiros, uma modalidade de serviço público que obrigatoriamente deve observar padrões de conforto para usuários e a comunidade.
Outra opção regulatória para as prefeituras é a imposição de restrição ao trânsito de veículos à combustão, em determinados bairros da cidade, para se preservar a qualidade ambiental e evitar a poluição acústica, garantindo-se a quietude urbana de áreas predominantemente residenciais.
Em Londres, por exemplo, houve a restrição à circulação de veículos em áreas centrais. As prefeituras podem, também, estabelecer medidas de compensação ambiental para concretizar os princípios da precaução, prevenção de danos ambientais e proibição do retrocesso ambiental, princípio do poluidor pagador, de modo a assegurar que o poluidor efetivamente pague uma espécie de compensação pelos danos causados ao meio ambiente e aos cidadãos. Outros dois princípios a embasar esta política regulatória são o princípio da eficiência energética e da eficiência acústica. Por isto, as prefeituras poderiam estabelecer um sistema de imposição de taxas de compensação ambiental como mecanismo para dissuadir o comportamento antissocial dos poluidores. A medida é ainda justificada para a proteção da saúde pública, afinal a poluição atmosférica e a poluição sonora é fator atentatório à saúde humana. Outra opção regulatória é a adoção de incentivos para medidas de isolamento acústico de janelas de edifícios situados às margens de vias expressas de ônibus do sistema de transporte coletivo de passageiros.
As Prefeituras devem adotar medidas de compensação ambiental e/ou mitigação dos danos ambientais causados pelos ruídos do sistema de transporte coletivo para os cidadãos moradores de edifícios às margens de vias expressas. Outra opção é a realização de compras e serviços sustentáveis pelas prefeituras. Resumindo-se: a tecnologia para a mobilidade elétrica deve ser percebida como uma tecnologia para a saúde pública, bem estar público e promoção da sustentabilidade ambiental. A efetivação de políticas de sustentabilidade ambiental nas cidades depende do compromisso das prefeituras com ações práticas para a mudança do paradigma da mobilidade urbana, alterando-se o atual status quo de poluição atmosférica e acústica, para um cenário de mobilidade baseado na matriz elétrica.
Registre-se que cidades inteligentes, sustentáveis e saudáveis são aquelas que tenham o compromisso com a infraestrutura urbana de incentivos para carros, motocicletas e ônibus elétricos.
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Ericson Scorsim. Advogado e Consultor no Direito Público. Doutor em Direito pela USP. Autor do livro Propostas Regulatórias: Anti-Ruídos Urbanos, Amazon, 2022.
Crédito de Imagem: Ônibus Brasil – Otavio Felipe Balbinot