O sistema de transporte coletivo de passageiros municipal é uma das principais fontes de poluição acústica. Por isso, a necessidade de se repensar as políticas ambientais para a contenção desta espécie de ruídos urbanos. A mobilidade urbana deve ser refletida no contexto da política ambiental de controle da poluição acústica. Aqui, algumas reflexões a partir da análise da cidade de Curitiba.
O sistema de transporte coletivo de passageiros é reconhecido globalmente. Porém, há um aspecto não conhecido, mas que merece atenção: os ruídos causados pelo sistema de transporte coletivo à cidade de Curitiba e os danos colaterais às áreas residenciais.[1] Ruídos são o sintoma de um aspecto de subdesenvolvimento da cidade. Em contexto de cidades sustentáveis e inteligentes fazem-se necessárias medidas para a contenção dos ruídos. E, ainda, a política de controle da poluição atmosférica adotada no contexto das mudanças climáticas deve servir de inspiração para o controle da poluição sonora do sistema de transporte coletivo de passageiros.
No Plano Diretor da Cidade de Curitiba, há algumas referências sobre o transporte coletivo de passageiros com a previsão de plano de controle de poluição veicular. Porém, na prática, não há este controle da poluição acústica causada pelos ônibus do sistema de transporte coletivo de passageiros. Quanto ao sistema viário, de circulação e trânsito há a referência ao bem estar da população. Para além disto, obviamente o sistema de transporte coletivo deve priorizar o conforto dos usuários deste serviço público municipal. Na parte referente ao patrimônio natural, o referido Plano Diretor faz menção ao objetivo de redução gradual de emissão de poluentes nocivos à saúde lançados no ar (art. 62, inc. XXI), o monitoramento da política municipal do meio ambiente (art. 62, inc. XXIV), promoção de estudos para a gestão do ruído urbano com a garantia da saúde e bem estar social e ambiental (art. 62, inc. XXVII), promoção do conforto ambiental na cidade (art. 62, inc. XXIV).
Na Lei de Curitiba sobre zoneamento, uso e ocupação do solo urbano (Lei n. 15.511/2019), há as seguintes diretrizes: i) equilíbrio entre o ambiente natural e o construído (art. 2, inc. III); ii) identidade da paisagem urbana (art. 2, inc. V), iii) justa distribuição dos benefícios e ônus no processo de urbanização; iv) plena interligação e eficiência das funções da cidade e v) redução das vulnerabilidades socioeconômicas e ambientais (art. 2, inc. X).
Por todas estas razões, há diversas ações para a contenção de ruídos produzidos pelo sistema de transporte coletivo, sob responsabilidade dos municípios e das empresas de transporte. Há técnicas para a eliminação, substituição e isolamento acústico.[2] Primeiro, há demanda pela elaboração de um mapa de ruídos urbanos do sistema de transporte coletivo, mediante a instalação de uma rede de sensores acústicos.
Segundo, em áreas predominantemente residenciais, impactadas pelo sistema de transporte coletivo de passageiro, há o direito da coletividade às medidas de mitigação dos ruídos causados pelos ônibus. Dentre as opções regulatórias: i) redução da velocidade dos ônibus; ii) a mudança da rota do transporte coletivo, com a redefinição da trajetória geográfica; iii) a adoção de metas progressivas para a substituição de ônibus de combustíveis fosséis por ônibus elétricos, mais eficientes energeticamente e acusticamente; iv) compensações ambientais aos moradores das vias públicas atingidas pelos ruídos do sistema de transporte coletivo; v) implantação de radares acústicos para o monitoramento ambiental acústica das vias expressas.
Terceiro, há o direito dos usuários do sistema de transporte coletivo às condições de conforto acústico. Por isto, a responsabilidade do município, na condição de poder concedente, em estabelecer condições de conforto acústico nos ônibus.
Quarto, há o direito dos trabalhadores do sistema de transporte coletivo (motoristas, cobradores em estações tubo) à salubridade acústica do ambiente de trabalho. Deste modo, o órgãos de segurança ambiental no trabalho devem estabelecer metas para a redução progressiva do nível de emissão sonora de equipamentos elétricos/mecânicos.
Quinto, há o direito dos cidadãos à quietude urbana. O sistema de transporte coletivo não pode causar a degradação ambiental acústica. Há o direito dos cidadãos ao desfrute da paisagem natural e cultural com quietude. Precisamos eliminar e/ou conter a cultura tóxica dos ruídos urbanos, substituindo-a pela cultura da quietude. A política ambiental de contenção da poluição atmosférica, adotada no contexto das mudanças climáticas, serve como modelo de inspiração para a contenção dos ruídos urbanos.
As inovações tecnológicas devem ser aproveitadas para a efetivação da política ambiental de contenção de ruídos.
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Ericson M. Scorsim. Advogado e Consultor em Direito Regulatório das Comunicações. Doutor em Direito pela USP. Autor do livro Jogo Geopolítico das Comunicações 5G: Estados Unidos, China e o Impacto no Brasil, Amazon. Autor do livro Geopolítica das Comunicações, Amazon.
[1] A título ilustrativo, sobre um dos impactos, ver: Zannin, Paulo Henrique e David Queiroz Sant’Anna. Ruído ocupacional em estações de ônibus. Estudo de caso em estações tubo. Curitiba – Paraná – Brasil. R. Ra’e Ga. Curitiba, v. 37, p. 110-130, agosto/2016.
[2] Bistafa, Sylvio. Acústica aplicada ao controle do ruído. Terceira edição, revista e ampliada. São Paulo: Blucher, 2018,.