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Por soberania nacional, o Brasil deve criar seu próprio sistema de navegação e geolocalização?

29/04/2024

Dr. Ericson M. Scorsim explica a importância do Brasil ter um sistema de navegação e geolocalização para afirmar sua soberania economia, política e tecnológica, em entrevista a agência de notícias Sputink Brasil.

Por: Davi Carlos Acácio e Rennan Rebello

Para um país com grande extensão territorial, como o caso do Brasil, o que significa ter seu próprio sistema de navegação e geolocalização? À Sputnik Brasil, especialistas analisam a importância do desenvolvimento da tecnologia para a soberania nacional.O Brasil, quando o assunto é tecnologia de posicionamento, navegação e geolocalização, utiliza o sistema norte-americano, o GPS (Global Positioning Satellite) — uma marca que, por aqui, virou sinônimo de tecnologia.Em um cenário marcado por sanções ocidentais contra países do Sul Global, a autonomia sobre dados informacionais dos seus cidadãos e ter seu próprio sistema de navegação têm sido considerados fatores cada vez mais cruciais para a soberania de um país. Nesse quesito, a Rússia e a China são exemplos, além dos EUA, por possuírem seus próprios sistemas.Tanto o GLONASS, sistema russo, quanto o BeiDou, tecnologia chinesa, foram passíveis de investimentos significativos, com a finalidade de “reduzir a dependência desses países de tecnologias estrangeiras”, comenta o senador Styvenson Valentim (Podemos-RN), que propôs no ano passado um Projeto de Lei (PL) que tem como objetivo criar um sistema brasileiro.

“Considerando a geografia do Brasil, seu potencial e todas as múltiplas questões que um sistema de localização possibilita, vejo como questão de obrigatoriedade termos o nosso próprio sistema”, destaca o parlamentar.

Brasil pode aprender com Rússia e China para desenvolver o seu próprio sistema?

A história demonstra que somente um país com capacidade tecnológica avançada é capaz de competir em um cenário global. O realismo político mostra que um país precisa ter hard power e soft power”, afirma Ericson Scorsim, advogado, doutor em direito pela Universidade de São Paulo (USP) e consultor em direito da comunicação.Segundo o especialista, é fundamental que o Brasil entenda a “imperiosa necessidade de investimentos em ciência e inovações tecnológicas” e aprenda a importância da soberania tecnológica para ser “um país soberano de fato e de direito”.

Além disso, Scorsim ressalta que a soberania econômica também requer uma economia de tecnologias avançadas.

“Sistemas de tecnologias de navegação e geolocalização são uma tecnologia considerada dual-use, isto é, com aplicações civis e militares. Essa tecnologia serve para monitorar, rastrear, vigiar o movimento de pessoas, veículos, cargas, infraestruturas e alvos”, explica.Nesse ponto, segundo o senador Styvenson Valentim, o governo brasileiro, no caso do desenvolvimento do seu próprio sistema, pode ponderar fazer como fizeram Rússia e China, que disponibilizaram seu sistema de navegação para uso comercial e civil em todo o mundo, o que inclui uma nova possibilidade de geração de receita para os países.

“Seguindo o exemplo da Rússia e da China, bem como de todos os países que possuem seu sistema, o Brasil pode trabalhar para construir sua própria infraestrutura de navegação e geolocalização, aumentando assim sua independência tecnológica e sua capacidade de proteger seus dados informacionais e sua soberania nacional”, sublinha o senador.

O que o Brasil precisa para avançar na construção do seu próprio sistema de navegação?

O ponto fulcral para começar a trabalhar em um sistema próprio, segundo Scorsim, é a implementação de uma política de incentivo à pesquisa e ciência em tecnologias avançadas.

“O Brasil precisa de inovação tecnológica como uma forma de fomentar o ecossistema digital do país e o sistema de educação em tecnologia, o que exige conhecimentos em física, matemática, engenharia, sistemas computacionais, entre outros”, comenta.Outro caminho sugerido, este por Phillipe Valente, professor de geocartografia da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ), é o de parcerias com outros países como uma possibilidade mais viável.

“Vejo isso como uma possibilidade devido à alta demanda que se tem para o desenvolvimento desse sistema. Uma ideia interessante seria esse desenvolvimento de parcerias, talvez até indo um pouco na linha ou da América do Sul ou do próprio BRICS”, sugere. O analista cita ainda exemplos de parcerias que o Brasil tem com outras nações no campo da tecnologia espacial — caso do Satélite de Recursos Terrestres China-Brasil (CBERS, na sigla em inglês) — como molde de projetos já existentes de parcerias.

Por que é importante para o Brasil ter seu próprio sistema?

Autor do PL que “cria o Programa de Desenvolvimento do Sistema Brasileiro de Posicionamento Global”, o senador Styvenson Valentim afirma que o Brasil, ao depender de tecnologia estrangeira, “fica vulnerável a eventuais interrupções ou indisponibilidades desses sistemas”.

“Não estamos falando apenas do Waze, Maps ou tráfego de carros de aplicativos, o que por si só já é muito importante. Estamos falando de soberania. Utilizar sistemas estrangeiros implica em insegurança e na possível falta de privacidade dos dados de localização dos usuários brasileiros”, diz o senador.Criar seu próprio sistema, segundo afirma Valente, faria com que o Brasil tivesse tecnologia voltada para as suas próprias questões logísticas de geolocalização. “Desenvolvendo o próprio sistema, você poderia atender mais às suas demandas específicas do país, principalmente voltadas para a indústria, para a agricultura de precisão“, avalia.Outro ponto-chave para a discussão de um sistema autônomo é a segurança, que, segundo o senador, poderia abarcar a criação de medidas mais robustas na área.

“Estamos falando de autonomia, independência, segurança nacional, desenvolvimento tecnológico, benefícios econômicos. Ter nosso próprio sistema de navegação proporcionará ao Brasil maior segurança, autonomia e capacidade de competir no cenário global, além de impulsionar o desenvolvimento tecnológico e econômico do país“, resume o proponente do projeto que está sob a relatoria do senador Marcos Pontes (PL-SP) e segue em tramitação.

Publicada: SPUTNICK Brasil (24/04/2024) (clique aqui)

Créditos de imagem: SPUTNICK Brasil.

Ericson M. Scorsim

Advogado e Consultor em Direito da Comunicação. Doutor em Direito pela USP. Autor da Coleção Ebooks sobre Direito da Comunicação com foco em temas sobre tecnologias, internet, telecomunicações e mídias.