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Direito à paisagem sonora nas cidades, livre de ruídos mecânicos e poluição sonora

26/06/2023

Nas cidades toda pessoa está inserida em um entorno ambiental. Este entorno ambiental influencia seu comportamento e, inclusive, a saúde. Logo o meio ambiente é o contexto aonde a pessoa vive. Aqui, vamos abordar a paisagem sonora das cidades. Não há a percepção adequada da influência dos ruídos e da poluição sonora nas cidades. O meio ambiente é contaminado por ruídos, o que afeta a qualidade ambiental e a saúde ambiental e, evidentemente, a saúde humana, física e mental. Esta paisagem sonora contaminada afeta a “paisagem psicológica” da pessoa. Ruídos geram estresse no organismo humano. A mecanoesfera é fator de contaminação acústica da bioesfera. Portanto, máquinas, equipamentos, ferramentas e veículos poluidores acústicos causam a perda da qualidade ambiental e também da perda de saúde.

A literatura é riquíssima na compreensão deste tema. Igualmente, os ruídos e a poluição sonora destroem a biodiversidade da fauna, principalmente impactando os pássaros. Mas, há também o impacto  sobre a saúde  e bem estar animal, principalmente de cães e gatos, com audição maior que a audição humana.  Sobre os ruídos mecânicos, ver: Bijsterveld, Karin. Mechanical Sound. Technology, culture and public problems of noise in the twentieth centyry. Massachusetts Institute of Technolog, 2008. Sobre a mecanização da vida e das cidades, ver: Giedion. Mechanization takes command. A contribution to anonymous history. Minneapolis, University of Minnesot Press, 2017.  Sobre a noção de espaço acústico, ver Marshall McLuhmann. Aqui, o autor explica que o som está relacionado à audição, um órgão de contato, de interligação com o ambiente.  Sobre a noção de atmosfera acústica, ver: Bohme, Gernot. Atmosferic Architectures. The aesthetics of felt spaces, edited and translated by A. Chr. Engels-Schwarzpaul. Bloombsbury, Berlin, 2017.  Sobre atmosfera urbana, ver: Niels Abertsen, Urban atmospheres, Ambiances, Redécouvertes. Sobre a história acústica, ver: Francisco Aletta e Jiang Kang: Historical acoustics relationships between people and sound over time. Basel: MPDPI, 2020. 

No Brasil, sobre paisagem sonora, temos as seguintes obras: Oliveira, Marcio Luis, Custódio e Maraluce, M. Lima, Carolina Carneiro. Direito e paisagem. A afirmação de um direito fundamental individual e difuso. Belo Horizonte: Editora D’Plácido, 2017.  Também, consultar:  Custódio, Maraluce, Santos, Fernando Barotti e Máximo, Maria Flávia (organizadores). Direito de paisagem. Aspectos jurídicos e interdisciplinares. Belo Horizonte, São Paulo: D’Plácido, 2021. Sobre paisagens culturais, ver: Andreotti, Paisagens culturais, Curitiba: Editora UFPR, 2013.  Em termos jurídicos, a nossa Constituição dispõe, em seu art. 225, sobre o direito de todos ao meio ambiente ecologicamente equilibrado como bem de uso comum do povo, essencial à qualidade de vida. E mais, há o dever do poder público e da coletividade de defender e preservar o meio ambiente para a geração presente e as futuras.  Para efetivar o direito ao meio ambiente é da competência do poder público: “controlar a produção, a comercialização e o emprego de técnicas, métodos e substâncias que comportem risco para a vida, a qualidade de vida e o meio ambiente”, art. 225, inc. V. Sobre os princípios gerais da atividade econômica, a Constituição dispõe sobre a “defesa do meio ambiente, inclusive mediante tratamento diferenciado conforme o impacto ambiental dos produtos e serviços e seus processos de elaboração”, art. 170, inc. VI. E, ainda, a Constituição dispõe sobre a competência comum da União, Estados, Distrito Federal e municípios para “proteger o meio ambiente e combater a poluição em qualquer de suas formas”, art. 23, in. VI.

Por fim, a Constituição dispõe que compete a União, aos Estados e ao Distrito Federal legislar concorrentemente sobre: “(…) responsabilidade por dano ao meio ambiente, ao consumidor, a bens e direitos de valor artístico, estético, histórico, turístico e paisagístico”, art. 24. VIII.  A Lei da Política Nacional de Meio Ambiente define, em seu art. 3º, que poluição, é: “degradação da qualidade ambiental resultante de atividades que direta ou indiretamente: a) prejudiquem a saúde, a segurança e bem estar da população; b) criem condições adversas às atividades sociais e econômicas, c) afetem desfavoravelmente a biota; d) afetem as condições estéticas ou sanitárias do meio ambiente; e) lancem matéria ou energia em desacordo com os padrões ambientais estabelecidos. A partir de todas essas normas constitucionais, é possível compreender pela configuração do direito à paisagem acústica do meio ambiente natural, meio ambiente humano e meio ambiente da fauna, livre de ruídos mecânicos. Há um direito à paisagem natural da cidade, livre de ruídos. A paisagem natural deve ser compreendida como um bem ambiental e um bem cultural.

O direito à cultura da quietude da paisagem sonora, livre de ruídos. A paisagem natural influencia a “paisagem psicológica” e, portanto, a paisagem cultural, aonde a vida acontece. Espaços públicos e privados devem ser protegidos para a garantia da tranquilidade, quietude, bem estar e saúde ambiental.[1] Também, a paisagem cultural deve ser compreendida como um bem cultural. Por isto, a Constituição protege “os modos de criar, fazer e viver”, em seu art. 216, inc. II. Existem “modos de criar, fazer e viver” que dependem do ambiente de quietude. Assim, este tipo de cultura é protegida constitucionalmente. Máquinas, ferramentas, equipamentos, veículos poluidores acústicos devem ser considerados como espécies invasoras do meio ambiente natural, humano e animal.

São fatores de perturbação do equilíbrio ecossistêmico e ao habitat humano. O direito à paisagem acústica das cidades, livre de ruídos, é um direito-garantia à qualidade de vida, à qualidade ambiental, à qualidade da saúde ambiental. Precisamos superar a mecanização ineficiente e poluidora acústica, insustentável ambientalmente, avançar e muito na compreensão deste direito fundamental, efetivando com melhores práticas industriais e na gestão ambiental das cidades. Por isto, é fundamental que a política pública ambiental seja mais proativa na defesa do direito à paisagem sonora da cidade, livre de ruídos e da poluição sonora. 

Para saber mais sobre o Movimento Antirruídos acesse: https://antirruidos.wordpress.com/ e https://twitter.com/antirruidos .

Ericson Scorsim. Advogado e Consultor no Direito Público. Doutor em Direito pela USP. Fundador da Associação Civil Monitor Ambiental Antirruídos. Autor dos ebooks: Movimento antirruídos para cidades inteligentes, saudáveis e sustentáveis e Condomínios inteligentes, saudáveis e sustentáveis, publicados pela Amazon.

Crédito de Imagem: Revista Medicina Integrativa


[1] Bentlezy, Clive. Tranquil Spaces. Measuring the tranquility of public spaces.

Ericson M. Scorsim

Advogado e Consultor em Direito da Comunicação. Doutor em Direito pela USP. Autor da Coleção Ebooks sobre Direito da Comunicação com foco em temas sobre tecnologias, internet, telecomunicações e mídias.