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5G, IoT e Smart Cities

Ericson Scorsim. Advogado e Consultor no Direito Regulatório das Comunicações. Doutor em Direito do Estado pela USP.

Os temas do 5G, IoT e Smarts Cities têm desafios, riscos e oportunidades.

Após o leilão de frequências do 5G a ser realizado pela Anatel em 2021 haverá um novo cenário das denominadas smarts cities (cidades inteligentes). Uma cidade inteligente é aquela que otimiza a performance, principalmente, das tecnologias de informações e comunicações e redes de telecomunicações, de modo a manter a sua sustentabilidade ambiental e promover serviços mais eficientes para seus cidadãos. Sobre o tema, consultar o excelente estudo da Câmara dos Deputados: Cidades inteligentes. Uma abordagem humana e sustentável (Coordenador: Francisco Jr).[1]  

Em termos de planejamento urbano de cidades inteligentes, acredito que a melhor geoestratégia distinguir diferentes modelos de cidades: cidades/capitais, cidades/metrópoles, cidades marítimas, cidades aeroportuárias, cidades industriais, cidades portuárias, cidades agroindustriais, cidades turísticas, etc. Conforme a vocação econômica e matriz econômica predominante de uma cidade, teríamos modelos diferenciados de cidades inteligentes mais adequados à sua realidade local.  As tecnologias emergentes de big data, computação em nuvem, impressão 3D, sensoriamento por satélites, 4G, 5G e 6G, são importantes oportunidades do desenvolvimento urbano. Neste aspecto, a gestão pública das Prefeituras tem um papel fundamental no incentivo à inovação tecnológica e governança comunicativa, isto é, a prestação de informações e serviços melhores para seus cidadãos.  

Vejamos o contexto da pandemia do coronavírus. Em ambiente de tecnologia 4G foi possível uma série de serviços relevantes de combate ao vírus, como monitoramento dos índices de transmissão do vírus em tempo real, bem como medidas de prevenção à saúde e agendamento de vacinas, e controle de disponibilidade de oferta de leitos de UTI em tempo real e rastreamento de pessoas infectadas.   Em sistemas de 4G é possível a otimização dos serviços de atendimento emergencial praticados pelo SAMU, com o controle da rota das ambulâncias. Também, com as tecnologias há sistemas de controle de medicamentos e estoques de oxigênio nas cidades no setor de saúde pública. Acredita-se que com o 5G haverá inclusive o potencial de realização de exames dentro das ambulâncias e com a análise em tempo real de dados do paciente, por um médico ainda que à distância. A título ilustrativo, os serviços de teletrabalho (home office), telemedicina, comércio digital, sistemas de pagamento online, cresceram significativamente no contexto da pandemia.  Ora, com a tecnologia aplicada de 5G às redes de telecomunicações haverá o crescimento exponencial de novos modelos de negócios. Dentro deste contexto, há o campo para a proliferação da internet-das-coisas (Internet of Things), uma rede de sensores com capacidade de coleta de dados em tempo em real. No âmbito das cidades inteligentes, já existem programas implantados de controle da eficiência do sistema de iluminação pública, mediante sensores.

Há, também, o potencial no contexto da sustentabilidade ambiental, de projetos de controle de consumo de água, controle de poluição ambiental e controle da poluição sonora. Em contexto de home office, por causa da pandemia, tornou-se mais urgente a questão do noise control dentro de condomínios e fora de condomínios. Em diversas cidades europeias, há projetos já executados de controle de ruído urbano, mediante redes de sensores espalhados pelas cidades. Para além disto, há um potencial do IoT na aplicação na gestão de estacionamentos públicos e privados. Também, há o potencial do IoT na aplicação do “poder de polícia” municipal na fiscalização sobre condomínios em diversos aspectos (saúde pública, vigilância sanitária, controle de poluição sonora, controle de vazamento de gás, controle de fogo e fumaça, segurança, controle do lixo, sinalização de edifícios para fins de tráfego aéreo, etc.). Dispositivos IoT são perfeitos para o campo de smarts buildings (edifícios inteligentes), como, por exemplo, o controle de elevadores (segurança e higiene em tempos de covid), o controle de cumprimento das regras de sinalização ótica para tráfego aéreo, entre outros. A propósito, registre-se que os condomínios (edifícios) participam do ecossistema de smarts cities na medida em que antenas das redes de telecomunicações são instaladas no topo dos edifícios.

O tema das smarts cities  ficou muito concentrado na pauta da segurança pública por muito tempo, no aspecto de implantação de câmeras de vigilância nas cidades. Agora, no contexto da pandemia, mostrou-se que há muito mais espaço em outras áreas para se explorar o potencial de redes 5G e IoT no âmbito das cidades inteligentes. De um lado, as Prefeituras podem se beneficiar de projetos significativos nos vetores de planejamento urbano, aplicação do poder de polícia e prestação de serviços públicos, a partir das redes de 5G e IoT. De outro lado, as empresas fornecedoras de tecnologias e serviços com base em tecnologia 5G e IoT tem ótimas oportunidades para oferecer serviços de produtores inovadores no segmento de smart cities. E, ainda, mais no contexto de mudanças climáticas e aquecimento global faz-se urgente a adoção de todas as tecnologias possíveis para o monitoramento em tempo real dos dados climáticos, bem como da implementação das medidas para a mitigação destas mudanças climáticas. Neste campo, há iniciativas de geoengenharia no sentido de modificar algumas características da atmosfera para atenuar os efeitos do aquecimento global. A título ilustrativo, a técnica jogar “sal” nas nuvens a fim de promover o reflexo da radiação solar para fora do planeta terra, o que poderia implicar no resfriamento da calota terrestre. Também, é preciso campanhas de educação ambiental para adoção de mitigação dos danos causados pelo consumo de produtos, provenientes de fontes poluidoras da atmosfera. Em síntese, há boas expectativas em relação à tecnologia de 5G e o setor de smart cities, em que pese crises de saúde e da economia.    

*Todos os direitos reservados, não podendo ser reproduzido ou usado sem citar a fonte.


[1] Cidades inteligentes: uma abordagem humana e sustentável. Câmara dos Deputados. Centro de Estudos e Debates Estratégicos. Consultoria Legislativa. Relatores: Francisco Junior, Angela Amin, Eduardo Braide e Haroldo Cathedral. Brasília: Câmara dos Deputados: Edições Câmara, 2021.

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Desafios para a Justiça Eleitoral diante de abusos de poder cibernéticos e/ou computacional

Ericson Scorsim. Advogado e Consultor no Direito Público. Doutor em Direito pela USP. Autor do livro Jogo geopolítico entre Estados Unidos e China na tecnologia 5G: impacto no Brasil, publicado na Amazon, 2020.

A literatura especializada tem revelado alguns novos termos decorrentes do ambiente cibernético e, respectivamente, das novas tecnologias de informações e comunicações o ambiente da internet. São expressões como cyberwar (guerra cibernética), cyberweapons (armas cibernéticas), weaponisation of social media (armamento das mídias sociais), information operation (operações de informação), desinformation campaings (fake news), computational propaganda, deep webpsycho operations (operações psicológicas), covert actions (ações encobertas), cyber militias (milícias cibernéticas), robots/bots, critical national infrastructure (infraestrutura nacional crítica), artificial intelligence, ataques cibernéticos por hackers, vazamento de dados de pessoas e empresas, financiamento ilegal de campanhas, micro-targeting, entre outras ações.

Todos estes temas vieram à tona com o ataque cibernético por campanhas de desinformação por agentes da Rússia contra o sistema eleitoral dos Estados Unidos, na campanha presidencial de 2016. Agentes russos via redes sociais espalharam boatos contrários à então candidata Hillary Clinton e favoráveis ao candidato Donald Trump. Outro episódio revelador destas táticas cibernéticas foi o escândalo da Cambridge Analytica, no qual a empresa obteve dados pessoais de milhões de pessoas, através do Facebook, sem o necessário consentimento dos usuários, para utilizar em campanhas eleitorais. Para agravar o quadro, em janeiro de 2021, os Estados Unidos sentiram na pele os riscos da polarização política e instrumentalização de redes sociais para convocar grupos paramilitares com a invasão do Congresso, na tentativa de impedimento a proclamação dos resultados da eleição de 2020 que consagrou Joe Biden como o novo Presidente norte-americano. No Brasil, vivemos intensas campanhas de desinformação e divulgação de fake news, com ataques às instituições democráticas e autoridades públicas, inclusive como a promoção de “assassinato” de reputações. Por tudo isto, entendo necessário a análise do poder cibernético e/ou poder computacional e as consequências sobre o sistema eleitoral. Por ora, o legislador e a justiça eleitoral tratam de temas que estão apenas na superfície do jogo político-eleitoral. Há a normativa sobre campanhas eleitorais por mídias sociais, fake news, financiamento ilegal de campanhas, entre outras. Mas, a complexidade do tema requer medidas mais efetivas de combate atos atentatórios à integridade do sistema eleitoral. Vamos imaginar algumas hipóteses.

O Brasil e seu sistema eleitoral é alvo de ataque cibernético por um país e/ou agentes estrangeiros. O sistema eleitoral tem condições de resistir ao ataque cibernético? Quem fará a defesa do sistema eleitoral? O Comando Cibernético do Exército é quem fará a defesa cibernética?[1] Será que o exército é o órgão mais adequado, imparcial, neutro e democrático para fazer este tipo de defesa? Se  péssimos militares do exército atuarem em benefício da reeleição do presidente da república a justiça eleitoral está preparada para investigar estes fatos? Na hipótese de “vazamento” de dados de milhões de eleitores, a justiça eleitoral está preparada para agir e reagir a este tipo de ataque cibernético? Por outro lado, vamos imaginar que um candidato e/ou grupo político crie fake news e criar um “exército digital” e/ou “milícia digital” de robôs, aproveitando-se de poder cibernético e/ou computacional. Assim, esta “milícia digital” busca, artificialmente criar consensos e dissensos na opinião pública, favoráveis ao seu candidato. O termo técnico para esta operação é astroturfing. Assim, o candidato consegue artificialmente manter milhões de seguidores em suas redes sociais, criando-se a ilusão de que existe grande apoio político ao seu nome.

Como a justiça eleitoral pode agir neste tipo de situação? Haverá auditagem do número dos eleitores dos candidatos?  Por outro lado, vamos imaginar que ocorra financiamento ilegal de campanha de determinado candidato proveniente de recursos do exterior.  Como a justiça eleitoral pode enfrentar este tipo de situação? Outro exemplo. Imagine-se que um candidato presidencial obtenha informações da CIA contra seu adversário político, e receba apoio de governante estrangeiros. E a partir daí monte uma estratégia político-eleitoral em sua campanha, com a exploração de ações judiciais e divulgação de notícias na mídia. Como a Justiça Eleitoral pode responder a este tipo de conluio entre candidato brasileiro e agência de inteligência estrangeira e governo estrangeiros. Enfim, todas estas hipóteses demandam a atualização da legislação eleitoral a seguir analisada. A tipificação como crime eleitoral o abuso do poder cibernético e/ou poder computacional no contexto sistema eleitoral que contribua com o desequilíbrio nas condições da disputa eleitoral, com a previsão de perda do registro da candidatura e do mandato.

Por outro lado, sugere-se a atualização da lei que prevê as condutas vedadas aos agentes públicos, de modo a contemplar as hipóteses de abusos de poder cibernéticos e/ou poder computacional, de modo a favorecer determinado candidato e/ou grupo político.  Regras de improbidade administrativa devem contemplar as hipóteses de abuso de poder cibernético/poder computacional. Assim, devem ser punidos aqueles que abusam de armas cibernéticas contra a soberania popular e as instituições democráticas, inclusive aplicando-se sanções severas contra agentes públicos civis e militares, inclusive com perda de cargo público. Além disto, deve ser debatido a hipótese de abusos cometidos por associações civis militares (“clubes militares”) que promovam atos atentatórios à democracia. Neste sentido, deve-se esclarecer a legislação para contemplar a hipótese de dissolução de associações militares (“clubes militares”) que promovam atos atentatórios à democracia. Para além disto, deve-se debater inclusive a perda do título militar (general, entre outros),  inclusive a perda da titulação do posto e patente e da perda da patente se o servidor público militar estiver na reserva, se comprovada a participação em atos atentatórios à democracia. Quem é contra a democracia brasileira não deve participar da vida democrática.  Por isso, a pessoa deve ter expulsa da participação do sistema político, inclusive defende-se a exclusão do direito de votar e de ser eleito.  Os antigos previam para este tipo de delito contra a república o exílio. Mas, atualmente, este tipo de sanção não pode ser aplicada.  Por isso, atos de suspensão de direitos políticos são bem-vindos para se punir quem praticar atos anti-democráticos. Além disto, deve-se prever medidas para o fortalecimento da justiça eleitoral em medidas de autodefesa cibernética, para garantir a integridade do sistema eleitoral.  Em discussão, as medidas de proteção ao livre fluxo de informações no ambiente democrático. Antigamente, o tipo ideal de democracia era representado pelo livre debate de ideias e troca de informações, baseadas no consenso quanto aos fatos e à verdade.

Atualmente, houve sensivelmente a degradação do ambiente democrático com campanhas de desinformação (algo extremamente perigoso à democracia), discursos de ódio,  atos de violência, campanhas de assassinato de reputações. Neste contexto, é fundamental a legislação ser atualizada de modo a prever a responsabilidade das empresas provedoras de redes sociais, diante de abusos de poder cibernético e/ou computacional. O projeto de lei sobre “fake news” e campanhas de desinformação é um primeiro passo. Mas, ainda são necessárias medidas mais amplas para conter abusos em campanhas de manipulação da opinião pública, com a propagação de perfis falsos em redes sociais, propaganda computacional, fake news, conteúdos caluniosos, difamatórios, injuriosos, entre outros.

Enfim, toda esta toxicidade é um perigo à democracia. Por isso, medidas de contenção de abusos de poder cibernético/computacional, no jogo político-eleitoral, para preservar as instituições democráticas e a soberania popular e prevenção de eventual desprestígio das forças armadas por eventuais de atos isolados de alguns péssimos militares e líderes tóxicos anti-democráticos. A toxicidade anti-democrática deve ser combatida, pois representa perigo à democracia. Por isso, o fortalecimento da Justiça Eleitoral em investigações de abusos de poder cibernético e/ou computacional é a conditio sine qua non para o fortalecimento das medidas de defesa da democracia. 

A soberania política deve ser protegida contra interferências ilegítimas no sistema eleitoral por robôs, algoritmos e/ou propaganda computacional que perturbem a qualidade do debate público brasileiro.  


[1] Sobre o tema do ciberespaço e a doutrina militar, ver: Escola de Comando e Estado-Maior do Exército. XXI Ciclo de Estudos estratégicos. Ciberespaço: a nova dimensão do campo de batalha. Organizadores: Coronel Carlos Educardo de Franciscis Ramos e outros, Rio de Janeiro: ECEME, 2019.

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Organização das Nações Unidas analisa o impacto das tecnologias de informação e telecomunicações sobre a soberania dos estados

Ericson Scorsim. Advogado e Consultor no Direito Regulatório das Comunicações. Doutor em Direito pela USP. Autor do livro Jogo Geopolítico entre Estados Unidos e China no 5G: impacto no Brasil, publicado pela Amazon.

A Organização das Nações Unidas (ONU) instalou um grupo de estudos sobre tecnologias de informações e telecomunicações e a segurança cibernética global. 

As razões apresentadas para o projeto são várias: o desenvolvimento avançado de novas tecnologias de informação e telecomunicações, o aumento da conectividade global, a natureza dual-use das tecnologias de informação e comunicação (isto é, uso civil e militar), a essencialidade destas tecnologias para os serviços de governo, a existência de ameaças reais na exploração destas tecnologias colocando-se em risco a segurança das nações, a expansão da internet das coisas e os riscos daí associados.

Diante disto, o relatório do grupo de estudos propõe medidas para a construção de confiança entre os países sobre o tema da defesa cibernética.[1] Em especial, busca-se a construção de regras, normas e princípios de responsabilidade dos estados em termos de direito internacional e defesa cibernética. Além disto, quer-se promover o diálogo institucional sobre o aumento da dependência de tecnologias de informação e comunicação.

Sugere-se ainda que os estados sejam encorajados na construção da capacidade para identificar e proteger infraestruturas nacionais e transnacionais críticas, bem como de infraestrutura crítica de informações supranacional. Quanto à promoção de comportamento dos estados responsável deve-se adotar uma estratégica de neutralidade tecnológica, a qual previna o abuso das tecnologias, no que tange a realização de ataques cibernéticos e exploração de vulnerabilidades das tecnologias de informação e comunicações, incluindo-se o contexto de “machine learning”, “quantum computing” e “internet das coisas”. Recomenda-se, ainda, que os estados não adotem “agentes terceiros” (proxies) para cometer internacionalmente atos danosos e, também, para impedir que seu território seja utilizados por atores não-estatais para cometer atos danosos contra outros países e/ou alvos. Assim, sugere-se medidas para “building confidence” entre os estados.

Em debate, o tema do direito à utilização da força pelos estados no ambiente cibernético. Os estados têm o direito de se defender no ambiente cibernético. Porém, a ação dos estados deve ser orientada pelos princípios de direito internacional, tais como: humanidade, necessidade, proporcionalidade, diferenciação e precaução.[2] Conforme relatório final da ONU: “States concluded that there are potentially devasting security, economic, social and humanitarian consequences of malicious ICT activities on critical infrastructure (CI) and critical information infrastructure (CII) supporting  essential services to the public. While it is catch State’s prerogative  to determine which infrastructures it designates as critical, such infrastructure may include medical facilities, financial services, energy, water, transportation and sanitation. Malicious ICT activities against CI and CII that undermine trust and confidence in political and electoral processes, public institutions, or that impact the general availability or integrity of the internet, are also  a real and growing concern. Such infrastructure may be owned, managed or operated by the private sector, may be shared or networked  whith another state or operated across different states. As a result, inter-state or public-private cooperation may be necessary to protect its integrity, functioning and availability”.[3]

A preocupação da ONU é com a utilização abusiva de tecnologias de informação e comunicação pode ser a causa futuros conflitos entre os estados. Ou seja, ataques cibernéticos entre os estados podem desencadear conflitos graves entre os estados. Por isso, a ONU quer construir medidas para a capacitação da confiança entre os estados, mediante parcerias confiáveis. Neste sentido, recomenda-se a instalação de equipes especializadas em respostas cibernéticas: “computer emergency response teams (CERTs) or “computer security incidente response teams (CSIRTs). Deste modo, recomenda-se o acesso às tecnologias de modo facilitado aos estados, o respeito ao princípio da soberania estatal, a proteção da confidencialidade de informações sensíveis.

Sobre o tema, registre-se que operações cibernéticas podem violar a soberania de outros países. Um país pode resolver infraestruturas nacionais críticas de outros países (sistemas de telecomunicações, de energia, financeiro, água, aviação civil, entre outros). Recentemente, a mídia especializada apontou que a França ampliou o número de operações cibernéticas contra alvos localizados em outros países. Daí abriu-se o debate sobre se a França estaria adotando uma prática contraditória em termos de soberania. De um lado, a França advoga pela concepção purista de soberania clássica, em termos de território físico.  Mas, de outro lado, a França mantém a posição flexível de soberania no ambiente cibernético, ao ponto de atacar alvos cibernéticos localizados em outros países. Nesta segunda opção, no caso de ataque cibernético, há simplesmente a negação da soberania de outro estado. A França desencadeou diversas operações cibernéticas: the Emoted (2021), Encrochat (2020) e Retaup (2019).  A operação Emotet envolveu a operação coordenada entre França, Holanda, Alemanha e Estados Unidos, Reino Unido, Lituânia e Ucrânia para causar a disrupção do emotet malware. A operação consistiu em implantar em servidores de comando e controle um software malicioso. Sistemas de computadores localizados em mais 90 (noventa) estados foram infectados pelo emotet malware. Na operação EncroChat, em 2020, foi liderada pelo Center for Combating Digital Crime (C3N), da French National Gendarmerie. O alvo foram os servidores de empresa privada EncroChat que fornecer telefones criptografados para comunicações seguras. Um software malicioso foi infiltrado nos servidores da referida empresa e exigia a atuação dos softwares instalados nas máquinas, a partir da atualização o agente malicioso era instalado.

Em 2019, após o Ministério da Defesa da França anunciar que o direito internacional é aplicável ao cyberspace, a National Gendermerie anunciou a operação cibernética sobre a empresa privada Avast para combater o vírus malicioso Retadup. Este vírus infectou servidores em território francês em sistemas de comando e controle. Na doutrina militar sobre o tema (Tallin Manual 2.0), considera que operações de aplicação da lei lideradas por um estado que ataquem os servidores de comando e controle localizados em outro estado (sem o consentimento deste outro estado), constituem violação da soberania estatal do estado considerado alvo. A operação cibernética somente poderia ser efetivada dentro do território do estado. Enfim, há observatórios de pesquisas que apontam a práticas ofensivas por 23 (vinte e três) estados.

Deste modo, há duas percepções sobre a natureza das operações cibernéticas. Segundo o autor Jack Kenny há duas explicações possíveis sobre este assunto.[4] De um lado, os “puristas” defendem que operações de persistente engajamento cibernético com a invasão de redes de outros estados para manter presença dentro destas redes e, assim, obter inteligência poderia configurar permanente violação da soberania do estado.

Há políticas cibernéticas neste sentido de permanente engajamento no espaço cibernético: U.S (“defend forward”), U.K (“active defense”), Canada (“active cyber”), New Zealand (“internationally active” engagement”. Também, há capacidade cibernética ativa da Rússia, China, Irã, Coréia do Norte, entre outros. Nas conclusões do referido autor: “states that choose not to recognize that a rule of sovereignty applies to cyber operations, such as the U.K, maintain operational flexibility but leave their infrastructure open to attacks that would not be prohibited by a rule of international law below a prohibited intervention. It is clear that for states to develop an understanding of how the rights inherent in sovereignty apply to cyber operations, they must balance the interests of operational freedom with the protection of critical national infrastructure on a state’s territory to identify a ‘half-way house” de minimis threshold at which a violation of sovereignty takes place. Over time, in the absence of a treaty, statements by states by stats on how they interpret the rights inherent in sovereignty to apply with specificity to cyber operations may contribute to the formation of specific customary international law that may focus or clarify the application of such rules”.

Em síntese, as Nações Unidas percebem o problema do conflito entre estados e/ou atores não-estatais e a questão da soberania, em relação às operações realizadas no ambiente cibernético. A preocupação é com infraestruturas nacionais críticas que poderão classificados como alvos militares. Um dos caminhos para a solução deste problema é o fortalecimento das regras, princípios e costumes de direito internacional, a fim de conter a capacidade ofensiva dos estados no espaço cibernético, bem como garantir a autodefesa dos estados diante de ataques cibernéticos.

Enfim, o tema do impacto das tecnologias da informação e telecomunicações sobre a soberania é de interesse do Brasil. É preciso aprofundar estudos, pesquisas e medidas para melhorar a governança cibernética do estado brasileiro, das empresas e das pessoas. A defesa cibernética, atualmente, é um conditio sine qua non para a soberania político-eleitoral do país.

*Todos os direitos reservados, não podendo ser reproduzido ou usado sem citar a fonte.


[1] United Nations, General Assembly.  “Second ‘pre-draft’ of the report of the OEWG on developments in the field of information and telecommunications in the context of international security.

[2] United Nations, General Assembly. “Open-ended working group on developments in the field of information and telecommunications in the context of international security, 8-12 march 2021.

[3] United National, General Assembly. Open-ended working group on developments in the field of information and telecommunications in the context of international security. Final substantive report, 10 march 2021.

[4] Kenny, Jack. France, cyber operations and sovereignty: the “purist” approach to sovereignty and contradictory state practice. March, 12, 2021.

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Geopolítica e a indústria de semicondutores (chips)

Ericson Scorsim. Advogado e Consultor em Direito Regulatório das Comunicações. Doutor em Direito pela USP. Autor do livro Jogo Geopolítico entre Estados Unidos e China nas comunicações 5G: impacto no Brasil, publicado na Amazon.

No século 21 a indústria de semicondutores (microeletrônica) é uma das líderes na economia global. Microprocessadores estão presentes em todos os dispositivos eletrônicos: computadores, smartphones, televisores, carros, roteadores, entre outros. Na cadeia global de suprimentos de semicondutores é dominada pelos Estados Unidos, Europa e Ásia, os principais fornecedores globais de tecnologias e os principais mercados consumidores.

O tema encontra-se na geopolítica mundial. Em 2020, o governo dos Estados Unidos impôs diversas sanções à empresa Huawei, dentre as quais a proibição de fornecer de tecnologia de rede 5G. Além disto, o governo norte-americano impôs restrições ao fornecimento de semicondutores para a empresa chinesa. Paradoxalmente, embora os Estados Unidos dominem a indústria de semicondutores, o país não possui nenhuma empresa líder global em tecnologia de 5G. Por isso na competição internacional os Estados Unidos estão atrasados na tecnologia de 5G.

Recentemente, o Ministério da Economia da  Alemanha anunciou um plano de investimento em pesquisa e desenvolvimento na indústria de microeletrônica, para preparar-se para as tecnologias de 5G e 6G. A Alemanha juntamente com outros países europeus: Itália, Bélgica, Finlândia, dentre outros,  assinaram um declaração sobre  “A European Iniciative on processors and semiconductor Technologies” destacando que a indústria de semicondutores é uma indústria global. Por isso, é importante investimentos em toda as etapas da cadeia produtiva: manufatura dos equipamentos semicondutores, design, produção, testes, empacotamento, entre outras. Destaca, ainda, que os investimentos em pesquisa e desenvolvimento na indústria de semicondutores é uma das mais elevadas, representa 15% (quinze por cento) a 20% (vinte por cento).

A Europa está focada no desenvolvimento da indústria de semicondutores nos aspectos: energia dos equipamentos (baterias), tecnologias de radiofrequência, sensores inteligentes embarcados para inteligência artificial, microcontroladores, entre outros. Assim, o objetivo é a mobilização dos financiadores da indústria, mediante a construção de uma aliança industrial para firmar mapas estratégicos em pesquisa e investimentos nos ecossistemas de semicondutores.   

Em síntese, a finalidade da aliança industrial é preparar a indústria europeia para a próxima geração de processadores de baixa potência, a serem utilizados nas redes de 5G e 6G. Na Europa, o tema da soberania tecnológica e digital está na pauta. Entende-se que é vital para os interesses europeus o domínio da indústria de semicondutores, bem como das infraestruturas de redes de comunicações, bem como da indústria de computação em nuvem. Por isso, há programas de investimentos em data centers europeus, através do programa Gaia-X.

Os europeus estão realizando pesquisas em tecnologia de 5GHz. A Noruega, através de sua universidade, é o país na vanguarda destas pesquisas científicas. Por aqui, no Brasil, o governo federal aprovou o Decreto n.  10.615, de 29 de janeiro de 2021, o qual trata de incentivos fiscais para investimentos na indústria de semicondutores. Há incentivos fiscais (PIS, IPI) para importação de softwares. Existe a previsão de benefícios fiscais com investimentos em pesquisa, desenvolvimento e inovação no apoio ao desenvolvimento da indústria de semicondutores, o que inclui: a concepção, desenvolvimento e projeto (design); difusão ou processamento físico-químico e corte de lâmina (wafer), encapsulamento e teses, corte do substrato, encapsulamento e teste em circuitos integrantes, mostradores de informações (displays), entre outros.

Existe, também, a definição das atividades de pesquisa, desenvolvimento e inovação.  Registre-se que falta no País uma visão geoestratégica sobre a indústria global de semicondutores, focando-se apenas na importação de componentes. No governo anterior houve a criação da Empresa Brasileira de Semicondutores; uma empresa estatal dedicada à fabricação de semicondutores. 

No atual governo decidiu-se por extinguir esta empresa. Ora, semicondutores são considerados uma tecnologia dual-use, isto é, com utilização civil e militar. Por isso, países desenvolvidos consideram a indústria de semicondutores em sua geoestratégica de Estado. Curiosamente, os Estados Unidos na lei National Defense Authorization Act prevê investimentos federais para a manufatura da indústria de semicondutores em território norte-americano. Diversos estados norte-americanos disputam a atração de investimentos internacionais na produção doméstica de semicondutores. As tecnologias de 5GHz (cinco giga hertz) e 6GHz (seis giga herz) moldarão o futuro da economia digital dos países. A falta de semicondutores pode colapsar uma indústria.

A dependência de semicondutores produzidos em outros países é um risco sistêmico ao país, inclusive às suas infraestruturas nacionais críticas. Se o Brasil não possuir uma visão geoestratégica global sobre a indústria de semicondutores perderá as oportunidades históricas que poderão representar um “salto quântico” no desenvolvimento de tecnologias avançadas e na preparação de sua economia digital.

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Análise da decisão da Anatel sobre o leilão de frequências de 5Ghz

Ericson Scorsim. Advogado e Consultor no Direito Regulatório das Comunicações. Doutor em Direito pela USP. Autor da Coleção de Ebooks sobre Direito das Comunicações, publicados na Amazon.

A Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel) deliberou a respeito da formatação do edital do leilão de frequências do 5 GHz (cinco gigahertz).

Trata-se de uma importante decisão que contribui para a integração econômica nacional, mediante conectividade digital. Como principais vantagens da tecnologia de 5GHz (cinco gigahertz) aplicada às redes de telecomunicações: a ampliação da velocidade do transporte de pacotes de dados (há estudos prevendo o aumento de 100 (cem) vezes comparando-se com as redes de 4GHz (quatro gigahertz), com a redução do tempo de retorno entre os canais de comunicações, a eficiência na utilização do espectro de frequências, o aumento do número de dispositivos conectados às redes, eficiência energética dos equipamentos. O denominado tempo de latência (tempo de resposta) será diminuído. Por isso, a tecnologia de 5GHz (cinco giga hertz) facilitará operações de diversas naturezas em tempo real.

 Como pontos principais da decisão da agência reguladora: i) a utilização da faixa de frequências de 700 MHz (setecentos megahertz), 2,3 GHz (dois vírgula três giga hertz)  3,5 GHz (três vírgula cinco giga hertz),  26 GHz  (vinte e seis giga hertz) com a definição de blocos nacionais e regionais; ii) compromissos mínimos de instalações de estações radio-base com objetivo de redução de desigualdades regionais; iii) obrigação de instalação de rede privativa da administração pública federal; iv) ressarcimento dos custos de limpeza de faixa do espectro de frequências de 3,5 GHz); v) obrigação de cobertura de serviços de telecomunicações e internet em rodovias federais; vi) a criação de uma entidade administradora da faixa de frequências de 3,5 (três vírgula cinco) GHz, responsável pela implantação do programa Amazônia integrada e sustentável e a construção da rede privativa de comunicação da administração pública federal, bem como para lidar com questões do ressarcimento de custos da limpeza quanto à ocupação da faixa do sinal de TV por satélite. O tema do 5 GHz (cinco giga hertz) tem quatro aspectos principais: a) o acesso às frequências do espectro, b) as infraestruturas de rede de comunicações, c) os investimentos privados, d) a regulação setorial e riscos de litigiosidade contra o edital do leilão; e) o potencial econômico das redes 5GHz (cinco giga hertz).

Padrão técnico do 5G

A Anatel, por maioria de votos, votou pelo padrão pleno da tecnologia 5G, denominado Release 16. Neste aspecto, houve divergência entre os votos dos conselheiros. Mas, a exigência imediata do formato 5GHz standalone foi a proposta vencedora. Neste padrão completo, há exigências técnicas quanto à virtualização das redes de telecomunicações, fatiamento da rede, aplicações de inteligência artificial em tempo real e distribuição em computação em nuvem. Ficou vencido o Conselheiro Presidente da Anatel, a qual propunha que o padrão completo fosse exigido tão-somente a partir de 2025.  Este voto foi seguido pelo Conselheiro Emanoel Campelo. Esta proposta vencida foi sugerida para compatibilizar o funcionamento do 5GHz (cinco giga hertz) com os atuais smartphones. Assim, a sugestão garantiria uma transição gradual e segura, havendo obrigatoriedade imediata do padrão completo do 5GHz (cinco giga hertz) nos termos da proposta do Presidente da Anatel. Caberia às empresas de telecomunicações definir a melhor modelagem tecnológica para a questão e não à Anatel. Em síntese, o debate na Anatel foi entre o padrão de redes autônomas – standalone (denominado SA) ou redes não autônomas (non-standalone). Em termos técnicos, o 5G NR release 15 permite duas opções para o funcionamento das redes de telecomunicações, o modo autônomo e o não-autônomo. No entanto, o 5G NR release 16 permite apenas a operações das redes e modo autônomo. O Relator propôs a configuração de rede 5GHz, sem o compartilhamento de recursos da rede de 4Ghz. Segundo explicações do voto do Conselheiro Presidente, na operação com autonomia, a estação radio-base de comunicação sinaliza e controla a rede e a transferência de informações aos usuários com a utilização exclusiva da arquitetura do núcleo da nova geração (5G packet core). Diferentemente,  em modo não-autônomo, o controle é realizado pelo núcleo periférico (4G envolved packet core), enquanto as informações ficam sob encargo do núcleo 5GHz.

Acesso às frequências do espectro

A faixa de frequências do 5Ghz é objeto de licenciamento pela Anatel. Frequências do espectro são consideradas um bem público. Assim, o seu uso depende de licenciamento. Por isso, a empresa interessada em prestar serviços de telecomunicações e internet nesta faixa necessidade de autorização da Anatel. O acesso às frequências do espectro eletromagnético é essencial para a prestação dos serviços de comunicação móvel. Além disto, os serviços de telecomunicações são considerados essenciais, acentuada esta essencialidade no contexto da pandemia. Na disputa do frequências, há as empresas de telecomunicações e as empresas provedores de pequeno porte, as quais possuem menos de 5% (cinco) por cento do território nacional. Foi considerada a finalidade não arrecadatória do leilão de frequências do 5G. Por isso, o edital do leilão busca cobrar um valor justo para remuneração do direito de uso destas frequências. Há diversas faixas de frequências complementares à faixa de 5 GHz (cinco giga hertz) objeto do leilão. As faixas de frequências de 700 MHz (setecentos mega hertz), 2,3 GHz (dois vírgula três giga hertz), 3,5 GHz (três vírgula cinco giga hertz), 26 GHz (vinte e seis giga hertz).  Cada faixa de frequência tem utilidades específicas em sua capacidade de transmissão de dados. Por isso, são necessárias arquiteturas de redes diferentes conforme o tipo da frequência. Uma são melhores para a propagação de distâncias mais curtas e outras para adequadas mais distâncias longas.

Fases do leilão

A proposta do edital do leilão do 5GHz tem as seguinte fases:

Faixa de 700 Mhz

Primeira rodada –Bloco 10 + 10 em âmbito nacional, com a previsão de compromissos em localidades sem 4G e rodovias federais.

Segunda rodada – 2 blocos de 5 +5 regionais, mas com compromissos em localidades sem 4GHz e rodovias federais.

Há limite à participação nesta faixa de frequências de empresa controladora, controlada ou coligada que já possua na mesma área geográfica autorização de uso de radiofrequências em caráter primário na faixa de 698 Mhz a 806 Mhz, conforme Resolução n. 703/2018.

Faixa de 3,5 Ghz

Primeira Rodada. Blocos regionais de 80 (oitenta) Mhz, compromissos de instalação de redes de transporte (backhaul) em municípios relacionados pela Anatel, instalação de estações radio-base que permitam oferta de serviços móvel pessoal com padrão igual ou superior ao 5G NR release 16 do 3GPP, na proporção de uma estação para cada 10 (dez) mil habitante, ressarcimento de soluções para interferência na recepção do sinal de televisão aberta e gratuita, transmitidos por satélite via banda C, conforme Portaria n. 1924, do Ministério das Comunicações.

Segunda rodada (na hipótese de não houver interessados na primeira rodada), blocos de 20 Mhz. Teto máximo de 100 MHz para o conjunto de lotes da faixa de 3,5 GH, limitação para arrematação de mais de dois blocos regionais.

Faixa de 2,3 GHz.

Primeira rodada. Bloco de 50 MHz e de bloco de 40 Mhz regionais, com compromisso de cobertura de 95% da área urbana dos municípios sem 4G. teto máximo de frequências de 50 Mhz para o conjunto compreendo os lotes da faixa de 2,3 Ghz respeitando-se os limites da Resolução 703/2018.

Faixa de 26 GHz.

Primeira rodada. Cinco blocos nacionais e três blocos regionais de 400 Mhz, sem compromissos.

Segunda rodada. Até 10 blocos nacionais e 6 regionais de 200 Mhz que não forem vendidos na rodada anterior, sem compromissos. Teto máximo de frequências: 1 GHz para o conjunto compreendendo os lotes da faixa de 26 Ghz.

Investimentos em equipamentos de redes em tecnologia 5G e backhauls

As empresas de telecomunicações investirão em tecnologia de 5Ghz em suas redes de telecomunicações. A princípios, há estimadas que os valores serão de mais de R$ 30 bilhões de reais. A princípio, foi afastada qualquer proibição ao fornecimento de tecnologia conforme a origem do país. Por isso, as empresas de telecomunicações podem escolher livremente seu fornecedor de tecnologia de equipamentos de rede de 5GHz. Não houve nenhuma restrição à empresa chinesa Huawei. Todo e qualquer fornecedor de tecnologia deve, no entanto, seguir as regras de segurança cibernéticas, definidas pela Anatel. Portanto, segue-se às regras do livre mercado quanto à participação de empresas fornecedoras de equipamentos de redes de telecomunicações, observados os critérios de segurança cibernética.

Rede Privativa de Comunicações do governo federal

O edital do leilão fixou a obrigação de instalação do vencedor do leilão arcar com a instalação da rede privativa do governo federal. Esta rede de comunicações trata com dados e informações sensíveis contém requisitos de segurança cibernética mais rígidos do que as redes comuns. Debate-se a respeito da possível exclusão do fornecimento de tecnologia pela empresa chinesa Huawei. Por ora, não há uma decisão definitiva. Estima-se que o custo da construção desta rede privativa do governo seja de aproximadamente mais de R$ 700 (setecentos) milhões de reais.  Este é um ponto sensível. As redes de comunicações do governo devem ser parâmetros de segurança altamente confiáveis contra riscos de espionagem política e econômica. Os indicadores de ataques cibernéticos às redes de comunicações governamentais são alarmantes. Dados de cidadãos são alvos de ataques por hackers e, assim, “vazados” na internet. Há hackers que atuam sozinhos, mas há hackers que atuam para governos estrangeiros.  Há a banalização de vazamentos de dados dos cidadãos brasileiros. Por isso, é fundamental o reforço na segurança cibernética das redes governamentais, consideradas infraestruturas nacionais críticas. 

Ressarcimento Empresas exploradoras de satélite nacional e estrangeiro

Diante da necessidade de realocação do espectro de frequências na faixa de 3.625 Mhz a 3.700 Mhz, ocupado tradicionalmente pelos serviços de TV por satélite (TV por parabólica), haverá o ressarcimento dos custos com a limpeza do espectro. Para obter a indenização, as operadoras de satélites deverão comprovar que as estações receptoras operam nesta faixa de frequências, bem como a quantidade de estações receptadoras de sinais de TV por satélite.

Entidade Administradora da Faixa de 3,5 GHz

A Anatel deliberou pela atribuição da entidade administradora da faixa de frequências de 3,5 GHz (EAF) a responsabilidade pelo saneamento de eventuais interferências no sinal de TV por satélite, decorrentes da implantação da tecnologia de 5Ghz. Ao que parece, esta entidade também terá a responsabilidade quanto à destinação de recursos do leilão do 5G para a implantação dos programas Norte Conectado e Amazônia Integrada e Sustentável, conforme análise a seguir.

Programa Norte Conectado e Programa Amazônia Integrada e Sustentável – PAIS

O Ministério das Comunicações definiu dois programas de governo  denominados Programa Amazônia Integrada e Sustentável – PAIS e Programa Norte Conectado. O tema é tratado na Portaria n. 1.924/2021 do Ministério das Comunicações. O programa da Amazônia conectada integra o programa Norte-conectado. Trata-se de um projeto de infraestrutura de rede de telecomunicações e internet, mediante uma rede de fibras óticas instaladas em rios amazônicos. O objetivo é levar conectividade digital à região amazônica e ao norte do país. Uma das empresas responsáveis pela instalação dos cabos fluviais é a empresa italiana Prysmian, especializada inclusive no setor de defesa, com o fornecimento de cabos militares. Na parte operacional, o exército brasileiro é comanda a supervisão das operações do programa Amazônia conectada. Houve o debate na Anatel sobre a destinação dos recursos para a implementação destes dois programas de governo. Uma corrente defende que os recursos sejam alocados em entidade a ser designada pelo Ministério das Comunicações. Outra linha de entendimento sustenta que a destinação dos recursos seja destinada para a entidade administradora da faixa de frequências de 3,5 (três vírgula cinco) GHz.

Riscos de litigiosidade quanto à impugnação do edital

 A Anatel buscou se antecipar a eventuais riscos de litigiosidade do tema do pagamento de custos decorrentes da desocupação da faixa de 3,625 MHz a 3.700 Mhz. Neste sentido, a agência antevê riscos de litigiosidade administrativa e judicial. Por isso, prevê as medidas de suspensão, interrupção ou revogação na hipótese de litigiosidade. Há, inclusive, a disposição de excluir da faixa de frequências de 3.625 MHz a 3.700 Mhz, a fim de prosseguir a licitação com os demais lotes.

Potencial econômico das redes 5Ghz

Há estudos econômicos que indicam o valor econômico da faixa de frequências do 5Ghz. E, ainda, estudos que apontam que a utilização desta faixa de frequências tem o potencial de agregar valor econômico ao produto interno bruto. Grande parte de áreas rurais não contam com internet, por banda larga. Assim, com a tecnologia 5GHz, juntamente com o 4Ghz, tem o potencial para levar à conectividade ao campo. Além disto, a cobertura de 5GHz em rodovias federais também possibilitará a expansão do comércio, bem como o rastreamento de cargas em tempo real. Há inúmeras aplicações de 5Ghz: agricultura de precisão, automatização em portos e aeroportos, serviços de telemedicina, teleducação, automatização de operações em minas e plataformas de petróleo e gás, transportes e logística, entre outros. Um dos potenciais do 5GHz é a implantação de redes de internet das coisas (comunicações máquina a máquina), caracterizados basicamente por sensores que podem ser utilizados em serviços de telemetria, entre outras aplicações.

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Análise da decisão da Anatel sobre liberação da faixa de frequências de 6 GHz (seis giga hertz)

Ericson Scorsim. Advogado e Consultor no Direito Regulatório das Comunicações. Doutor em Direito pela USP. Autor do livro Jogo geopolítico entre Estados Unidos e China no 5G: impacto no Brasil. Autor da Coleção de Livros sobre Direito da Comunicação, disponíveis na Amazon

A Agência Nacional de Telecomunicações do Brasil (Anatel) decidiu pela liberação do uso faixa de frequências de 6GHZ (5.925 a 7.125 MHz) para serviços de wi-fi e wi-6E.

Na decisão foram definidos os requisitos técnicos para a avaliação da conformidade de equipamentos de radiocomunicação de radiação restrita. 

A decisão da Anatel alinha-se à posição da Federal Communications Comission dos Estados Unidos no sentido de permitir o uso da faixa de 6Ghz sem a necessidade de licenciamento das frequências.  A Anatel antecipou-se à regulamentação internacional a ser definida pela União International de Telecomunicações (UIT).

Segundo a decisão da Anatel: “não existe, no âmbito da ITU, a expectativa de discutir o uso da faixa de 6,425-7,025 GHz para o serviço móvel nas Américas, nas tão somente na Europa”.  E, segundo, a Anatel a liberação da faixa de frequências do 6GHZ “não impede o seu uso futuro também para a quinta geração do serviço móvel (5G), visto haver iniciativas voltados ao 5G não licenciado  (5G NR-U)”.

Deste modo, foram estabelecidos os limites dos equipamentos para baixa potência interior (indoor), a fim de evitar interferência entre outras faixas de frequências. Além disto, foi analisada a coexistência dos dispositivos de muito baixa potência (very low power) com os sistemas de transportes inteligentes (ITS), a tecnologia para gestão autônoma de tráfego veicular. Ademais, foram verificados mecanismos para coordenação automática de frequências.  Segundo ainda decisão da Anatel, no voto do Conselheiro Carlos Manuel Baigorri que aqui: “… os EUA sediam diversas empresas fabricantes de equipamentos e, pela proximidade geográfica e por se tratar de comum destino turístico, a importação de equipamentos americanos costuma ser menos onerosa e mais facilitada. Com isso, ainda que o Brasil opte somente permitir o uso não licenciado da parcela inferior da faixa, o impedimento de entrada e de uso de equipamentos wi-fi 6e se mostraria bastante difícil, especialmente pela promessa de entregar melhores condições aos consumidores, o que inevitavelmente implicaria em incontáveis casos de interferências a uma eventual rede móvel operando a faixa superior”.

A decisão da Anatel foi elogiada pelas entidades do setor de wi-fi, como um caso de liderança do Brasil para o mundo na questão da regulamentação da faixa de frequências de 6GHz. Equipamentos de 6Ghz são estão prontos à comercialização. Os fabricantes destes equipamentos apenas estavam aguardando uma decisão final da Anatel do tema, para providenciar sua comercialização no Brasil. De fato, há um potencial econômico gigantesco com a liberação de 6GHz para o wi-fi. Esta tecnologia melhor conectividade em espaços fechados (denominada indoor). Assim, possibilidade do escoamento do tráfego de dados das redes fixas e móveis de internet para dispositivos, como é o caso de smartphones, notebooks, tablets, entre outros. 

Há oportunidades de mercado no wi-fi. Empresas especializadas em fornecer tecnologia de wi-fi para shoppings, lojas, hospitais, clínicas, estacionamentos, aeroportos, praças, estádios de futebol, entre outros. Existe oportunidades para empresas de softwares focadas na alocação automática de frequências do espectro. Também, há oportunidades para as empresas fabricantes de equipamentos de rede de 6GHz, bem como de dispositivos. Há todo um potencial no segmento de internet das coisas (IoT), isto é, em comunicações máquina-a-máquina. Por isso, abrem-se janelas de oportunidades para empresas fabricantes de sensores em diversas aplicações: agricultura de precisão, dispositivos biomédico, indústria 4.0, logística, entre outros.  Além disto, as big techs têm especial interesse no tema. O Facebook tem projetos de realidade virtual e realidade aumentada, mediante a conexão entre óculos virtuais e smartphones. A Apple tem projetos a partir de smart watches (relógios inteligentes)  com aplicações na saúde. A Amazon tem programas de robotização de seus centros de logística. Com as tecnologias de 6Ghz, exames médicos com imagens contendo bastante dados serão mais rapidamente transmitidos de um ponto a outro.  

Em resumo, a Anatel com a decisão do 6Ghz contribui com o ambiente de inovação, bem como com a segurança jurídica necessária à realização de investimentos em novos modelos de negócios que utilizem do espectro de radiofrequências, bem como relacionados à conectividade em diversos setores econômicos. A tecnologia de 6G é uma grande aposta para os serviços de realidade virtual, aumentada, holografia e robótica. Por isso, ela está associada diretamente ao desenvolvimento de inteligência artificial, big data e sistemas de computação em nuvem. Quantidades gigantescas de dados provenientes de equipamentos e sensores são coletados, processados, armazenados e transferidos. Por tudo isto, há preocupações quantos riscos à segurança cibernéticas das redes de 6 Ghz, especialmente quando à proteção de dados pessoais e dados não-pessoais dos usuários.  Deste modo, protocolos de criptografia devem ser reforçados, a fim de proteger a privacidade dos usuários. Este é possivelmente será o próximo foco de atenção no tema do 6Ghz.

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Hospedagem de e-mail no exterior não isenta provedor de fornecer dados exigidos por juiz brasileiro

​​Em consonância com o artigo 11 do Marco Civil da Internet, haverá a aplicação da lei brasileira – e a jurisdição de autoridade nacional – sempre que qualquer operação de coleta, armazenamento e tratamento de registros e dados pessoais ou de com​unicações por provedores de internet ocorrer no Brasil, ainda que apenas um dos dispositivos esteja no país e mesmo que as atividades sejam feitas por empresa no exterior.

O entendimento foi estabelecido pela Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) ao manter acórdão do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) que determinou o prosseguimento da execução de multa de R$ 310 mil contra a Microsoft, por descumprimento de ordem judicial para fornecer informações de um usuário de e-mail que teria lançado ameaças contra uma pessoa e uma empresa.

No recurso especial, a Microsoft defendeu que a Justiça brasileira seria incompetente para a análise do caso, já que o endereço eletrônico era acessado de fora do Brasil e o provedor de conexão também se localizava no exterior.

Relatora do recurso, a ministra Nancy Andrighi explicou que, de acordo com a doutrina, em conflitos transfronteiriços na internet, a autoridade responsável deve atuar de forma prudente, reconhecendo que a territorialidade da jurisdição permanece como regra, cuja exceção só pode ser invocada quando atendidos três critérios cumulativos: a existência de fortes razões jurídicas de mérito; a proporcionalidade entre a medida e o fim desejado; e a observância dos procedimentos previstos nas leis locais e internacionais.

A ministra também lembrou precedente da Quarta Turma (REsp 1.168.547) no sentido de que, quando a alegada atividade ilícita tiver sido praticada na internet, independentemente de foro previsto no contrato de prestação de serviço, a autoridade judiciária brasileira é competente – desde que seja acionada para resolver o conflito se o autor tiver domicílio no país, e o Brasil tenha sido o local de acesso à informação.

Equívoco

Nancy Andrighi considerou um equívoco imaginar que qualquer aplicação hospedada fora do Brasil não possa ser alcançada pela jurisdição nacional ou que as leis brasileiras não sejam aplicáveis às suas atividades.

“É evidente que, se há ofensa ao direito brasileiro em aplicação hospedada no estrangeiro (por exemplo, uma ofensa veiculada contra residente no Brasil em rede social), pode ocorrer a determinação judicial de que tal conteúdo seja retirado da internet e que os dados do autor da ofensa sejam apresentados à vítima. Não fosse assim, bastaria a qualquer pessoa armazenar informações lesivas em países longínquos para não responder por seus atos danosos”, explicou.

Leitura no Brasil

Segundo a ministra, a alegação de que os acessos à conta de e-mail da qual se originaram as mensagens ofensivas teriam ocorrido no exterior, além de não ter sido devidamente comprovada, não é relevante para a solução do processo, tendo em vista que tais mensagens foram recebidas e lidas em território brasileiro – o que, para a relatora, já é motivo suficiente para atrair a jurisdição nacional.

Ao manter o acórdão do TJSP, Nancy Andrighi enfatizou que a afirmação de que a obtenção dos dados do autor das mensagens dependeria de provedores localizados fora do país não é capaz de alterar o julgamento, pois o procedimento de identificação precisa de informações tanto dos provedores de aplicação quanto, posteriormente, de um provedor de acesso (uma empresa de telefonia).

“Esta controvérsia envolve a primeira parte das informações (os registros de aplicação). Se houver a necessidade de dados de provedores de acesso localizados no estrangeiro, então haverá o dever de pleitear tais informações em jurisdição estrangeira”, concluiu a ministra.

Leia o acórdão.​​

Esta notícia refere-se ao(s) processo(s):REsp 1745657

Fonte: Superior Tribunal de Justiça – STJ

https://www.stj.jus.br/sites/portalp/Paginas/Comunicacao/Noticias/02032021-Hospedagem-de-e-mail-no-exterior-nao-isenta-provedor-de-fornecer-dados-exigidos-por-juiz-brasileiro.aspx

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Anatel aprova requisitos técnicos para Wi-Fi 6E

Medida visa oferecer aos usuários a melhor experiência de conectividade.

O Conselho Diretor da Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel) aprovou nesta quinta-feira (25/2), por unanimidade, os requisitos técnicos do Wi-Fi 6E, o novo padrão de redes sem fio. Pela decisão do colegiado, o Ato nº 14.448/2017, que aprovou os Requisitos Técnicos para a Avaliação da Conformidade de Equipamentos de Radiocomunicação de Radiação Restrita, será atualizado e passará a contemplar equipamentos que operam na faixa de 5.925 MHz a 7.125 MHz.

Relator da proposta, o conselheiro Carlos Baigorri destacou em sua apresentação que o Wi-Fi 6E trará ganhos como maiores taxas de transmissão, melhor experiência de múltiplo acesso, canais de 160 Mhz e menor consumo de energia. A medida está alinhada às novas tecnologias emergentes, que prometem aos usuários evolução em qualidade e em diversidade dos serviços usufruídos por meio de dispositivos sem fio.

Pontos indoor. A Anatel decidiu não estabelecer limite de largura de canal para o Wi-Fi 6E, anteriormente proposto em 320 MHz, visando implementações futuras na faixa de 6 GHz. Em relação aos tipos de equipamento de radiação restrita nessa faixa, serão permitidas diferentes condições para ponto de acesso indoor (de baixa potência)/ponto de acesso subordinado, equipamento cliente de ponto de acesso indoor; e equipamento com potência muito baixa.

Para pontos de acesso indoor (de baixa potência)/pontos de acesso subordinado são vedados a alimentação por baterias, a proteção contra intempéries e o uso de antenas não integradas às suas estruturas. Essas restrições buscam assegurar o uso dos equipamentos apenas dentro de edificações, de modo a evitar interferências com serviços em caráter primário.

Ainda de acordo com a proposta aprovada, os equipamentos com potência muito baixa não são restritos ao uso indoor, devido à baixíssima potência estabelecida nos requisitos técnicos. Nos limites propostos, esses equipamentos podem conviver com outros serviços da faixa de 6 GHz, sendo permitida a alimentação por baterias.

Melhor experiência, redução de custos. Com a decisão da Agência, será possível habilitar a operação do Wi-Fi 6E em todo seu potencial: os usuários poderão ter a melhor experiência de conectividade, tanto em dispositivos indoor quanto em equipamentos de muito baixa potência. Além disso, ao alinhar os requisitos técnicos à prática internacional, é possível minimizar os custos de entrada dos produtos no mercado nacional, ao evitar customização específica para o País (avaliação da conformidade técnica).

Estudos internacionais indicam que, no caso brasileiro, o valor econômico associado à destinação de 1.200 MHz na faixa de 6 GHz acumulado entre 2021 e 2030 – quando equipamentos, soluções e serviços baseados na tecnologia WiFi 6E poderão estar disponíveis no mercado nacional – será de US$ 112,14 bilhões em contribuição para o PIB; de US$ 30,03 bilhões em excedente do produtor para as empresas brasileiras; e de US$ 21,19 bilhões em excedente do consumidor à população brasileira.

A decisão da Anatel contribui para acelerar o processo de transformação digital, criando condições favoráveis ao desenvolvimento social e econômico do Brasil. A proposta aprovada pelo Conselho Diretor esteve em consulta pública durante 45 dias e contou com amplo debate técnico no Comitê de Uso do Espectro e de Órbita e com a sociedade. Trata-se de importante decisão regulatória na Gestão de Espectro, que coloca a Agência na vanguarda da disponibilização de espectro para redes que utilizam espectro não licenciado.

Fonte: Agência Nacional de Telecomunicações – ANATEL

https://www.gov.br/anatel/pt-br/assuntos/noticias/anatel-aprova-requisitos-tecnicos-para-wi-fi-6e

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Anatel aprova o edital do leilão de 5G

Maior oferta de espectro da história da Agência ampliará a conectividade, com compromissos de investimento e expansão das redes de telecom.

O Conselho Diretor da Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel) aprovou, em reunião realizada nesta quinta-feira (25/2), o edital do leilão de 5G. Maior oferta de espectro da história da Anatel, a licitação das radiofrequências nas faixas de 700 MHz, 2,3 GHz, 3,5 GHz e 26 GHz proporciona maior volume de recursos de espectro para que as prestadoras possam expandir suas redes.

A proposta aprovada estabelece compromissos nacionais e regionais de investimentos de cobertura e backhaul que obrigam as empresas vencedoras do leilão a atenderem áreas pouco ou não servidas, como localidades e estradas, com tecnologia 4G ou superior. Para os municípios com mais de 30 mil habitantes, estão previstos compromissos de atendimento já com tecnologia 5G.

Além disso, o edital também contempla recursos para a implementação de redes de transporte em fibra óptica na Região Norte (Programa Amazônia Integrada e Sustentável – PAIS) e a construção da Rede Privativa de Comunicação da Administração Pública Federal, fundamental para sustentação dos serviços de Estado conforme o Decreto nº 9.612, de 17 de dezembro de 2018. Esses compromissos estão alinhados com as priorizações definidas na Portaria nº 1.924/SEI-MCOM, de 29 de janeiro de 2021, do Ministério das Comunicações (MCOM).

A deliberação agrega as propostas: de edital de licitação para autorização de uso de radiofrequências nas faixas de 700 MHz, 2,3 GHz, 3,5 GHz e 26 GHz; de alteração da Resolução nº 711/2019 e do Regulamento sobre Condições de Uso da Faixa de Radiofrequências de 3,5 GHz a ela anexo; de aprovação do Regulamento sobre Condições de Uso da Faixa de Radiofrequências de 24,25 GHz a 27,50 GHz; e de alteração do Plano Geral de Autorizações do Serviço Móvel Pessoal (PGA-SMP), aprovado pela Resolução nº 321/2002.

Para o conselheiro Carlos Baigorri, relator da proposta, “o certame em questão é fundamental para entregar à sociedade brasileira serviços móveis de última geração, viabilizando uma banda larga móvel mais rápida e de melhor qualidade”. Em sua análise, Baigorri cita dados de The Impact of 5G, relatório do Fórum Econômico Mundial que estima a contribuição do 5G para a economia global em um total de US$ 12,3 trilhões de produção econômica até 2035, contribuindo para o PIB global real no nível de uma economia do tamanho da Índia. Desse valor da produção econômica, a contribuição dos setores de manufatura, transporte, construção, serviços públicos e mineração por si só pode produzir mais de US$ 5 trilhões em bens e serviços.

Na reunião, foram apresentados votos pelo presidente da Anatel, Leonardo de Morais, e pelo conselheiro Moisés Moreira. Em seu voto, o presidente da Agência destacou que em um processo como este “é imprescindível, portanto, que se considere concreta e conjuntamente tanto o arranjo competitivo estabelecido no mercado quanto as opções disponíveis para a transição tecnológica, de modo que ela possa ser mais suave, completa e inclusiva. Tal transição deve estar bem alinhada às diferentes necessidades e realidades das prestadoras e dos usuários e perfeitamente aderente às políticas públicas estabelecidas. Dessa forma, entrega-se à sociedade os máximos benefícios socioeconômicos da exploração desse bem público de uso limitado tão essencial às telecomunicações, o espectro radioelétrico”.

O conselheiro Moisés Moreira ponderou que o 5G traz avanços em relação ao 4G no quesito de banda larga móvel, permitindo o aumento de 20 vezes na taxa de pico, chegando a uma taxa de transmissão de dados de até 20 megabits, e de 10 vezes na taxa de dados experimentada pelos usuários, chegando a 100 megabits. “Quando digo que o 5G tem potencial de revolucionar nossas vidas, refiro-me ao fato de que o 5G considera, em sua concepção, três cenários distintos de uso: a banda larga móvel evoluída, a comunicação máquina a máquina e a comunicação ultra confiável de baixíssima latência – esses dois últimos cenários, que possuem o condão em especial de alavancar os novos modelos de negócios, incluindo-se a indústria 4.0, a telemedicina, o carro autônomo, as cidades inteligentes, a agricultura inteligente, entre outros”, afirmou.

O edital foi objeto da Consulta Pública nº 9, de 14 de fevereiro de 2020, que recebeu 262 contribuições da sociedade em seus 60 dias de duração. Com a deliberação do Conselho Diretor, os estudos de viabilidade e cálculo do preço mínimo, após conclusão pela área técnica da Agência, deverão ser encaminhados para o Tribunal de Contas da União (TCU). A Anatel mantém sua expectativa de realização do certame ainda neste primeiro semestre de 2021.

Tecnologia de quinta geração. O 5G é o mais recente padrão tecnológico para serviços móveis e a Anatel trabalha para promover sua implementação no País de forma segura e sustentável. Devido às suas características, que incluem altas taxas de transmissão de dados e baixa latência, a tecnologia oferece ampla gama de possibilidades, ainda a serem exploradas.

No decorrer de sua implantação, deverão ser desenvolvidas aplicações inovadoras que aproveitem o potencial tecnológico do 5G para introduzir serviços que ampliem a eficiência dos mais diversos setores da economia e beneficiem a sociedade.

Diferentemente das mudanças nas gerações passadas (2G, 3G e 4G), o foco desta tecnologia não está somente no incremento de taxas de transmissão, mas também na especificação de serviços que permitam o atendimento a diferentes aplicações. 

O 5G vai concretizar conceitos como os de Internet das Coisas (IoT) e aprendizagem de máquina em tempo real, promovendo uma verdadeira transformação na forma como as pessoas e organizações se relacionam.

Entre os avanços esperados para o 5G estão:

  • Aumento das taxas de transmissão > maior velocidade
  • Baixa latência > tempo mínimo entre o estímulo e a resposta da rede de telecom
  • Maior densidade de conexões > quantidade de dispositivos conectados em uma determinada área
  • Maior eficiência espectral > quantidade de dados transmitidos por faixa de espectro eletromagnético
  • Maior eficiência energética dos equipamentos > economia e sustentabilidade

A tecnologia 5G é flexível e se adapta de acordo com a aplicação utilizada. Uma das funcionalidades previstas para a quinta geração é o network slicing ou “fatiamento da rede” – no qual as características da rede poderão ser adaptadas de acordo com a necessidade. Por exemplo: vídeos de alta resolução (como 4K) podem demandar larguras de banda extremamente altas, enquanto aplicações como carros autônomos ou cirurgias assistidas demandarão latências extremamente baixas.

A tecnologia 5G promete massificar e diversificar a Internet das Coisas em setores como segurança pública, telemedicina, educação a distância, cidades inteligentes, automação industrial e agrícola – entre tantos outros.

A exemplo do que ocorreu com o 4G, que introduziu diferentes modelos de negócios e oportunizou a chamada “era dos aplicativos”, os avanços que virão com o 5G devem ocorrer com o tempo, à medida que a indústria encontrar soluções para atender às suas necessidades e às demandas das pessoas e dos negócios.

Ao mesmo tempo em que se implanta a quinta geração, as redes 4G manterão por muito tempo papel fundamental para o acesso à banda larga móvel no Brasil. São redes com alta capacidade, que podem operar com larguras de faixa menores e áreas de cobertura maiores do que aquelas usualmente previstas para redes 5G. 

Licitação. O quadro a seguir sintetiza a proposta aprovada com a ordem de abertura das propostas de preço:

Faixa de 700

1ª rodada
Bloco de 10 + 10 nacionalCompromissos: localidades sem 4G e estradas
2ª rodada
2 blocos de 5 + 5 regionaisCompromissos: localidades sem 4G e estradas
Spectrum cap: aquele estabelecido no artigo 1º, inciso I, da Resolução nº 703, de 1º de novembro de 2018, não se admitindo a participação de Proponente, suas controladas, controladoras ou coligadas que, na mesma área geográfica, já detenham autorização de uso de radiofrequências em caráter primário na faixa de 698 MHz a 806 MHz.
Prazo da autorização: disciplinados pelo Anexo à Resolução nº 625, de 11 de novembro de 2013, pelo prazo de 20 (vinte) anos, prorrogável a título oneroso, na forma da regulamentação vigente à época do vencimento, sendo a primeira prorrogação até 8 de dezembro de 2044.    

Faixa de 3,5 GHz

1ª rodada 
4 Blocos Nacionais de 80 MHz8 Blocos Regionais de 80 MHzCompromissos Instalação de rede de transporte (backhaul) em municípios indicados no ANEXO XV instalar ERB que permitam a oferta do SMP por meio de padrão tecnológico igual ou superior ao 5G NR release 16 do 3GPP, na proporção mínima de uma estação para cada 10 (dez) mil habitantes.Ressarcir as soluções para os problemas de interferência prejudicial na recepção do sinal de televisão aberta e gratuita, transmitidos na Banda C, à população efetivamente afetada, nos termos da Portaria nº 1.924/SEI-MCOM, de 29 de janeiro de 2021, do Ministério das Comunicações (MCOM) 
2ª rodada (caso de algum bloco da 1 Rodada ficar deserto)
Blocos de 20 MHz
Spectrum cap: 100 MHz para o conjunto compreendendo os Lotes da faixa de 3,5 GHz.Limitação de arrematação de mais de dois blocos regionais.
Prazo da autorização: 20 (anos) anos

Faixa de 2,3 GHz

1ª rodada
Bloco de 50 MHz e de bloco de 40 MHz regionaisCompromissos: cobrir com 95%  da área urbana dos municípios  sem 4G
Spectrum cap: 50 MHz para o conjunto compreendendo os Lotes da faixa de 2,3 GHz, respeitado o estabelecido no artigo 1º, inciso II, da Resolução nº 703, de 1º de novembro de 2018.
Prazo da autorização: 20 (anos) anos

Faixa de 26 GHz

1ª rodada                                                                                                                                                                                                                                                                         
5 blocos nacionais e 3 blocos regionais de 400 MHzSem compromissos
2ª rodada
Até 10 blocos nacionais e 6 regionais de 200 MHz que não forem vendidos na rodada anteriorSem compromissos
Spectrum cap: 1 GHz para o conjunto compreendendo os Lotes da faixa de 26 GHz.
Prazo da autorização: 20 (anos) anos


Convivências tecnológicas
. A proposta considerou que a opção pela migração das transmissões de sinais de TV aberta por satélite (TVRO, as antenas parabólicas) para a Banda Ku, melhor atende aos objetivos da política pública objetivada com o certame. Para viabilizar a convivência entre TVRO e sistemas terrestres, a solução da migração dependerá da troca integral de equipamentos de recepção pelos atuais usuários.

O prazo para distribuição, aos usuários, dos kits de recepção da Banda Ku será de 18 meses. Assim, haverá transmissões simultâneas dos canais escolhidos na Banda C e no satélite selecionado, durante esse prazo – que pode ser prorrogado mediante decisão do GAISPI, por prazo não superior a 31 de dezembro de 2025.

O GAISPI é o Grupo de Acompanhamento da Implantação das Soluções para os Problemas de Interferência na faixa de 3.626 a 3.700 MHz (GAISPI) e será formado por representantes das proponentes vencedoras nos lotes regionais de 3,5 GHz e das exploradoras de direito de exploração de satélite. Entre as atribuições do GAISPI está incluída a possibilidade de antecipação do uso da subfaixa de radiofrequência de 3.300 MHz a 3.700 MHz.

Quanto à compatibilização com sistemas de satélite, nos custos de ressarcimento serão considerados (i) a execução das atividades de desocupação da faixa e remanejamento de sinais para Banda C tradicional (3.700 MHz a 4.200 MHz) ou outras faixas; e, (ii) custos de instalação de filtros de radiofrequências para mitigação de interferências em estações receptoras profissionais.

Ainda no ressarcimento, servirá de baliza para definição do valor, as estações cadastradas no banco de dados da Anatel e a lógica a ser adotada leva em conta a necessidade de realocação as estações de ativas no momento, não se considerando que há qualquer tipo de direito adquirido pelo uso da faixa até o final do prazo da outorga.

Por isso, fazem jus ao recebimento, as exploradoras de direito de satélite nacional e estrangeiro, as quais comprovem: que suas estações operam na faixa de 3.625 MHz a 3.700 MHz, no Brasil; e a existência (e o quantitativo) de estações receptoras cadastradas na base de dados da Anatel.

Serão cobertos: (i) custos de desocupação da faixa e remanejamento de sinais para a banda C; (ii) custos com dupla iluminação; (iii) custos de instalação de filtros.

Fonte: Agência Nacional de Telecomunicações – ANATEL

https://www.gov.br/anatel/pt-br/assuntos/noticias/anatel-aprova-o-edital-do-leilao-de-5g

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Serviços de radiocomunicações para defesa, segurança pública e exército: a questão da realocação de frequências deste setores ser definida pela Anatel

Ericson Scorsim. Advogado e Consultor no Direito Regulatório das Comunicações. Doutor em Direito pela USP. Autor da Coleção de Livros sobre Direito da Comunicação, publicados na Amazon.

A Anatel está revisando o plano de atribuição, ocupação de distribuição de frequências. O edital do 5G está demandando a atualização do plano de frequências. Por isso há mudanças que podem ter impacto intersetorial. Serviços de radiocomunicações são essenciais aos setores de defesa civil, defesa nacional/militar e segurança pública (polícias militares e polícia federal).

Estes serviços usualmente demandam a utilização do espectro de radiofrequências, tema sob a competência da Anatel. Órgãos de defesa e segurança pública manifestaram-se perante a Anatel a respeito da redução da faixa de frequências de 4910-4990 MHz e 800 MHz.  Há aplicações de geolocalização por estações rádio-base (sistema de rádio troncalizado) e consciência situacional de teatros de batalha, com funções de comando e controle, operados pelo Exército.

Segundo a manifestação dos referidos órgãos públicos, a revogação pela Anatel da Resolução 625, de 2012 e Resolução n. 633/2014  implica na diminuição das faixas de frequências para a defesa civil, defesa nacional e segurança pública. Por outro lado, registre-se que o potencial de realização de parcerias público-privadas no segmento de radiocomunicação, tema objeto do Decreto n. 10.101/2019. Evidentemente mais canais de frequências e maior banda da faixa de frequências melhor para o setor que depende das radiocomunicações.

Também, quanto maior for “distância” de uma faixa de frequências em relação a outra é maior a segurança contra interferências prejudiciais aos serviços de radiocomunicações.

Enfim, há oportunidades  para empresas que atuam segmento de fornecimento de tecnologia de radiocomunicação para os setores de defesa civil, defesa nacional/militar e segurança pública, diante da demanda por atualização da tecnologia de radiocomunicação do exército, policias militares e polícia federal.  

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