Ônibus do transporte coletivo de passageiros geram ruídos e poluição ambiental nas cidades. Por isto, há a degradação da qualidade ambiental e a qualidade de vida. Estes ruídos e poluição sonora causam danos à saúde pública, a saúde ambiental e a saúde mental da população. Também, ruídos causam danos ambientais morais, devido à deterioração da qualidade ambiental, qualidade de vida, qualidade da saúde, qualidade do bem estar. O transporte coletivo de passageiros é um serviço público essencial. É da responsabilidade dos municípios organizar a prestar estes serviços de transporte coletivo de passageiros, diretamente ou indiretamente por empresas privadas. O poder público é o responsável por exigir o cumprimento de normas administrativas, normas sanitárias e normas ambientais na execução do serviço público de transporte coletivo.
A propósito, dispõe, em seu art. 37, §7º, a Constituição: “as pessoas jurídicas de direito público e de direito privado prestadores de serviços públicos responderão pelos danos que seus agentes, causarem a terceiros, assegurado o direito de regresso contra o responsável nos casos de dolo ou omissão”. Logo, o poder público também responsável por danos ambientais causados por empresas de ônibus de transporte coletivo de passageiros. O problema é que o sistema de transporte coletivo, com motores à combustão que utilizam fosseis, causa danos ambientais à vizinhança das vias públicas por aonde circulam. Os denominados B.R.T, Bus Rapid Transport, causam danos ambientais durante o período diurno e noturno. Ver: Zannin, Paulo Henrique e outros. Assessment of noise pollution along two main avenues in Curitiba, Brazil, Open Journal of Acoustics, 2019, 9, 26-38. Ver, também, Transport Noise. How it affects our health and wellbeing, Institute of Acoustics, 2022.[1] Ver, também: The health effects of environmental noise, European Union. Ver, também: Nigh Noise Guidelines for Europe, Word Heath Organizations Europe.
Há ainda danos à valor econômico dos imóveis localizados nas proximidades das vias públicas do transporte coletivo. E para agravar os danos ambientais são ampliados nas proximidades dos terminais de ônibus. Há, portanto, danos ambientais ao valor das áreas residenciais. A Lei da Política Nacional do Meio Ambiente define poluição: “degradação da qualidade ambiental resultante de atividades que direta ou indiretamente: a) prejudique a saúde, a segurança, e bem estar da população; b) criem condições adversas às atividades sociais e econômicas: c) afetem desfavoravelmente a biota; d) afetem as condições estéticas ou sanitárias do meio ambiente; e) lancem matéria ou energia em desacordo com os padrões ambientais estabelecidos”. Um dos princípios da política nacional do meio ambiente é a qualidade ambiental.
Aqui, abordaremos a perda da qualidade ambiental causada por ruídos e poluição ambiental sonora nas cidades. Ruídos causam a perda da qualidade do ambiente urbano, a perda da qualidade ambiental residencial, a perda da qualidade do ambiente de trabalho, a perda da qualidade ambiental. Por isto, é essencial a valoração econômica da perda de qualidade ambiental. Por analogia, reflitamos sobre a contaminação do solo por agentes tóxicos. Também, pensemos na contaminação do ar por agentes tóxicos, como gases emitidos por carros, motocicletas, ônibus e caminhões. Uma área verde agrega valor à propriedade imobiliária. Pensemos então no ar contaminado por ruídos. O ambiente poluído evidentemente não é limpo, saudável e sustentável. O ambiente degradado é radicalmente diferente do ambiente com qualidade, com saúde ambiental. Por isto, o ambiente natural e o ambiente humano com quietude tem um determinado valor econômico. Diferentemente, o ambiente poluído por ruídos tem um valor menor de mercado. Por isto, é fundamental a percepção do valor ambiental da quietude urbano. Estudos econômicos apontam para a desvalorização de imóveis em ambientes poluídos por ruídos, até a vizinhança barulhenta é um fator de depreciação dos imóveis.
Há metodologias para a valoração econômica do dano ambiental. Sobre o tema: Trujillo, Eulalia Maria Moreno. La protecccion jurídico-privada del médio ambiente y responsabilidade por su deterioro, tese de doutorado apresentada para o Departamento de Direito civil da Faculdade de Direito de Granada, 1990. Ver, também: Luis Martinez Vasquez de Castro: Danos medioambientales y derecho al silencio. Madrid: Editorial Reus, 2015. E Juan-Luis Monestiver Morales, Defensa jurídico-civil frente al ruído. Prevención, reparación, evaluación, efectos y reduccíon, tese perante Faculdade de Direito de Granda. E Pilar Domingues Martines: El meio ambiente acústico y el derecho a la inviolabilid del domicilio, Revista Derecho Privado y Constitución, n. 28, enero-diziember, 2014, p. 401-446. Ver, também: Elisabete M. M. Arsenio e sua obra The valuation of enviromental externalities: a states preference case study on traffic noise in Lisbon, tese apresentada perante a Universidade de Leeds e Instituto de Estudos de Transporte em 2002. A autora descreve o valor ambiental da quietude urbana e os danos ambientais causados pela poluição sonora do trânsito na cidade de Lisboa. Ela descreve os danos causados ao ambiente residencial pela poluição sonora do transporte. A autora aponta os fatores de mensuração do dano ambiental: área do ambiente residencial impactado pela poluição sonora (área de trabalho, áreas de descanso, áreas de repouso, áreas de lazer, áreas de estudo, entre outras), o tempo de permanência dos residentes no ambiente local, o número de pessoas que residem no imóvel, a proximidade da área atingida pela poluição sonora diante da rua, o nível de educação dos residentes do imóvel, o tipo de rua por aonde ocorre o trânsito, a habitualidade do trabalho ou de estudo na residência, a abertura das janelas durante verão e outono, número de anos dos residentes morando no imóvel, entre outros critérios. Assim, conclui a autora que a degradação ambiental causada pela poluição sonora do trânsito é fator de desvalorização do imóvel.
Quanto o entorno ambiental do imóvel é atingido pela poluição sonora há a desvalorização do imóvel, pois impacta o seu valor de uso e valor de não-uso. A autora sugere a compensação pelo dano ambiental à população exposta à poluição sonora. Um dos critérios da metodologia de valoração é o método hedônico, incluindo-se o valor de uso de valor de não uso do imóvel. Na avaliação é considerado o impacto no ambiente indoor e ambiente outdoor do imóvel. A poluição sonora é considerada como uma externalidade negativa ao sistema de trânsito e de transporte. Chia-Jena Yu, em sua obra Environmentally sustainable acoustics in urban residential áreas, tese perante a Faculdade de Arquitetura de Sheffield, destaca o impacto do trânsito sobre áreas residenciais, diferenciando-se a poluição ambiental sonora de veículos leves, médios e pesados. A autora defende a integração da sustentabilidade urbana acústica com à política urbana e política residencial. Também, Georgios Kamtzirids e outros: Does noise affect housing prices? A case study in the urban area of theassaloniki, disponível na internet.
Ora, também devemos analisar o tema da poluição ambiental sonora e o impacto sobre a saúde pública, saúde ambiental e saúde mental da população. Pessoas em tratamento de saúde são intensamente impactadas pela poluição sonora do trânsito e dos sistemas de transporte. Pessoas hipertensas e cardíacas são afetadas em sua saúde por causa dos ruídos. Sobre o tema, ver: Biological mechanisms related to cardiovascular and metaboloic effects by enviromental noise by Charlotta Ericksson e outros, World Health Organization. Ver, também: Burden of disease from environmental noise. Quantification of healthy life year lost in Europe, World Health Organization. Consultar: Noise, blazes and mismatches. Emerging issues of environmental concern, UN environment programme, Frontiers, 2022 Ver, também: Healthy environment, healthy lives: how the enviroment influences health and well-being in Europe, European Environmental Agency, EEA Report, 2019. Ver, também, Alletta, Francesco e Kang, Jian. Promoting healthy and supportive acoustic environments. Going beyond the quietness. International Journal of Environment Research and Public Health, MDPI. Ver também European Agency Enviroment, tópico Noise. E Swinburn, Tracy e outros. Valuing quiet: an economic assessment of US environmental noise as a cardiovascular health hazard, American Journal Preventive Medicine. Para além da Saúde Ambiental, é importante avaliar o impacto da poluição sonora do trânsito, transporte, vizinhança sobre o valor econômico do imóvel impactado. Sobre este tema, ver: Daniels Rhonda, Monetary valuation of the environmental impacts of transport, Institute of Transport Studies, the University of Sydnei. Ver, também, S. Navrud. The economic value of noise within the European Union – a review and analysis of studies, paper Acústica 2004. Também, temos o conceito de dano Ambiental moral. Segundo José Rubens Morato Leite e Patryck de Araúo Ayla, em sua obra Dano Ambiental: “dano extrapatrimonial ou moral ambiental, quer dizer, tudo que diz respeito à sensação de dor experimentada ou conceito equivalente em seu mais amplo significado ou todo prejuízo não patrimonial ocasionado à sociedade ou ao individuo, em virtude de lesão ao do meio ambiente”.[2] No Brasil, a Constituição garante o direito de todos ao meio ambiente ecologicamente equilibrado como bem de uso comum do povo, essencial à qualidade de vida. E mais, há o dever do poder público e da coletividade de defender e preservar o meio ambiente para a geração presente e as futuras. Para efetivar o direito ao meio ambiente é da competência do poder público: “controlar a produção, a comercialização e o emprego de técnicas, métodos e substâncias que comportem risco para a vida, a qualidade de vida e o meio ambiente”, art. 225, inc. V. Sobre os princípios gerais da atividade econômica, a Constituição dispõe sobre a “defesa do meio ambiente, inclusive mediante tratamento diferenciado conforme o impacto ambiental dos produtos e serviços e seus processos de elaboração”, art. 170, inc. VI. A Constituição dispõe sobre a competência comum da União Estados, Distrito Federal e municípios para “proteger o meio ambiente e combater a poluição em qualquer de suas formas”, art. 23, inc. VI.
Por fim, a Constituição dispõe que compete a União, aos Estados e ao Distrito Federal legislar concorrentemente sobre: “responsabilidade por dano ao meio ambiente, ao consumidor, a bens e direitos de valor artístico, estético, histórico, turístico e paisagístico”, art. 24, inc. VIII. A partir de todas estas normas constitucionais é possível compreender pela configuração do direito à paisagem sonora do meio ambiente urbano, livre de ruídos mecânicos. Máquinas, ferramentas, equipamentos e veículos devem ser declarados espécies invasoras do meio ambiente. Há o dever do poder público de realizar a limpeza ambiental acústica, libertando a população da incomodidade causada pelos ruídos mecânicos. Estas máquinas poluidoras sonoras causam a perturbação do equilíbrio ecossistêmico humano e animal. Ademais, estes equipamentos e veículos poluidores causam sérios danos à saúde pública e saúde ambiental. Por isto, é da responsabilidade do poder público adotar medidas para restaurar a qualidade ambiental urbana, a qualidade ambiental residencial, a qualidade ambiental, qualidade ambiental do ambiente de trabalho, entre outros lugares atingidos pela poluição sonora. Para termos cidades inteligentes, saudáveis e sustentáveis precisamos lutar contra a epidemia de ruídos mecânico e poluição sonora de equipamentos, máquinas, ferramentas e veículos barulhentos.
O Papa Francisco em sua Carta Encíclica Laudato Si sobre o cuidado da casa comum: “O meio ambiente é um bem coletivo, patrimônio de toda a humanidade e responsabilidade de todos”. Em síntese, é urgente a contenção dos danos ambientais causados por ônibus do transporte coletivo das cidades. É o poder público municipal é o responsável por fiscalizar e sancionar as empresas poluidoras sonoras. Para saber mais sobre o Movimento Antirruídos, acesse: https://antirruidos.wordpress.com/ e https://twitter.com/antirruidos .
Ericson Scorsim. Advogado e Consultor no Direito Público. Doutor em Direito pela USP. Fundador da Associação Civil Monitor Ambiental Antirruídos. Autor dos ebooks: Movimento antirruídos para cidades inteligentes, saudáveis e sustentáveis e Condomínios inteligentes, saudáveis e sustentáveis, publicados pela Amazon.
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[1] Ver: ww.ioa.org.uk.
[2] Ver: Dano ambiental, 8ª edição, revista atualizada e reformulada. Rio de Janeiro: Forense, 2020, p. 75.