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Audiência pública sobre impactos do ruído na saúde, realizada pelo Ministério Público de São Paulo

O Ministério Público de São Paulo realizou em 22.06.2022, audiência pública sobre os impactos do ruído na saúde e conforto da população, evento liderado pelo Promotor de Justiça Ambiental, Dr. Jorge Alberto Mamede Masseran.

A iniciativa foi realizada em parceria com o Instituto de Pesquisas Tecnológicas (IPT) de São Paulo. O vídeo da audiência pública está disponível no canal do MP/SP no youtube.[1] Foram ouvidos líderes de associações de moradores, os quais relataram seus problemas de saúde e desconforto causados pelos ruídos urbanos.  Cidadãos relataram o agravamento de seu estado de saúde devido aos ruídos urbanos. Foram narrados os relatos de cidadãos com autismo, os quais possuem hipersensibilidade acústica e mais sentem os impactos dos ruídos.

Outro caso relatado foi de uma família com um bebê que recebeu transplante de órgão e o impacto dos ruídos sobre o estado emocional e físico da família. Outra cidadã com a mãe e irmão em tratamento de saúde tiveram seu quadro de saúde agravado devido aos ruídos de estabelecimentos comerciais. Moradores próximos uma arena esportivas e de eventos apresentam o seu extremo desconforto e impacto em sua saúde devido os ruídos de eventos esportivos e shows realizados no estádio. Um músico narrou os impactos de sons graves de “pancadões”, o quais impactam seu diafragma, o que lhe dificulta a respiração. Outro morador apontou o impacto dos ruídos de motocicletas e falta de fiscalização municipal sobre estes poluidores acústicos. Narrou, inclusive que há vídeos na internet mostrando como adulterar escapamentos de motocicletas para aumentar o nível de ruídos, algo totalmente ilegal para cometer infração de trânsito e ambiental.  Houve relatos do impacto de ruídos nas relações de vizinhança em condomínios e o risco de potencial violência e os danos à saúde. Outro cidadão destacou os problemas de modelos de negócios descomprometidos com a questão da sustentabilidade ambiental acústica. Há alguns modelos que, inclusive, inserem negócios os custos das infrações ambientais.

Cidadãos alertaram ainda para falhas no sistema de atendimento ao cidadão nos casos de poluição sonora (programa Psiu), a falta de equipes de fiscalização, falta de equipamentos e o horário inadequado da fiscalização. Também, médicos especialistas foram ouvidos. Os médicos mostraram o impacto dos ruídos na saúde física e mental dos cidadãos. Representante do Instituto de Pesquisa Tecnológico mostrou os procedimentos para a medição dos ruídos e a necessidade de equipamentos confiáveis para a realização desta medição. Destacou que equipamentos de qualidade são caros. Os sonômetros populares não têm a mesma qualidade técnica dos equipamentos de alta precisão. Outro representante do IPT apontou para a Lei n. 16.499/2016, o qual demanda a realização de mapa de ruído da cidade de São Paulo, com prazo final até 2023. Com isto será possível resgatar a paisagem sonora natural da cidade, com menos ruído. Um das referências para o controle da poluição acústica é modelo de controle da poluição visual adotado pela cidade de São Paulo. Representante da CETESB destacou os investimentos realizados em equipamentos de monitoramento ambiental acústico. Foi destacado o impacto dos ruídos do trânsito sobre a qualidade de vida na cidade. Também, houve relatos dos problemas das Dark kitchens (cozinhas adaptadas) e os ruídos causados por motociclistas que transportam a comida. Este tema também é objeto de audiência pública na Câmara de Vereadores. Promotores de Justiça destacaram a questão da poluição sonora e os estabelecimentos comerciais, o aspecto jurídico.

Outro tema foi da poluição e incomodidade sonora de obras da construção civil. Um dos relatos foi a negativa da Prefeitura de São Paulo em fiscalizar a poluição sonora de obras de construção civil. O Ministério Público abriu inquérito civil para obrigar a Prefeitura a realizar a fiscalizar da poluição sonora em obras de construção civil. A prefeitura recusou-se a fiscalizar, informando ao Ministério Público que não era de sua competência a fiscalização da poluição sonora dos ruídos da construção civil. Então, o Ministério Público ingressou com ação civil pública para obrigar a realização da fiscalização da poluição sonora. Após este fato, a Prefeito editou o Decreto sobre os limites de decibéis em obras de construção civil. Ocorre que o limite máximo do Decreto, ao invés de diminuir o nível do ruído, legitima um padrão elevado de ruído em obras de construção civil, um valor bem acima dos padrões acústicos recomendados pelas normas da ABTN. Portanto, o Decreto, ao invés de proteger os direitos fundamentais à qualidade de vida, saúde, descanso e meio ambiente, proteger os interesses da indústria da construção civil. Outro ponto destacado foram as fraudes para obter alvarás eletrônicos para estabelecimentos comerciais poluidores sonoros. Representante do Ministério Público destacou a questão do aspecto da responsabilidade civil, criminal e ambiental em relação aos poluidores sonoros, bem como a necessidade de um marco regulatório de incentivos às inovações tecnológicas antirruídos.  Também, a expectativa normativa é  do estado de não ruído, segundo destacou o representante do Ministério Público.

Resumindo-se: a audiência pública assegurou o direito à participação popular na efetivação de uma política ambiental de contenção dos ruídos urbanos. Apontou, também, as graves falhas do poder executivo e poder legislativo na efetivação de uma política ambiental de controle da poluição sonora. Demonstrou as graves falhas de falta de capacidade institucional do poder público para enfrentar o tema o impacto dos ruídos na saúde pública e conforto na cidade de São Paulo. E, igualmente, mostrou a irresponsabilidade dos poluidores sonoros para com a cidade de São Paulo e os cidadãos e o sistema de impunidade destes poluidores. O tema dos ruídos demanda inovações democráticas, sociais e tecnológicas, educacionais e culturais para a mudança dos comportamentos antissociais para comportamentos eticamente e legalmente responsáveis. No meu livro Propostas Regulatórias: Anti-Ruídos Urbanos, edição autoral, Amazon, 2022, abordo esta problemática do impacto dos ruídos nas cidades as medidas regulatórias para a contenção dos ruídos, com a busca de melhores práticas de sustentabilidade ambiental acústica.

** Todos os direitos reservados, não podendo ser reproduzido ou usado sem citar a fonte.

Ericson Scorsim. Advogado e Consultor no Direito Público. Doutor em Direito pela USP. Autor do livro Propostas Regulatórias: Anti-Ruídos Urbanos, Amazon, 2022.

[1] Ver: Audiência pública: impactos do ruído na saúde e conforto da população, 22.06/2022, https://www.youtube.com/watch?v=5bO4T9_LH_4

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Livro: Geopolítica das Comunicações

Divulgo para você a 2ª edição, revista e atualizada do meu livro: “Geopolítica das Comunicações“.

Disponível: https://www.amazon.com.br/

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Mobilidade urbana com veículos elétricos. Infraestruturas urbanas sustentáveis e saudáveis. Direito dos cidadãos à rua limpa (ecossistema limpo), com quietude urbana

As ruas são integrantes das infraestruturas das cidades.  É comum nas cidades serviços de limpeza das ruas. Porém, e quanto à sujeira das ruas causadas pelos ruídos? Ruídos também sujam as ruas. Não há nenhuma medida adotada pelas prefeituras para a “limpeza” da paisagem sonora da cidade.  Residências próximas às ruas sentem o impacto dos ruídos de veículos. Há a interação entre o sistema de habitação (o lugar, o habitat humano e o meio ambiente humano) e o sistema de mobilidade urbana.

O sistema de mobilidade urbana causa danos colaterais para o sistema de habitação, como os efeitos colaterais da poluição atmosférica e poluição sonora. Para agravar temos o caso de bairros atravessados por vias de expressa de ônibus de grande porte (apelidos de ligeirinhos), como é o caso de Curitiba. Estas vias expressas de transporte coletivo impactam com ruídos os edifícios de apartamentos residenciais. Há danos colaterais do sistema de transporte coletivo, por via expressa, em áreas predominantemente residenciais.  Por isto, precisamos da mudança na percepção a respeito dos ruídos. E da interseção entre casa, rua, bairro e o impacto dos ruídos das máquinas sobre a vida humana. Precisamos superar a subcultura de mal estar nas cidades causada pela poluição sonora dos veículos à combustão. As ruas sem ruídos e com quietude urbana são um direito dos cidadãos.

O direito à sustentalidade ambiental nas cidades. O bem estar urbano é tema uma multidimensional, há aspectos físicos, psicológicos, fisiológicos e imateriais.   A legislação proíbe a poluição sonora nas cidades. Ruídos afetam a saúde pública, o bem estar público e o meio ambiente. Ruídos são o sintoma de subdesenvolvimento urbano. Ruídos de máquinas em tecnologias mecânicas ineficientes são o sintoma patológico e tóxico nas cidades.  O que temos é uma inversão patológica da hierarquia das máquinas sobre o sistema de vida humano, em prejuízo à saúde pública e bem estar público. Ruídos causam a degradação ambiental das cidades ano a no com o aumento da frota de veículos. 

Ruídos aumentam a carga de estímulos sensoriais sonoros nas cidades, aumentando-se a pressão sonora, como se houvesse por analogia o aumento da pressão arterial nas cidades, o que ocasiona diversos perigos. Ruídos causam sensações corporais e mentais péssimas. Ruídos aumentam a sobrecarga de estímulos sensoriais para o organismo humano, em detrimento da saúde. Há o impacto direto dos ruídos no organismo humano. Por isto, a necessidade de proteção às infraestruturas urbanas no aspecto de sua sustentabilidade ambiental e saúde pública. No âmbito das Nações Unidas, há diversos programas de desenvolvimento sustentável para a saúde, bem estar, inovações tecnológicas, proteção ambiental, entre outros objetivos.

Os objetivos de desenvolvimento sustentável da ONU, mais o aquecimento global e as mudanças climáticas, demandam ações urgentes nas cidades para a mudança da mobilidade urbana, substituindo-se veículos à combustão por veículos elétricos.  Por isto, para termos cidades sustentáveis, saudáveis e resilientes precisamos de programas para a contenção de ruídos urbanos. Uma boa opção regulatória são leis de incentivos à inovação tecnológica para a mobilidade por veículos elétricos. Carros, motocicletas e ônibus elétricos não causam poluição atmosférica, nem poluição acústica. Diferentemente, veículos à combustão (automóveis, motocicletas e ônibus) são fontes de degradação ambiental urbana. Veículos à combustão causam a degradação da qualidade de vida nas cidades, na medida em que são fontes de ruídos e produção de emissão de gases poluentes.

Há evidências da superioridade da tecnologia elétrica em veículos, comparando-se com a tecnologia mecânica do motor à combustão. Por isto, as prefeituras em programas de mobilidade urbana devem priorizar a sustentabilidade ambiental, para a eliminação da poluição atmosférica e poluição acústica. Há o dever da administração pública maximizar a eficiência da ação pública de modo a conter a poluição atmosférica e poluição acústica. Veículos elétricos representam a solução de máxima eficiência tecnológica para a eliminação da poluição atmosférica e poluição acústica nas cidades. A título ilustrativo, ônibus elétricos revolucionarão o sistema de transporte coletivo de passageiros, uma modalidade de serviço público que obrigatoriamente deve observar padrões de conforto para usuários e a comunidade.

Outra opção regulatória para as prefeituras é a imposição de restrição ao trânsito de veículos à combustão, em determinados bairros da cidade, para se preservar a qualidade ambiental e evitar a poluição acústica, garantindo-se a quietude urbana de áreas predominantemente residenciais.  

Em Londres, por exemplo, houve a restrição à circulação de veículos em áreas centrais. As prefeituras podem, também, estabelecer medidas de compensação ambiental para concretizar os princípios da precaução, prevenção de danos ambientais e proibição do retrocesso ambiental, princípio do poluidor pagador,  de modo a assegurar  que o poluidor efetivamente pague uma espécie de compensação pelos danos causados ao meio ambiente e aos cidadãos. Outros dois princípios a embasar esta política regulatória são o princípio da eficiência energética e da eficiência acústica. Por isto, as prefeituras poderiam estabelecer um sistema de imposição de taxas de compensação ambiental como mecanismo para dissuadir o comportamento antissocial dos poluidores.  A medida é ainda justificada para a proteção da saúde pública, afinal a poluição atmosférica e a poluição sonora é fator atentatório à saúde humana.  Outra opção regulatória é a adoção de incentivos para medidas de isolamento acústico de janelas de edifícios situados às margens de vias expressas de ônibus do sistema de transporte coletivo de passageiros.

As Prefeituras devem adotar medidas de compensação ambiental e/ou mitigação dos danos ambientais causados pelos ruídos do sistema de transporte coletivo para os cidadãos moradores de edifícios às margens de vias expressas. Outra opção é a realização de compras e serviços sustentáveis pelas prefeituras. Resumindo-se: a tecnologia para a mobilidade elétrica deve ser percebida como uma tecnologia para a saúde pública, bem estar público e promoção da sustentabilidade ambiental. A efetivação de políticas de sustentabilidade ambiental nas cidades depende do compromisso das prefeituras com ações práticas para a mudança do paradigma da mobilidade urbana, alterando-se o atual status quo de poluição atmosférica e acústica, para um cenário de mobilidade baseado na matriz elétrica.

Registre-se que cidades inteligentes, sustentáveis e saudáveis são aquelas que tenham o compromisso com a infraestrutura urbana de incentivos para carros, motocicletas e ônibus elétricos.

** Todos os direitos reservados, não podendo ser reproduzido ou usado sem citar a fonte.

Ericson Scorsim. Advogado e Consultor no Direito Público. Doutor em Direito pela USP. Autor do livro Propostas Regulatórias: Anti-Ruídos Urbanos, Amazon, 2022.

Crédito de Imagem: Ônibus Brasil – Otavio Felipe Balbinot

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Governo norte-americano lança parceria para investimentos em infraestruturas globais

O governo do Presidente Biden lançou as parcerias para infraestrutura e investimentos globais, denominado Partnership for Global Infrastructure and Invesment, com foco em países de renda baixa e média.[1]Anteriormente, o programa era denominado Built Better Back.   

Um dos objetivos é mobilizar o capital de firmas privadas norte-americanas para investir em infraestrutura em outros países, inclusive em redes 5G e 6G, conectividade digital, mudanças climáticas, saúde e segurança à saúde.[2] É um programa de política externa do governo norte-americano para promover a exportação de investimentos de empresas norte-americanas em infraestruturas.  Participará deste programa o Banco EXIM, focado em exportações e importações. O assessor presidencial para assuntos de segurança nacional apresentará relatórios com recomendações para o fortalecimento da competividade dos Estados Unidos no desenvolvimento da infraestrutura internacional e melhorar a coordenação entre as diversas agências internacionais em relação ao tema. É uma iniciativa para se contrapor ao programa da  China Belt Road Iniciative, o qual é integrado pelo Belt Road Digital.  

Estados Unidos e China disputam a liderança internacional e buscam ampliar a influência sobre os mercados mundiais. Por isto, a rivalidade entre programas de investimento em infraestrutura como um mecanismo de ampliação de seu softpower perante os demais países. Dentre as áreas de competição estão as redes de comunicações 5G e 6G. A infraestrutura de conectividade digital é, portanto, alvo da disputa entre Estados Unidos e China e a projeção de sua política externa.

O Brasil se adotar uma política geoestratégica poderá extrair vantagens em negociações internacionais com os dois países, a fim de atrair mais investimentos em infraestruturas de conectividade digital. 

** Todos os direitos reservados, não podendo ser reproduzido ou usado sem citar a fonte.

Ericson Scorsim. Advogado e Consultor no Direito Regulatório das Comunicações. Doutor em Direito pela USP. Autor dos livros Jogo Geopolítico das Comunicações 5G: Estados Unidos, China e o Impacto no Brasil e Geopolítica das Comunicações (2ª ed), edição autoral, Amazon, 2020 e 2022.


  1. Ver: White House. Memorandum on the Partnership for global infrastructure and investment, June 26, 2022.

[2] Ver: White House. Memorandum on the Partnership for global infrastructure and investment, June 26, 2022.

Crédito de Imagem: Oil & Gas 360

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China assume a presidência dos BRICS

Em 2022, a China assumirá a presidência dos BRICS.

Há expectativas quanto às iniciativas chinesas na liderança. Alguns pontos possíveis de desenvolvimento: o aumento de investimentos entre os países dos BRICS, ampliação do comércio entre os países que integram esta aliança internacional. E, ainda, junho de 2022, líderes dos países integrantes dos BRICS anunciaram medidas para o fortalecimento da reforma da governança global. Outro ponto destacado foi a promoção do ambiente das tecnologias de informações e comunicações abertas, seguras, estável, acessível e pacífica, e a intensificação da utilização destas tecnologias para a internet.  Foi ainda salientado o papel das tecnologias de informação e comunicações para o desenvolvimento dos países. Outro ponto é a proteção dos consumidores no comércio digital.

Houve a declaração de  apoio à construção da rede de BRICS think tank para as finanças. Outro tema foi o engajamento do banco dos BRICS, o NDB, na integração de uma plataforma de integração dos projetos de investimento em infraestrutura. Além disto, houve a declaração de apoio à rede de centro de transferência de tecnologias. Outro tema foram as medidas para implementar a agenda de sustentabilidade ambiental. Apontou-se a preocupação com os riscos e dilemas éticos quanto à utilização abusiva da inteligência artificial para os direitos humanos. No campo da cooperação espacial há o programa de sensoriamento remoto da terra por satélite.[1]

Outros temas abordados foram: o fortalecimento da capacidade digital para reduzir a divisão digital, a cooperação internacional para o desenvolvimento de indústrias digitais, fortalecimento da cooperação para serviços digitais, com consumidores inteligentes, fronteira inteligentes e conectividade inteligente, programas de construção de capacidade para aplicações de tecnologias de informação e telecomunicações nos países, apoio à Conferência Global sobre Economia Digital.

Há oportunidades geoestratégicas para o Brasil e empresas brasileiras no âmbito dos BRICS, uma aliança político/diplomática com China, Rússia, África do Sul e Índia.

** Todos os direitos reservados, não podendo ser reproduzido ou usado sem citar a fonte.

Ericson Scorsim. Advogado e Consultor no Direito Regulatório das Comunicações. Doutor em Direito pela USP. Autor dos livros Jogo Geopolítico das Comunicações 5G: Estados Unidos, China e o Impacto no Brasil e Geopolítica das Comunicações (2ª ed), edição autoral, Amazon, 2020 e 2022.


[1] XIV BRICS Summit Beijing Declaration, 24/06/2022.

Crédito de Imagem: Toda Política

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Livro: Antiliderança Tóxica na Presidência do Brasil

Divulgo para você meu novo livro “Antiliderança Tóxica na Presidência do Brasil“. 

A obra trata de temas fundamentais para a compreensão dos problemas de desgoverno antidemocrático e as opções estratégicas para a correção do destino do País.

Disponível: Amazon.

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Computação em nuvem: o contexto geopolítico e geoeconômico

Estados Unidos e China disputam a liderança tecnológica global. A competividade tecnológica é medida pela capacidade computacional de cada país, representada pelas infraestruturas de computação em nuvem e da pela fabricação de semicondutores. Estas infraestruturas computacionais são essenciais para a modelagem do espaço cibernético global. A capacidade cibernética de um país representa, atualmente, um dos fatores do poder nacional.[1]Deste modo, cada país com poder cibernético busca projetar seu poder para os demais países, algo que representa seu soft power.

A título ilustrativo, os Estados Unidos aprovaram a Lei denominada Cloud Act, uma lei que permite o acesso por autoridades norte-americanos a dados armazenadores em servidores de empresas localizadas no exterior, porém subordinadas à jurisdição norte-americana. Há riscos geopolíticos e geoeconômicos decorrentes do Cloud Act dos Estados Unidos, sequer percebidos pelas autoridades brasileiras. Apesar do nome, o tráfego internacional dos dados é predominante realizado através de redes de cabos submarinos localizados nos oceanos.  A capacidade computacional é a capacidade para coletar dados, armazenar e processar dados e transferir dados. No âmbito geopolítico e geoeconômico, o país com maior domínio sobre seus dados e infraestruturas digitais detêm maior controle político e econômico sobre sua economia e, inclusive, influência sobre os demais países.

Cloud computation produz bilhões de dólares em negócios, contribuindo os fluxos dos negócios, o fluxo de capitais financeiros e o fluxo logístico. Portanto, a capacidade da infraestrutura digital pode melhorar o ambiente dos negócios em escala global. A denominada Cloud Computation é o sistema complexo integrado por uma rede de computadores, softwares, data centers, redes de cabos submarinos, entre outros elementos.  As infraestruturas são consideradas como serviços (infrastructure as a service), software como serviços (software as service), plataforma como serviço (plattform as service) entre outros. É preciso diferenciar os serviços de computação em nuvem prestados aos governos daqueles serviços oferecidos às empresas. Existem, ainda, distinções entre nuvens privadas, públicas e híbridas.

Na computação em nuvem para governos, especialmente em áreas de defesa e inteligência nacional, via de regra, há requisitos mais rígidos para a segurança cibernética, devido à presença de dados sensíveis nas redes. Esta disputa geopolítica e geoeconômica estende-se para os padrões técnicos internacionais das normas de segurança cibernética. Nas camadas de segurança cibernética, é preciso analisar a segurança dos dados, a segurança das aplicações, a segurança da hospedagem dos dados e a segurança das redes. Neste contexto, para selecionar o provedor de computação em nuvem é necessário avaliar a confiabilidade da empresa e verificar se a mesma segue os padrões internacionais de segurança cibernética, bem como se ela oferece uma infraestrutura com resiliência a ataques cibernéticos. Quanto aos standards, é preciso evitar políticas abusivas na fixação de padrões técnicos de segurança cibernética de modo a excluir a competição internacional.

Há diversas aplicações para negócios com computação em nuvem: indústria, cidades inteligentes (centros de operações inteligentes para gestão urbana), gestão de redes de energia elétrica, gestão de redes de iluminação pública, governo digital na nuvem, gestão de sistemas de abastecimento de água, proteção ambiental inteligente, sistemas de refrigeração inteligentes, transportes e logística, mídia audiovisual (produção de filmes e radiodifusão), portos inteligentes, setor de mineração, óleo e gás, entre outros. A título ilustrativo, diversos cineastas e atores localizados em diferentes países poderão realizar, conjuntamente, filmes e animações. Recentemente, uma empresa de tecnologia ofereceu a experiência de formação de uma orquestra virtual, com a participação de músicos em diversos países.  Na área de portos, aplicações de computação em nuvem possibilitam a redução de custos, com a formatação de rotas e escalas de carga e descarga de containeres, bem como de navios.

No setor de finanças, há o projeto de construção da futura geração de infraestrutura financeira, denominada “Bank of Things”, uma parceria entre a Huawei e o SPD Bank. O foco central é o aproveitamento da internet das coisas para o setor financeiro, especialmente no aspecto da análise de riscos de crédito. Há oportunidades de BoT (bank of things) para as empresas denominadas fintechs. O objetivo é criar aplicações da partir da tecnologia de 5G e Internet das Coisas para o desenvolvimento de objetos duplicados (twins of things), serviços das coisas.  O objetivo é monetizar os ativos, a partir da conectividade. Assim, aproveita-se os sistemas de pagamentos digitais e dados daí decorrentes.[2] Exemplificando-se: no âmbito de smart cars, os dados dos carros e motorista servirão para análise de riscos para seguros. No aspecto de smart homes, dados dos moradores servirão para análise do potencial de consumo e análise de crédito e para fins de publicidade comercial. Toda a economia digital depende dos sistemas de computação em nuvem, essencial para a transformação digital. Com a tecnologia de quinta-geração 5G em redes de telecomunicações móveis e a internet das coisas haverá a demanda exponencial por serviços de computação em nuvem. Além disto, ferramentas de inteligência artificial e big data contribuirão – e muito – para o processamento de dados (vídeos, textos, imagens, etc), em hiperescala. Há modelos matemáticos aplicados aos sistemas de computação em nuvem com capacidade de para processamento de bilhões de dados em tempo real.

Neste contexto, pesquisas científicas para o desenvolvimento de novas medicações que eram realizadas em anos, agora, terão resultados em meses.  Haverá maior tráfego de dados, por isto a necessidade de reforço na segurança cibernética. Os Estados Unidos contam com as Big Techs em computação em nuvem como: Amazon, Microsoft, Google, Oracle, IBM, SalesForce, Dropbox, entre outras. Estas empresas oferecem serviços de computação em nuvem no Brasil para empresas privadas e governos. No Brasil, Tribunais de Justiça têm contratado serviços de computação em nuvem de empresas estrangeiras.[3] Grupos empresariais brasileiros têm contratados serviços de computação em nuvem de empresas estrangeiras.

O Banco Central do Brasil tem resolução autorizando a contratação de serviço de computação em nuvem com armazenamento de dados no exterior.[4] A China conta com Alibaba, Tencent e Huawei. A União Europeia não conta com nenhum competidor global em computação em nuvem. Por isto, a sua política pública para incentivar o desenvolvimento de infraestrutura de computação em nuvem por empresas europeias. A União Europeia tem programas para o fortalecimento de sua soberania cibernética, justamente com o foco no desenvolvimento de infraestruturas de computação em nuvem. A disputa geopolítica é ampliada para o poder de acessar dados localizados em servidores localizados no exterior, o que possibilita a extensão a aplicação extraterritorial da jurisdição norte-americana.  

A título ilustrativo, os Estados Unidos aprovaram o Cloud Act (Clarifuying Lawful Overseas Use of Data), isto é, a lei que permite o acesso por autoridades norte-americanas a dados armazenados por provedores de serviços em servidores localizados em outros países. Nos Estados Unidos, há  o projeto de lei sobre acesso a dados, transparência e responsabilidade, denominado “Setting na American Framework to ensure data acess, transparency and accountability Act” or “Safe Data Act”. A regulação do tema é incipiente. A União Europeia é quem está mais avançada no assunto, tendo o Cybersecurity Act e a proposta para regulamentação da governança de dados.  A agência europeia para segurança cibernética (ENISA) tem recomendação, por exemplo, para a segurança em nuvem para os provedores de serviços no setor de saúde.[5] Outra recomendação para segurança e resiliência de computação em nuvem para governos.[6] Existe a recomendação de padrões de segurança cibernética para hospitais. Nos Estados Unidos, há decisão presidencial (Executive Order n. 13984), de janeiro de 2021, que trata de ataques cibernéticos maliciosos contra infraestruturas de computação em nuvem. Neste ato, há a determinação para que a National Security Agency avalie os riscos à segurança cibernética no fornecimento de tecnologias e infraestruturas de nuvem para o governo.A partir daí, o Departamento de Comércio passou a exigir que os provedores de serviços de infraestruturas de computação em nuvem verifiquem a identidade estrangeiras dos prestadores de serviços, bem como as regras de certificação e compliance.

Os Estados Unidos aprovaram regulamentação específica para a contratação de serviços de computação em nuvem pelo governo e agências federais. A China aprovou a lei Data Security Law, com garantias de proteções às infraestruturas críticas de informações (serviços de informações, energia, transporte, conservação de água, finanças, serviços públicos, governo eletrônico), requisitos para a transferência internacional de dados, regras de controle de exportação de dados, compliance para provedores de dados, plataformas de comércio, consumidores de dados, regras de localização de data centers em território chinês. Registre-se que embora existam regras comuns de segurança cibernética, conforme a singularidade do setor há a demanda por regras mais específicas. Assim, há peculiariedade do setor financeiro, energético, nuclear, de defesa, saúde, entre outros.  Quanto aos riscos cibernéticos, há algumas práticas de compartilhamento de riscos entre o provedor do serviço e computação em nuvem e o cliente. Nos contratos de computação em nuvem deverá haver a máxima transparência quanto aos riscos cibernéticos e informações sobre as cláusulas de atualização dos serviços de segurança cibernética em dispositivos, redes e equipamentos.

Em contratos de seguros diante de riscos cibernéticos é fundamental a clareza e precisão das cláusulas sobre as coberturas contratuais. Além disto, é importante que as empresas desenvolvam matrizes de riscos geopolíticos e geoeconômicos. Em futuro próximo, possivelmente haverá discussões sobre questões concorrenciais no mercado de computação em nuvem, especialmente sobre a concentração econômica.[7] É importante a confidencialidade, disponibilidade, integridade dos dados em computação em nuvem. Há, também, a preocupação com a sustentabilidade ambiental dos data centers, pois são grandes consumidores de energia. Neste aspecto, os serviços de computação em nuvem deverão seguir o princípio da eficiência energética. No Brasil, não há propriamente a regulamentação da segurança cibernética nos serviços de computação em nuvem. Falta no Brasil uma lei geral de segurança cibernética. Por ora, o tema é apenas abordado como autorregulação pelas empresas privadas. Resumindo-se: a economia digital será moldada pelas infraestruturas e serviços de computação em nuvem. O País que melhor investir em infraestruturas de computação em nuvem terá maior competividade internacional e poder computacional. O Brasil tem um perfil geoestratégico interessante para atrair investimentos em computação em nuvem e se tornar um player global e regional neste setor.   

** Todos os direitos reservados, não podendo ser reproduzido ou usado sem citar a fonte.

Ericson Scorsim é advogado e consultor no Direito Regulatório das Comunicações, com foco em infraestruturas de telecomunicações e mídia, doutor em Direito pela USP e autor dos livros “Jogo Geopolítico das Comunicações 5G: Estados Unidos, China e o Impacto no Brasil, Amazon, 2020. e Geopolítica das comunicações, Amazon, 2021.


[1] Cf. Cyber capabilities and National Power: a net assessment. The International Institute for Strategic Studies – IISS.

[2] Huawei and SPDBANK, Bank of Things White paper. Next-Generation financial infrastructure, 2020.

[3] É o caso, por exemplo, do Tribunal de Justiça de São Paulo que contratou os serviços de computação em nuvem da Microsoft.

[4]  Banco Central do Brasil, Circular n. 3.909, de 16 de agosto de 2018, dispõe sobre a política de segurança cibernética e sobre requisitos para a contratação de serviços de processamento, armazenamento de dados e de computação em nuvem a serem observados pelas instituições de pagamento autorizadas a funcionar pelo BACEN.

[5] Ver: European Union Agency for Cybersecurity. Cloud Security for healthcare services, January, 2021.

[6] Ver: European Network and information security agency. Security & Resiliene in governamental clouds, making an informed decision, January, 2011.

[7] Geer, Dan, Jardine, Erics e Leverett, Eireann. On Market concentration and cybersecurity risk, Journal of Cyber Policy, 2020, vol. 5, n. 1, 9-29, Routledge – Taylor & Francis Group.

Crédito de Imagem: Universidade Tuiuti do Paraná

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Tech Diplomacy. Capacitação da política externa dos países no domínio das tecnologias e cibernética

As tecnologias têm assumido um papel central em diversos países. Por isto, alguns países estão inovando sua política externa em relação as novas tecnologias. Algumas medidas estão sendo adotadas para adaptar a diplomacia às questões tecnológicas.

Primeira medida, a indicação de embaixadores com expertise em tecnologias,  digital ou cibernética.

Segunda, a criação de uma equipe ou escritório especializado em assuntos tecnológicos para a gestão da política externa.

Terceira, o design de uma estratégia em política externa focada em tecnologias. No contexto da nova era geopolítica algumas percepções são necessárias: a antecipação de consciência situacional para se ficar à frente das mudanças tecnológicas e seu impacto na dinâmica internacional, a coordenação de posições política para reduzir a complexidade na política doméstica e na política externa, uma visão estratégica clara com a definição de prioridades, valores e interesses. 

Diante da velocidade das mudanças tecnológicas há os desafios para a liderança adequada à velocidade da evolução tecnológica, legislação alinhada ao processo decisório e liderança maximizar as oportunidades das tecnologias. A diplomacia cibernética requer a colaboração entre governos e o setor privado. A Microsoft, por exemplo, estabeleceu um escritório permanente nas Nações Unidas. A intensidade da disputa pela liderança política, econômica e tecnológica entre os países criou novas áreas de conflito geopolítico.  Na competição há temas impactantes como a cadeia global de materiais-raros e semicondutores. Outro tema na agenda internacional são as normas e padrões das novas tecnologias.

A arquitetura global da internet é alvo de disputa entre os países. Por isto, a integração das questões das novas tecnologias na política externa requer algumas capacidades: manutenção da consciência situacional sobre o estado de mudança tecnológica e seu impacto na dinâmica internacional, a coordenação de posições efetivamente na política doméstica e política externa, para melhor alinhamento entre política tecnológica para reduzir a complexidade, o direcionamento da política tecnológica com estratégica clara e estabelecimento de prioridades, valores e interesses. Alguns países já incorporaram em sua política externa medidas de integração das novas tecnologias: diplomatas, equipes e estratégias. Os tech diplomatas têm as seguintes áreas de responsabilidade: aconselhamento na política doméstica para garantir o pensamento, a política e a regulação conforme as principais tendências internacionais e prioridades, coordenação e alinhamento político doméstico e internacional em fóruns multilaterais, minilaterais e bilaterais, criação da política e estratégica, liderando ou contribuindo domesticamente e internacionalmente. Alguns exemplos de tech ambassador (embaixador com expertise em tecnologia): Dinamarca, China, UK, US, França, Alemanha, Áustria, Australia, entre outros. A Dinamarca tem um tech ambassador para engajamento com empresas de tecnologia com escritórios em Copenhagen, São Francisco e Beijing. O Reino Unido indicou um cônsul geral com experiência em negócios para representar os interesses britânicos em São Francisco, sede das principais empresas de tecnologia. A China tem uma rede com mais de 140 (cento e quarenta) diplomatas especializados para identificar e apoiar na aquisição de empresas de tecnologias emergentes. Os Estados Unidos criaram o escritório de coordenação de questões cibernéticas, com uma rede global com mais de 150 (cento e cinquenta) oficiais em política cibernética.

A título ilustrativo, o governo norte-americano criou o US Bureau of Cyberspace and Digital Policy com seu embaixador para tecnologias críticas emergentes. Neste contexto, recomenda-se que as empresas de tecnologias possuam política geopolítica com transparência, com regras claras e precisas para atuar em crises, com experts em conflitos geopolíticos e de segurança, lei internacional e direitos humanos.  Também, sugere-se que as empresas possuam um comitê de crise geopolítica.  Outra recomendação é a participação internacional das empresas de tecnologia em centros de decisão geopolítica como a Organização das Nações Unidas. Também, outra sugestão é o estabelecimento de um comitê para a fixação de práticas de autorregulação.[1] A França  tem uma equipe digital com mais de 30 (trinta) pessoas para tratar com o Ministro para Europa e Relações Exteriores, a Agência Nacional para a Segurança da Informação e o Ministério da Economia e Finanças. A Alemanha tem um time de coordenação (International Cyber Policy Coordination Staff) com 7 (sete) membros permanentes. A Índia tem no Ministério de Relações Exteriores uma política externa dedicada às tecnologias, porém sem adotar outras medidas como a indicação de um embaixador dedicado ao tema e/ou que que desenhe a estratégia da política externa no domínio tecnológico. 

No Portal UNIDIR Cyber Policy há o cenário das políticas públicas de defesa cibernética dos países.[2] Estas lições podem ser aproveitadas pelo Brasil. A construção da capacidade da diplomacia no domínio cibernético e das novas tecnologias é essencial no contexto geopolítico, geoeconômico, geocultural e geodefesa. O cenário de competividade global requer que o Brasil adote uma nova política externa, comprometida com temas tecnológicos e cibernéticos. As novas tecnologias têm uma influência significativa os governos, mercados e sociedade. Há diversos temas na agenda internacional que o Brasil precisa estar engajado e apresentar sua posição: arquitetura da internet, segurança cibernética, propriedade intelectual, proteção de dados, conectividade digital, acessibilidade à internet, padrões técnicos de equipamentos, internet das coisas, inteligência artificial, 5G, 6G proteção das infraestruturas nacionais críticas,  operações de inteligência e desinformação nas redes, espionagem, entre outros temas relevantes. Por isto, é importante a diplomacia cibernética e a diplomacia cultural a serviço do Brasil.

O Itamaraty tem muito a contribuir na evolução dos serviços de diplomacia diante as novas tecnologias.  Há diversos órgãos internacionais com questões tecnológicas a serem tratadas: Organização das Nações Unidas, Organização Internacional de Telecomunicações, ICANN, Comissão Eletrotécnica Internacional, ISO, entre outras. A participação do Brasil nas organizações internacional para debater questões tecnológicas e técnicas é fundamental para o seu desenvolvimento tecnológico, econômico, social e cultural.

** Todos os direitos reservados, não podendo ser reproduzido ou usado sem citar a fonte.

Ericson Scorsim. Advogado e Consultor no Direito Regulatório das Comunicações. Doutor em Direito pela USP. Autor do livro Jogo Geopolítico das Comunicações 5G: Estados Unidos, China e o Impacto no Brasil, Amazon, 2020. Autor do livro Geopolítica das Comunicações, Amazon, 2021.


[1] Disrupters and defenders. What the Ukraine War has taught us about the power of global tech companies. Tony Blair Institute.

[2] Erzse, Akos e Garson, Melanie. A Leader’s guide to building a tech forward foreing policy. Tony Blair Institute for Global Change, march 25, 2022.

Crédito de Imagem: Polemics – Magazine

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Proposta projeto de lei para Curitiba de sustentabilidade ambiental sonora em condomínios residenciais

A Organização das Nações Unidas definiu os objetivos de desenvolvimento sustentável. Dentre as categorias: saúde e bem estar (meta 3), educação de qualidade (meta 4), energia acessível e limpa (meta 7), trabalho decente e crescimento econômico (meta 8), indústria, inovação e infraestrutura (meta 9), cidades e comunidades sustentáveis (meta 11) e consumo e produção responsáveis meta 12). Assim, neste contexto de desenvolvimento sustentável para termos cidades sustentáveis, saudáveis, inteligentes e resilientes, é que precisamos incorporar práticas de sustentabilidade ambiental sonora na cidade de Curitiba.

O ponto a destacar aqui é a poluição sonora produzida por condomínios residenciais. É o uso abusivo de equipamentos de jardinagem, tais como: roçadeiras, podadeiras, sopradores e cortadores de grama, com em níveis de potência acima entre 85 (oitenta e cinco) decibéis até 110 (cento e dez decibéis), superiores à recomendação da Organização Mundial da Saúde de limite de 50 (cinquenta) decibéis. Outras fontes de ruídos em condomínios são as obras de construção civil e serviços de reparo e manutenção, os quais utilizam equipamentos mecânicos barulhentos e que causam vibrações que ressoam nas estruturas do edifício.  Outras fontes adicionais de ruídos em condomínios são elevadores, portões e chaves eletrônicas de portas. Por todas estas razões, a prefeitura na sua missão institucional de promover a política ambiental sonora na cidade deve incentivar inovações tecnológicas a serem adotadas pelos condomínios para substituir tecnologias mecânicas barulhentas por outras tecnologias silenciosas.

Outro ponto é o incentivo pela prefeitura de práticas de sustentabilidade ambiental sonora de práticas de autocontenção e autorregulação dos ruídos. Ora, a prefeitura tem programas para o controle do lixo e sua reciclagem para evitar a sujeira nas ruas. Por que não há um programa antirruído na cidade?

Ruídos são como o lixo jogado nas ruas, apenas com diferença que o ruído é jogado no ar. Ruídos causam a poluição do ar, perturbando a saúde pública, o bem estar público e o meio ambiente.  Ruídos causam a degradação da qualidade de vida e a degradação ambiental. Por isto, a prefeitura deveria incentivar o consumo, produção e utilização de responsável de equipamentos mecânicos silenciosos, especialmente dos equipamentos de jardinagem. A prefeitura deve incentivar o comportamento responsável dos condomínios quanto à sustentabilidade ambiental sonora. Deste modo, a prefeitura deveria incentivar a adoção de melhores práticas para a notificação prévia a respeito do impacto acústico de obras e serviços em condomínios, em tempo real. 

Outro ponto é a prefeitura incentivar a adoção de práticas para a promoção do princípio da eficiência acústica em obras, serviços e equipamentos utilizados e contratados pelos condomínios. Também, a prefeitura deveria disponibilizar um canal de denúncias online para que os cidadãos apresentassem reclamações contra os ruídos de condomínios, inclusive com possibilidade de encaminhamento de gravações de vídeos e áudios sobre os ruídos. Além disto, a prefeitura deveria aproveitar o contexto das inovações tecnológicas para atualizar o exercício de seu poder de polícia ambiental. A propósito, a lei municipal 15.324, de 9 de novembro de 2018, a qual dispõe sobre incentivos à inovação e à pesquisa e tecnológica no ambiente produtivo. A lei incentiva o ecossistema de empreendedorismo e inovação, para os seguintes fins: “promoção da competividade empresarial nos mercados nacional e internacional”, “promoção do desenvolvimento e a difusão de  tecnologias sociais e o fortalecimento da extensão tecnológica para a inclusão produtiva e social”, “promoção da inovação visando a eficácia e a eficiência na prestação de serviços públicos”, “utilização do poder de compras governamentais para o fomento à inovação”, art. 1, inc. IV, VI, VII, XII. Por exemplo, a prefeitura poderia melhor o exercício do poder de polícia ambiental, mediante a utilização de equipamentos como drones para fazer a inspeção dos condomínios para fins de controle da poluição sonora. Também, a prefeitura poderia incentivar a utilização de sensores acústicos para o monitoramento ambiental da poluição sonora.

Outro ponto que poderia ser incentivado é utilização de internet das coisas (IoT), inteligência artificial, big data, machine learning para a criação de mapas de ruídos de condomínios. Enfim, para termos uma Curitiba sustentável, inteligente e saudável precisamos de políticas públicas efetivas para a contenção dos ruídos urbanos.

** Todos os direitos reservados, não podendo ser reproduzido ou usado sem citar a fonte.

Ericson Scorsim. Advogado e Consultor em Direito do Estado. Doutor em Direito pela USP. Autor do livro Propostas Regulatórias – Anti-Ruídos Urbanos, Amazon, 2022.

Crédito de Imagem: Blog Usisol.

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Arbitragem entre Huawei e Suécia sobre a exclusão de investimentos em 5G

Compartilho com vocês artigo sobre arbitragem entre Huawei e Governo da Suécia na questão do 5G, publicado no prestigiado Conjur.

Em janeiro de 2022, a Huawei requereu pedido de arbitragem internacional contra o governo da Suécia perante a Câmara de Arbitragem do Banco Mundial — Centre for the Settlement of Investment Disputes (Icsid), para a proteção de seus investimentos em tecnologia de 5G no mercado sueco, avaliados em mais de 520 milhões de euros. Para entender melhor o caso. A agência reguladora das comunicações da Suécia (Swedish Post and Telecom Agency) proibiu o fornecimento de tecnologia de redes de 5G pela empresa Huawei.

A decisão foi adotada na ocasião do leilão de frequências na faixa de 3.400-3.720 Mhz. Decidiu-se que os equipamentos da Huawei utilizados em funções centrais das redes de telecomunicações devem ser desinstalados até 1 de janeiro de 2025. Diante desse fato, a Huawei apresentou recurso perante o Tribunal Administrativo da Suécia. Porém, não obteve êxito. Registre-se que esta decisão da Suécia foi influenciada pelas práticas de lawfare adotados pelo governo norte-americano contra Huawei.

Em 2022, a Huawei levou o caso perante a Câmara de Arbitragem do Banco Mundial — Centre for the Settlement of Investment Disputes (Icsid). Na sua petição de requerimento de arbitragem internacional, a Huawei alegou as razões a seguir analisadas. A Huawei contribuiu para com economia da Suécia por 20 anos. As autoridades suecas adotaram um tratamento discriminatório nos investimentos da Huawei realizados na Suécia, através de sua subsidiária Huawei Sweden. A decisão de exclusão da Huawei do mercado da Suécia implica em danos de mais 520 milhões de euros ou 5,2 bilhões na moeda sueca (SEK).

A decisão sueca viola as obrigações internacionais decorrentes do acordo de investimentos entre Suécia e China (acordo de proteção mútua entre a Suécia e a China). A Huawei afirmou que implementou todas as regras de segurança cibernética exigidas, obtendo mais de 270 certificações globais. Segundo a Huawei, a decisão da Suécia de exclusão da Huawei do fornecimento de tecnologia de 5G representa drástica e inesperada mudança de posição das autoridades suecas.

A legislação sueca (Eletronic Communications Act de 2003) outorga à agência de telecomunicações a competência para regular os serviços de telecomunicações. Em 2020, essa lei foi modificada para que a agência de telecomunicações considere os riscos à segurança das redes de telecomunicações no procedimento de outorga de licenças. Deste modo, a agência de telecomunicações deve consultar as autoridades de segurança e as forças armadas, quando ocorrer a outorga de licenças individuais possa representar riscos à segurança nacional. Nesta hipótese, a agência reguladora de telecomunicações deve consultar as autoridades pertinentes.

Segundo a Huawei, a agência reguladora de telecomunicações atuou de modo contrário às exigências legais. De outro lado, a agência de comunicações é contrária à regra que determinou a possibilidade de imposição de variações das condições de segurança na outorga de licenças individuais. A decisão final da agência reguladora de telecomunicações considerou que os produtos da Huawei representam riscos à segurança da Suécia. Porém, a agência não especificou nenhuma ameaça especifica da Huawei à segurança da Suécia.

Com a exclusão da Huawei, a Ericsson, principal concorrente, ganhou o monopólio no fornecimento de produtos e serviços de 5G. Apesar disso, o CEO da Ericcson declarou que a Suécia desviou-se das diretrizes da União Europeia em relação à segurança das redes 5G, a qual considera o balanceamento de preocupações legítimas de segurança nacional e a livre competição. E, ainda, o referido CEO da Ericcson declarou sua crítica à legislação europeia de segurança cibernética das redes 5G. Segundo a petição, a Huawei amparou-se no seu direito à proteção de seu investimento, conforme o acordo internacional entre Suécia e China.

A Huawei tentou resolveu a disputa com a Suécia através de negociações, porém não obteve sucesso. A Suécia quebrou o acordo internacional com a China. Razões de segurança nacional não estão presentes no acordo internacional de investimentos entre a Suécia e a China. Vinte anos de atuação da Huawei na Suécia nunca houve um incidente de segurança. A Suécia violou suas obrigações previstas no acordo internacional previstas no artigo 2 (1), o qual garante o justo e equitativo tratamento aos investidores chineses na Suécia. A Suécia quebrou o justo e equitativo parâmetro porque a decisão da agência reguladora de telecomunicações é: 1) arbitrária e discriminatória; 2) desproporcional (3) não é transparente; (4) é contrária às expectativas legítimas da Huawei como um investor na Suécia (5) foi feita sem garantir o direito da Huawei ao devido processo legal.

Conforme o acordo China/Suécia nenhum estado contratante deve expropriar ou nacionalizar, ou adotar nenhuma outra medida em relação ao um investimento feito sem seu território por um investidor de outro estado contratante, exceto baseado no interesse público, sob a condição do devido processo legal e compensação. Deste modo, a Suécia adotou medidas que tiveram o efeito de expropriar os investimentos da Huawei sem compensação. Por isto, um dos pedidos da Huawei é de que o governo da Suécia compense as perdas pela privação de investimentos no total de aproximadamente 520 milhões de euros — 5,2 bilhões, conforme a moeda sueca.

Conforme o princípio da reparação total, deve ser considerado a perda da reputação devido à quebra do tratado internacional entre Suécia e China. Como pedidos finais, a Huawei no procedimento de arbitragem: declaração que a Suécia violou suas obrigações sob o acordo de investimentos entre Suécia e China, ordenar que a Suécia compense a Huawei por todos os danos e perdas sofridos como resultado da quebra pela Suécia do acordo de investimentos Suécia e China, a ser quantificado pela Huawei no seu devido momento, ordenar que a Suécia pague todos os custos de arbitragem, inclusive os custos legais e despesas da Huawei, ordenar que a Suécia pague os juros sobre as quantias mencionadas, desde o momento da quebra pela Suécia do acordo internacional entre Suécia e China, garanta a Huawei qualquer outra medida que o Tribunal entenda adequado.

A Huawei se reserva o direito de apresentar outras questões relacionados com os temas em disputa descritos no pedido de arbitragem ou relacionados entre as partes, emendar e/ou suplementar a petição e buscar medidas provisórias diante do Tribunal Arbitral. Resumindo-se: o foco do pedido de arbitragem internacional é a proteção ao investimento da Huawei no mercado da Suécia no fornecimento de equipamentos de redes de telecomunicações 5G. É um tema que afeta o comércio internacional e o regime de proteção aos investimentos internacionais.

Como se nota desse precedente, razões geopolíticas e geoeconômicas impactam o comércio internacional e acabam por negar a liberdade de comércio e liberdade de investimentos. A lawfare praticada pelos Estados Unidos contra a empresa chinesa influenciou o governo da Suécia a adotar o veto conta a Huawei. Por isso, as empresas devem em sua análise de riscos considerar os fatores geopolíticos e geoeconômicos em seus planos de investimentos.

Ericson Scorsim é advogado e consultor no Direito Regulatório das Comunicações, com foco em infraestruturas de telecomunicações e mídia, doutor em Direito pela USP e autor dos livros “Jogo Geopolítico das Comunicações 5G: Estados Unidos, China e o Impacto no Brasil, Amazon, 2020. e Geopolítica das comunicações, Amazon, 2021.

Publicado originalmente: Portal Conjur em 08/06/2022.

Crédito de Imagem: Notícias ao Minuto