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Guerra na Ucrânia e as infraestruturas de comunicações. Algumas lições da tragédia para o Brasil

No jogo geopolítico entre Rússia, OTAN (Organização do Tratado do Atlântico Norte) e Estados Unidos surgiu a maior vítima: o povo da Ucrânia.[1] A guerra iniciada por Putin agrediu a soberania da Ucrânia. O objetivo geoestratégico de Putin é conquistar a região leste da Ucrânia e o acesso ao Mar e, indiretamente, contar a expansão da OTAN na região.

Na versão de Presidente Putin da Rússia, a OTAN avança em áreas de influência da Rússia, por isto a necessidade de contenção, mediante a guerra. Outra motivação oculta é que o possível sucesso econômico e democrático da Ucrânia pode incentivar ao povo da Rússia para promover mudanças em seu sistema político.  A Rússia quer expandir sua influência sobre a Europa e a Ásia. Como armas geoeconômicas, a Rússia mantém em estado de dependência para seu óleo e gás a Europa, principalmente a Alemanha (recebe aproximadamente 40% – quarenta por cento do gás russo).

Os Estados Unidos dependem apenas 10% (dez por cento) do gás russo. O Presidente Binden dos Estados Unidos anunciou a suspensão da importação do gás da Rússia. A Rússia quer dominar áreas geográficas da Ucrânia e as infraestruturas de conectividade: portos e as redes de gasodutos, um atentado à soberania da Ucrânia. Os Estados Unidos têm contribuído com o compartilhamento de inteligência militar com a Ucrânia, bem como no treinamento de militares ucranianos, resistência civil da população e fornecimento de armas.  Diversos países anunciaram uma série de sanções econômicas contra a Rússia. Empresas globais também anunciaram inúmeras medidas para suspender negócios na Rússia.

Neste cenário de guerra entre Rússia e Ucrânia mostra-se algumas reflexões sobre as infraestruturas de comunicações e o impacto da guerra. Usualmente, alvos militares são portos, aeroportos, refinarias, instalações militares, indústria bélica, instalações nucleares, entre outros. Mas, também, as infraestruturas de comunicações podem, também, ser qualificadas como alvos militares. As infraestruturas de internet, telecomunicações e radiodifusão são essenciais para as comunicações de um país.

 Estas infraestruturas de comunicações são consideradas dual-use, isto é, têm funções civis e militares. Também, servem para a coleta de sinais de inteligência militar.  Por isto, no contexto de guerra, estas infraestruturas de comunicações podem ser consideradas como alvos militares. Deste modo, torres de telecomunicações, redes de fibras óticas, redes de cabos submarinos, satélites, entre outros, podem ser objeto de operações militares.  Sistemas de comando e controle das comunicações militares dependem do acesso ao espectro de radiofrequências. Estas podem ser alvo de operações militares para fins de disrupção do sistema de comunicação militar. Além disto, no contexto de guerras híbridas, operações cibernéticas podem causar a disrupção dos sistemas de comunicações.  Operações cibernéticas podem comprometer os sistemas de comunicações da população, dos sistemas de comando e controle das comunicações militares e inclusive os sistemas de comando e controle dos sistemas de armas nucleares e das usinas nucleares.

Estes temas são abordados em dois livros de minha autoria: Jogo geopolítico das Comunicações 5G: Estados Unidos, China e o impacto no Brasil e Geopolítica das Comunicações, ambos de edição autoral, publicado na Amazon.

Por outro lado, Elon Musk da Star Link ofereceu sinal de internet por satélite para a Ucrânia, mediante a entrega de terminais terrestres para acessar aos sinais de telecomunicações. Este ato produz dois riscos. Primeiro, o terminal de acesso à internet pode ser geolocalizado e rastreado pelas forças militares russas e, assim, ser considerado um alvo militar. Segundo, o próprio satélite pode se tornar um alvo das forças russas e, assim, objeto de disrupção e/ou destruição. Também, a utilização de drones, os quais utilizam a faixa de radiofrequências, para produzir inteligência militar e atacar alvos russos, pode ser objeto de geolocalização. Forças militares russas têm derrubados sites governamentais da Ucrânia. Registre-se que a disrupção do sistema de comunicações impede o acesso aos serviços de emergência na Ucrânia, em prejuízos ao socorro aos feridos de guerra. Especialistas debatem a respeito se um ataque cibernético pela Rússia a um país membro da OTAN seria considerado um ato de guerra.

Os especialistas entendem que se o ataque militar for significativo, então a operação cibernética seria qualificada como um ato de guerra. Outro tema é a utilização de redes sociais em campanhas de desinformação da população, com a disseminação de notícias falsas. Operações de desinformação, de influência e psicológica são utilizadas pelas forças russas em larga escala. Um dos primeiro alvos das operações militares é a infraestrutura associada à cognição da população. Por isto, as redes sociais são, também, alvos militares. A reputação dos líderes é objeto de campanhas de difamação online, bem como há medidas para sabotar a economia do País. No tema da mídia, a Rússia adotou legislação para controlar a informação divulgada pela mídia russa e redes sociais.

Outros países baniram a divulgação de informações por agências de mídia estatais da Rússia. A manipulação da opinião da pública é um dos objetivos da guerra e manipulação dos fatos e da verdade, isto é, a guerra informacional e o controle das narrativas divulgadas dentro do seu território e para o mundo.

Resumindo-se: o Brasil tem muito a aprender a trágica guerra entre Ucrânia e Rússia. Algumas lições. Primeira, é a aprendizagem é a percepção da essencialidade da infraestrutura de comunicações à economia do País e a sociedade.  Segunda, é o fortalecimento da segurança cibernética do País, especialmente a segurança cibernética das infraestruturas de redes de comunicações. Também, o Brasil deve se engajar mais internacionalmente para a aprovação de normas de responsabilidade cibernéticas pelos países.   Terceira, a percepção do impacto da campanhas de desinformação realizadas em redes sociais e os riscos à democracia, com os riscos à dimensão cognitiva da população. Quarta, o objetivo geoeconômico para redução da dependência geoeconômica do País com os fertilizantes oriundos da Rússia (cerca de 90% – noventa por cento). Quinta, a demanda por inovações no setor de defesa, especialmente com as tecnologias emergentes.  Sexta, a necessidade de reforço à integridade do sistema democrático e a integridade do sistema eleitoral contra operações de influência, psicológicas e de desinformação com objetivo de manipular a vontade política.

** Todos os direitos reservados, não podendo ser reproduzido ou usado sem citar a fonte.

Ericson M. Scorsim. Advogado e Consultor em Direito Regulatório das Comunicações. Doutor em Direito pela USP. Autor do livro Jogo Geopolítico das Comunicações 5G: Estados Unidos, China e o Impacto no Brasil, Amazon. Autor do livro Geopolítica das Comunicações, Amazon.


[1] O Estado do Paraná tem uma das maiores comunidades ucranianas do Brasil. Por isto, a nossa solidariedade com o povo da Ucrânia, vítima da agressão causada pelo Presidente Putin da Rússia.

Crédito de Imagem: Olhar Digital

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União Europeia e os incentivos para tecnologias de segurança e defesa: a participação da indústria privada e startups

A Comissão Europeia lançou, em fevereiro, um conjunto de ações para incentivar a inovação em tecnologias de segurança e defesa. Considera-se o contexto geopolítico de ameaças híbridas, mediante campanhas híbridas, inclusive operações cibernéticas.  

Dentre os eixos estratégicos principais estão:

I) estímulos pelos Estados em áreas-chaves de tecnologias críticas que sejam desenvolvidas ou adquiridos pela União Europeia em quadros cooperativos;

II) incentivar a aquisição conjunta de capacidade defesa desenvolvida de modo colaborativo dentro da União Europeia;

III) o engajamento dos Estados para atualizar seus sistemas de controle de armas e exportação de armas, considerando-se a capacidade de defesa desenvolvida no quadro cooperativo da União Europeia. 

Neste contexto, busca-se a participação do setor privado na pesquisa e inovação para a redução de dependência em setores estratégicos. Considera-se o aspecto dual-use das tecnologias, isto é, o uso civil e militar.  Segundo o texto de referência, as tecnologias digitais impactou o tradicional equilíbrio de poder na paisagem de segurança global. Por isto, a União Europeia deve se preparar tecnologicamente diante destes novos desafios e reduzir ineficiência na capacidade operacional e dependência estratégica. O setor cibernético é considerado relevante na capacidade de defesa da União Europeia. Por isto, há as demandas por inovação cibernética.

A Comissão Europeia estuda casos de aplicações de sistemas autônomos e semicondutores para a defesa, com especial atenção para inteligência artificial e machine learning. Há a preocupação com a infraestrutura cibernética, tal como da capacidade da computação em nuvem para o propósito da defesa. Também, para a proteção de recursos críticos como investimentos diretos estrangeiros no setor de defesa. Outro ponto de atenção são os semicondutores utilizados nos equipamentos de defesa e os riscos de dependência pela falta de capacidade da União Europeia no design e fabricação destes insumos. Existem iniciativas para apoiar o desenvolvimento de startups no setor de defesa, bem como a incubação neste setor.  Há parcerias entre a União Europeia e o Conselho de Comércio e Tecnologia dos Estados Unidos. Outra parceria é entre a União Europeia e a OTAN, com atenção às tecnologias emergentes. Quer-se a atualização dos sistemas, equipamentos e serviços, a partir das novas tecnologias.  

O Fundo de Defesa Europeu tem aproximadamente 8 (oito) bilhões de euros alocados para o período de 2021-2027. Busca-se o desenvolvimento de projetos, tais como: gestão do tráfego espacial, rastreamento e vigilância espacial, serviços de navegação por satélite. No âmbito da conectividade, o objetivo é garantir comunicações governamentais seguras. Outra questão é o sistema de navegação militar a partir do sistema Galileu à prova de interferência de terceiros. Um dos objetivos estratégicos é a redução da dependência estratégica da União Europeia de semicondutores, computação quântica e inteligência artificial de outros países. Outro foco é a proteção de ativos europeus espaciais. Infraestruturas espaciais serão consideradas dual use by design. Na contenção das ameaças híbridas, há opções do Digital Services Act, Diretriz para a resiliência de entidades críticas e a atualização do Mecanismo de Proteção da União Civil. Haverá o alinhamento entre a cybersecurity e a cyber-defense. Neste contexto, encontram as medidas de segurança cibernéticas em redes 5G. Considera-se, também, os riscos e as ameaças das mudanças climáticas e os desafios para o setor de defesa. Com as mudanças climáticas há intensos movimentos migratórios em busca de alimentos e água, fator para a desestabilização e governos e riscos de guerras civis.

Pretende-se, ainda, o fortalecimento da mobilidade militar, para o deslocamento de pessoal, material e equipamentos. Deste modo, serão criadas infraestruturas de dual-use. Em estudo do Boston Consulting sobre inovações no setor de defesa Group, denominado Closing the Defense Innovation Readiness Gap, apontas as demandas para a transformação deste setor, classificando os países nas seguintes categorias: criadores e disseminadores, construtores de soluções, adotantes rápidos, desenvolvedores e especialistas. Há recomendações para mudanças na cultura organizacional do setor defesa, especialmente no campo de pesquisa e desenvolvimento de tecnologias, recrutamento dos talentos, desenvolvimento do ecossistema de defesa, organização de projetos, parceiras em pesquisa e desenvolvimento, incentivos para startups, entre outros aspectos.

No relatório, o Brasil é classificado como um adotante rápido. Estados Unidos, Rússia e China são classificados como criadores e disseminadores.[1] Para o Brasil há oportunidades geoestratégicas em aproveitar as oportunidades das inovações do setor de defesa da União Europeia, inclusive podendo participar de iniciativas e parcerias em pesquisa e desenvolvimento em produtos e serviços. Mas, um grande objetivo geoestratégico para o País é se tornar, no futuro, um líder em tecnologias de defesa, algo que contribuirá para o fortalecimento da indústria de defesa local.

** Todos os direitos reservados, não podendo ser reproduzido ou usado sem citar a fonte.

Ericson M. Scorsim. Advogado e Consultor em Direito Regulatório das Comunicações. Doutor em Direito pela USP. Autor do livro Jogo Geopolítico das Comunicações 5G: Estados Unidos, China e o Impacto no Brasil, Amazon. Autor do livro Geopolítica das Comunicações, Amazon.


[1] Schueter, Matthew e outros. Boston Consulting Group and Munich Security Innovation Board. Closing the Defense Innovation Readiness Gap, February 2022.

Crédito de Imagem: FIERGS

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Conferência de Munique sobre Segurança: alguns insights para o Brasil em suas políticas públicas

Neste final de semana (18 a 20 de fevereiro), foi realizada a Conferência de Munique sobre Segurança. Para um panorama geral dos temas debatidos há o relatório Turning the tide unlearning helplessness, Munich Report 2022, february, 2022.  Traduzindo-se superar o estado de impotência aprendida para um estágio proativo de segurança. O principal tema debatido foi o risco de invasão da Rússia ao território da Ucrânia, deflagrando-se a guerra na Europa.

Os representantes dos países participantes reforçaram a relevância da diplomacia para evitar a escalada às tensões na região. Os Estados Unidos, através de seus representantes, declararam seu compromisso de apoiar militarmente, com em conjunto com a OTAN, a defesa da Ucrânia.

A Alemanha comprometeu-se com o apoio financeiro à Ucrânia, mas não se comprometeu com a venda de armas. Diversamente, os Estados Unidos comprometeram-se com a venda de armas, através de seus parceiros na Europa. Um dos nós nórdicos subjacentes ao conflito é a dependência energética da Alemanha do gás oriundo da Rússia. Em caso de conflito entre Rússia e Ucrânia há riscos de desabastecimento de gás para a Alemanha, algo que afeta, portanto, sua segurança energética. Por isto, o tema da segurança está entrelaçado com a questão das medidas para enfrentamento das mudanças climáticas e a criação de fontes de energia renováveis, para se reduzir os riscos de dependência do gás russo. Portanto, há a conexão entre a segurança, geoeconomia e mudanças climáticas.  

O evento foi uma oportunidade para se reforçar a aliança de defesa transatlântica entre Estados Unidos e Europa. Outros temas de impacto global foram debatidos. Dentre eles, as medidas para cooperação e competição no setor tecnológico. Há desafios para a Europa quanto à sua autonomia no design de fabricação de semicondutores, componentes essenciais para diversas indústrias: automobilística, energia, transportes, defesa, comunicações, saúde, entre outros. A União Europeia buscar atrair indústria de semicondutores de Taiwan, Estados Unidos e Japão para instalarem fábricas no território europeu. Estados Unidos, Japão e Taiwan têm investimentos públicos em fábricas de semicondutores, em parceria com a indústria privada.

O tema encontra-se no campo da segurança das cadeias de suprimentos. Os investimentos em fábricas de semicondutores dependem da construção de todo um ecossistema digital e de talentos, com escala global.  Foram debatidas as medidas para a prevenção de próximas poli pandemias e os desafios quanto à fabricação de vacinas e distribuição equitativa. Um representante da Comissão Europeia apontou o problema das vacinas. Empresas europeias com fábricas nos Estados Unidos não puderam exportar para a Europa vacinas devido ao controle norte-americano para exportações, considerando-se o contexto geopolítico em torno das vacinas.

Outro tema significativo na agenda foram os debates sobre a utilização de tecnologias em campanhas de desinformação, com riscos de erosão da democracia. O ambiente digital tem sido o palco para a disseminação de movimentos autoritários contrários à democracia.  Governos autoritários têm manipulado as redes sociais em ataques contra a democracia, manobrando para fazer com que as redes sociais atuem como censor.  Movimentos autoritários buscam minar a confiança no sistema democrático. Estes movimentos buscam promover ataques cibernéticos contra jornalistas e minorias, promovendo campanhas de desinformação.  Os Estados Unidos, com seu Global Engagement Center, busca a contenção dos danos das campanhas de desinformação sobre as democracias.  A extrema desigualdade econômica é considerada como um fator de risco para a segurança coletiva dos países.

Outro tópico levantado foram  as ameaças de ataques cibernéticos contra a integridade dos sistemas eleitorais das democracias.  Debateu-se os riscos das  guerras cibernéticas e as operações cibernéticas, os quais demandam novas estratégias de defesa pelos países. Guerras informacionais são utilizadas para atacar outros países. Um dos objetivos destas campanhas de desinformação é o enfraquecimento da União Europeia, bem como da disseminação da democracia por todo o globo.  Há riscos de disrupção com operações cibernéticas de infraestrutura essenciais dos países: energia, setor financeiro, comunicações, transporte, hospitalar, entre outros. Existe, inclusive, a preocupação com riscos de disrupção dos sistemas de comando e controle das forças armadas, inclusive dos sistemas nucleares, por ataques cibernéticos. Há os riscos do ambiente informacional e cognitivo da população seja alvo de operações de influência por agentes estrangeiros, para moldar crenças, atitudes, comportamentos, decisões e ações.

A título exemplificativo, movimentos anti-vacina ganharam espaço em redes sociais, devidos às operações de desinformação. As armas cibernéticas, como inteligência artificial, robôs, deep fake, machine learning, entre outras, têm, portanto, o poder de moldar “as mentes e os corações” de uma população.

Toda uma infraestrutura de comunicações, relacionadas à cognição de uma população, pode ser alvo de operações de desinformação e manipulação da opinião pública. Há riscos com deep fakes, a partir da utilização de tecnologias de machine learning, com a imitação de voz e imagens das pessoas. Ou seja, uma falsificação digital sofisticada dificilmente detectável por leigos. Neste contexto, busca-se criar um sistema de contenção às campanhas de desinformação online.  Discutiu-se os benefícios e malefícios da computação quântica. De um lado, esta tecnologia emergente contribui o desenvolvimento de pesquisas com grandes quantidades de dados. De outro lado, a tecnologia tem o poder de quebrar sistemas de criptografia adotados nos sistemas de defesa.  No âmbito da defesa, foi apontada os novos riscos trazidos pelas armas hipersônicas. Esta nova tecnologia torna ineficaz os tradicionais sistemas de alerta e resposta tradicionais dos sistemas de defesa dos países. Outro tema debatido foi necessidade de inovação no setor de defesa, mediante investimentos em pesquisa e desenvolvimento de novos produtos, serviços e equipamentos. Sobre o tema, o Boston Consulting Group apresentou um estudo sobre inovações no setor de defesa.[1] Na Europa, há demanda pela interoperacionalidade dos sistemas de defesa. Por isto, debate-se a padronização, inclusive, dos sistemas de aquisição de armamentos e sistemas de comando e controle.

Debateu-se a atualização controle de armamentos, bem como o controle de transferência de tecnologias de defesa. No âmbito de armas nucleares, foram apresentadas algumas propostas para redução do número de armas nucleares.

Outro tema abordado foi a segurança alimentar. As mudanças climáticas e, respectivamente, o aquecimento global tem provocado movimentos imigratórios em larga escala. Para sobreviver, grandes contingentes populacionais tem buscado comida, água e recursos em diferentes lugares do planeta. As mudanças climáticas ensejaram o debate sobre a segurança ambiental. Há riscos para elevação do nível das águas oceânicas, inundando cidades à beira mar, causando o desaparecimento de ilhas, desertificação de áreas geográficas, devastação de florestas, entre outros. Existe, ainda, o aspecto geopolítico e geoeconômico por detrás das questões das mudanças climáticas. Houve o debate sobre as tecnologias sustentáveis ambientalmente para a mitigação dos efeitos do aquecimento global.

Outro ponto discutido foi a participação da liderança feminina na gestão das crises humanitárias. Outro ponto foi a aliança Indo-Pacífico no aspecto da segurança regional, bem como os projetos de conectividade digital de países como Austrália e Nova Zelândia.  Foi debatido o tema da fabricação de submarinos nucleares pela Austrália. Por fim, foi discutido as cidades e a democracia. Foram apontadas das cidades como epicentro para o desenvolvimento de programas de cidades sustentáveis e inteligentes, locais para o estabelecimento de ecossistemas digitais e incubação de tecnologias. Neste aspecto, discutiram-se as políticas de acesso, gestão e armazenamento de dados essenciais à gestão urbana.

Outro tópico debatido foi a criptomoedas e os riscos à economia e segurança. Resumindo-se: os temas debatidos na Conferência de Munique sobre segurança são transversais e têm impacto global.  A segurança e defesa está associada à segurança econômica, ambiental, alimentar, entre outros aspectos. O Brasil pode aproveitar os insights deste evento, para aperfeiçoar sua visão estratégica global, no design de suas políticas públicas de segurança e defesa, segurança cibernética, segurança na cadeia de suprimentos, política industrial e de inovação e política ambiental.

** Todos os direitos reservados, não podendo ser reproduzido ou usado sem citar a fonte.

Ericson M. Scorsim. Advogado e Consultor em Direito Regulatório das Comunicações. Doutor em Direito pela USP. Autor do livro Jogo Geopolítico das Comunicações 5G: Estados Unidos, China e o Impacto no Brasil, Amazon. Autor do livro Geopolítica das Comunicações, Amazon.


[1] Schueter, Matthew e outros. Boston Consulting Group and Munich Security Innovation Board, denominado Closing the Defense Innovation Readiness Gap, February 2022.

Crédito de Imagem: Georgia Today

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Ruídos de obras na construção de edifícios e seu impacto na vizinhança. Insustentabilidade ambiental acústica das edificações. Falhas do exercício do poder de polícia ambiental da cidade de Curitiba para o controle da poluição sonora da construção das edificações

Uma obra de construção de um edifício dura mais de doze meses. Assim, ruídos são feitos de segunda a sexta-feira, em manhãs e tardes. Há o barulho de serrilhas, martelos, bate estacas, entre outros equipamentos elétricos-mecânicos.   O padrão de construção é ineficiente acusticamente, causando a degradação ambiental sonora e gerando impactos na vizinhança. Há o vazamento dos ruídos para além da obra.  Para, além disto, ruídos afetam o bem estar, sossego e a saúde da comunidade.  Há o impacto sobre a cognição, há efeitos psicológicos e fisiológicos causados pelos ruídos. 

Também, ruídos criam a insalubridade no meio ambiente do trabalho dos operários da obra, bem como dos demais trabalhadores que trabalham nos outros condomínios.  Por isto, precisamos urgentemente de melhores padrões de construção civil, para a proteção à sustentabilidade ambiental acústica das edificações. Precisamos de um programa para a construção de edifícios inteligentes acusticamente, mediante práticas de autoregulação da indústria da construção civil. Edifícios são construídos sem nenhuma exigência pela Secretaria de Meio Ambiente de planos para eliminação, redução e isolamento dos ruídos. As práticas de construção civil são contrárias às melhores práticas de sustentabilidade ambiental e consumo sustentável no aspecto acústico. Neste sentido, estas falhas nas tecnologias de construção civil ensejam demandas por inovações tecnológicas anti-ruídos. No contexto de internet das coisas e sensores acústicos  é simples a inserção de tecnologia para o monitoramento ambiental dos ruídos das edificações. Precisamos de políticas públicas ambientais de âmbito local com metas de redução zero da emissão sonora na construção de edifícios.

A legislação de Curitiba contém alguns parâmetros para a contenção dos ruídos, para a proteção do bem estar e sossego público e a saúde pública.  É a lei nº 10.625/2002 que trata do tema.  Conforme o art. 1º: “É proibido perturbar o sossego e o bem estar público com sons, ruídos e vibrações que causem incômodo de qualquer natureza ou que ultrapassem os limites fixados na lei”. Nos termos da lei municipal, ruído é aquele “capaz de causar perturbação ao sossego público ou efeitos psicológicos e fisiológicos negativos em seres humanos e animais”(art. 2º).

Além disto, a mesma lei dispõe que compete à Secretaria Municipal do Meio Ambiente:

Art. 27 (…) I – estabelecer o programa de controle de ruídos urbanos e exercer o poder de controle de fiscalização das fontes da poluição sonora”.

Além disto, na mesma lei há previsão da competência da Secretaria Municipal do Meio Ambiente para “organizar programas de educação e conscientização” (art. 27, III). Ocorre que na prática a Secretaria Municipal do Meio Ambiente não exerce o controle dos ruídos urbanos causados na construção de edifícios. Porém, não se exige planos de impacto acústico na vizinhança, de modo a eliminar, reduzir e isolar os ruídos.

Também, não há programas para reeducação e conscientização das empresas de construção civil a respeito de sua responsabilidade quanto à adoção de programas de compliance ambiental acústico. Ora, a Organização das Nações Unidas estabeleceu como metas para o milênio programas de desenvolvimento sustentáveis, a partir de modelos de cidades sustentáveis. Dentre as metas, está a redução da poluição do ar, o que, evidentemente, se incluiu a poluição acústica, uma modalidade de poluição do ar, a qual elevada o nível de pressão sonora na atmosfera. Por outro lado, há o direito dos cidadãos à contenção dos ruídos urbanos. Há o direito à cultural à quietude residencial. Registre-se: o ambiente natural não produz barulho. Barulho é causado por máquinas.  De outro lado, há o dever dos municípios de promover ações de contenção dos ruídos urbanos, principalmente aqueles causados pela construção de edificações. A omissão do poder público pode ensejar ações de responsabilização por omissão.

Por estas razões, o Município de Curitiba precisa aplicar, na prática, urgentemente, sua legislação ambiental de modo a promover a contenção dos ruídos urbanos e a sustentabilidade ambiental acústica dos empreendimentos imobiliários.  Ruídos causados por edificações são imorais (causam danos aos outros), ilegais (violam a legislação), inconstitucionais (violam os direitos fundamentais à qualidade de vida, ao trabalho, ao descanso, ao meio ambiente, à cultura da quietude residencial, entre outros). Estes ruídos configuram o abuso e, por isto, devem ser combatidos por todos os cidadãos impactados diretamente e/ou indiretamente e pelos cidadãos comprometidos com a defesa da paisagem sonora da cidade com respeito à quietude, o bem estar público, sossego público e saúde pública.  

Resumindo-se: uma cidade sustentável ambientalmente adota políticas robustas anti-ruídos para o setor da construção civil. Se Curitiba quer ser uma cidade sustentável acusticamente precisa avançar em sua política pública de fiscalização ambiental dos ruídos das edificações, bem como promover campanhas de reeducação dos empreendimentos imobiliários para o cumprimento da legislação de contenção dos ruídos urbanos.

** Todos os direitos reservados, não podendo ser reproduzido ou usado sem citar a fonte.

Ericson M. Scorsim. Advogado e Consultor em Direito Regulatório das Comunicações. Doutor em Direito pela USP. Autor do livro Jogo Geopolítico das Comunicações 5G: Estados Unidos, China e o Impacto no Brasil, Amazon. Autor do livro Geopolítica das Comunicações, Amazon.

Crédito de Imagem: Portal T5 Blogs – A

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Cidadania ecológica acústica: o direito dos cidadãos à contenção dos ruídos urbanos

Ruídos urbanos é uma ameaça à qualidade de vida nas cidades. Representam, também, riscos à saúde pública. A propósito, o Papa Francisco em sua Encíclica Laudato Si, sobre o cuidado da comum, alerta sobre os riscos da crise ambiental, destacando-se a degradação ambiental. Segundo o texto: “o paradigma tecnocrático tende a exercer o seu domínio também sobre a economia e a política”. Propõe a aliança entre a humanidade e o meio ambiente, mediante programas de educação ambiental.  Refere, ainda, à cidadania ecológica baseada na ecologia humana. A prioridade do humano sobre o paradigma tecnocrático. E, ainda, a Organização das Nações Unidas estabeleceu como metas para o milênio na direção do desenvolvimento sustentável.

Eis os objetivos:

 “tornar as cidades e os assentamentos humanos inclusivos, seguros, resilientes e sustentáveis, proteger, recuperar o promover o uso sustentável dos ecossistemas terrestres”, “reduzir a poluição do ar até 2030;” construir infraestruturas resilientes”, “promover a industrialização inclusive e fomentar a inovação”, “promover o desenvolvimento, a transferência, a disseminação e a difusão de tecnologias ambientalmente corretas para os países em desenvolvimento, entre outros objetivos”.

Deste modo, o tema insere-se no contexto das cidades sustentáveis e inteligentes. Deste modo, a tese aqui estabelecida que a poluição acústica é uma espécie de poluição do ar e por isto é contrária às metas de desenvolvimento sustentável. Considerando-se estas premissas necessitamos de uma cultura de mudança do status quo atual patológico e tóxico de ruídos urbanos para um estado de quietude saudável. Necessitamos de uma visão da ecologia humana, integral e profunda, considerando-se a inserção das pessoas no contexto do meio ambiente natural e humano.

Alguns autores falam em desenvolvimento do self ecológico.   O objetivo é a construção de uma cidadania anti-ruídos, isto é, com a percepção dos ruídos como uma disfunção que impacta o ecossistema.  Para tanto, são necessárias medidas para a consciência situacional da comunidade a respeito do impacto dos ruídos no bem estar, saúde e meio ambiente.  Considerando-se as teorias das mudanças.  É necessária a percepção dos inputs, atividades, outputs, resultados,  para a transformação de uma comunidade e seu respectivo engajamento, em prol da inovação social ambiental.  É fundamental comparar o estado atual negativo e o estado almejado positivo. Para tanto, há métricas com a coleta  e visualização de dados e técnicas para a gestão da mudança.

Há diversos aspectos destas mudanças:

  • Primeiro, a mudança tecnológica. A substituição das tecnologias e máquinas mecânicas ineficientes acusticamente por tecnologias e máquinas eficientes acusticamente. Assim, precisamos escolher e utilizar ecotecnologias sustentáveis. Por isto, medidas para incentivar o design ecoacústico dos equipamentos elétricos/mecânicos.
  • Segundo, a mudança ambiental. A priorização da proteção ambiental da quietude urbana com a redução a zero das emissões acústicas. Neste aspecto, mapas de ruídos urbanos produzidos com a colaboração dos cidadãos podem contribuir para a conscientização do problema da poluição sonora nas cidades.
  • Terceiro, a mudança legal. A mudança na interpretação do direito de modo a se considerar a máxima proteção ao regime de direitos fundamentais: direito à qualidade de vida, o direito ao trabalho, direito ao descanso, direito ao meio ambiente, direito à cultura da quietude, entre outros.
  • Quarto, a consideração do direito à cidadania ecológica no aspecto acústico. O direito do direito à participação dos cidadãos na política ambiental, na produção, aplicação e fiscalização das normas ambientais. O direito à participação da cidadania ecológica demanda a facilitação dos meios de defesa e proteção dos cidadãos no aspecto acústico. Por isto, é necessário o acesso aos meios de prova das violações à legislação ambiental. Deste modo, são necessários procedimentos para se estabelecer a inversão do ônus da prova para facilitar a defesa pela vítima da poluição acústica. O poluidor acústico é quem deve se responsabilizar pelos custos de defesa. Uma opção é a inversão do ônus da prova, nos moldes estabelecidos pelo Código de Defesa do Consumidor.
  • Quinto, a mudança comportamental. A mudança do comportamento dos poluidores acústicos, para um comportamento de respeito aos direitos dos outros cidadãos. 
  • Sexto, a mudança educacional. Necessitamos de programas de reeducação ambiental para a conscientização dos cidadãos a respeito das melhores práticas para a sustentabilidade ambiental e consumo sustentável.

Resumindo-se: a mudança ambiental para a contenção dos ruídos urbanos é um esforço coletivo e demanda a atuação dos órgãos ambientais de modo efetivo e preventivo. Inovações tecnológicas podem contribuir para a inovação social e ambiental, para a redução da emissão sonora de equipamentos elétricos e mecânicos. Máquinas barulhentas são insustentáveis ambientalmente.  A cidadania ambiental acústica demanda ações práticas anti-ruídos. Há o direito dos cidadãos à contenção dos ruídos indoor e outdoor.

O princípio da eficiência acústica, derivado do princípio da proibição do retrocesso ambiental, princípio da prevenção de danos ambientais, cláusulas da sustentabilidade ambiental e consumo sustentáveis, entre outros, demanda o ecodesign acústico eficiente dos equipamentos elétricos/mecânicos, bem como da prestação de serviços. De outro lado, há o dever do município de adotar medidas legislativas e a atuação do poder de polícia ambiental de modo a conter os ruídos urbanos. Na hipótese de omissão municipal quanto ao controle da poluição acústica, cabe ações dos cidadãos por omissão inconstitucional e ilegal, em lesão aos direitos fundamentais à qualidade de vida, ao trabalho, descanso, meio ambiente, cultura da quietude, entre outros.

** Todos os direitos reservados, não podendo ser reproduzido ou usado sem citar a fonte.

Ericson M. Scorsim. Advogado e Consultor em Direito Regulatório das Comunicações. Doutor em Direito pela USP. Autor do livro Jogo Geopolítico das Comunicações 5G: Estados Unidos, China e o Impacto no Brasil, Amazon. Autor do livro Geopolítica das Comunicações, Amazon.

Crédito de Imagem: Site EcoDebate

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União Europeia aprova programa de incentivos à indústria de semicondutores

A União Europeia aprovou o European Chips Act, um programa de incentivos à indústria de semicondutores. Segundo a justificativa oficial, é necessário garantir a segurança no fornecimento de semicondutores, essenciais à indústria de automóveis, equipamentos médicos, defesa, segurança, agricultura, automação industrial, energia, comunicações,  entre outros, bem como para assegurar a liderança tecnológica e resiliência da União Europeia neste setor.  Além disto, semicondutores são vitais para a disseminação de redes de carros automatizados, 5G/6G, Internet das Coisas, computação em nuvem, computação na borda, entre outros.

O objetivo não é garantir a autonomia estratégica na fabricação de semicondutores, mas, ao menos, ampliar a participação da União Europeia na indústria global de semicondutores para, ao menos, 20% (vinte por cento) do total mundial.  Considera-se que a autossuficiência não é uma meta alcançável, por isto a opção por uma meta mais realista.  Deste modo, são projetados investimentos em mais de 40 (quarenta) bilhões de euros, em recursos públicos e privados, na fabricação de semicondutores. Há recomendações da Comissão Europeia para o monitoramento do ecossistema de semicondutores, para a avaliação de riscos de falta de insumos no mercado.[1] Busca-se incentivar o design e a fabricação de semicondutores, considerando-se a sustentabilidade ambiental, de modo a serem criados produtos mais eficientes do ponto de vista do consumo de energia. Neste contexto, considera-se os parâmetros de emissão de CO2 para novos automóveis, buscando-se alcançar a meta no setor de mobilidade de zero emissão de carbono.

Os semicondutores são componentes essenciais novos veículos. Haverá, ainda, procedimentos de certificações da qualidade dos semicondutores. Segundo o texto oficial, a Europa tem capacidade limitada para a fabricação de semicondutores, especialmente na faixa de semicondutores na escala de 22 nm (vinte e dois nanômetros) e acima desta faixa. Porém, a Europa não tem capacidade na faixa de semicondutores de 7 (sete) nanômetros e abaixo, dependendo de outros países do design, empacotamento e montagem. No contexto global, os Estados Unidos aprovaram o US Chips Act, com a alocação de mais de 52 (cinquenta e dois) bilhões de dólares para pesquisa e desenvolvimento, bem como fabricação de semicondutores até 2026.

A China ampliou seus investimentos em semicondutores para 150 (cento e cinquenta) bilhões de dólares até 2025. A Coréia do Sul tem incentivos para sua indústria, em pesquisa e desenvolvimento e fabricação da ordem de 450 (quatrocentos e cinquenta) bilhões de dólares.  O mercado global de semicondutores está avaliado em 550 (quinhentos e cinquenta) bilhões de dólares.  A União Europeia, portanto, diante dos riscos do cenário de tensões geopolíticas entre Estados Unidos e China, busca encontrar um caminho para a mitigação do risco de desabastecimento de semicondutores, fornecidos pelos Estados Unidos e outros países, mediante incentivos à indústria europeia.

Resumindo-se a competividade da União Europeia depende do fortalecimento de sua capacidade de investir em pesquisa e desenvolvimento e fabricação de semicondutores, para reduzir a dependência de outros países.[2] O Brasil tem muito a aprender com estas novas estratégicas da União Europeia para garantir a liderança tecnológica na indústria de semicondutores, bem como assegurar a competividade de sua economia e a mitigação dos riscos de dependência do fornecimento de tecnologias por outros países.

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Ericson M. Scorsim. Advogado e Consultor em Direito Regulatório das Comunicações. Doutor em Direito pela USP. Autor do livro Jogo Geopolítico das Comunicações 5G: Estados Unidos, China e o Impacto no Brasil, Amazon. Autor do livro Geopolítica das Comunicações, Amazon.


[1] European Comission, Brussels, 8.2.2022, Comission Recommendation on Union toolbox to address semiconductor shortages and and EU mechanism for monitoring the semiconductor ecosystem.

[2] European Comission. Brussels, 8.2.2022. Communication form the Comission to the European Parliament, the Council, The European Economic and Social Committee ant the Committee of the Region.

Crédito de Imagem: Luxemburger Wort

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Cultura estratégica da eficiência acústica no contexto das cidades sustentáveis e inteligentes

Ruídos provêm de diversas fontes em ambientes indoor (interno) e outdoor (externo). Há ruídos em condomínios (obras de construção civil, serviços de jardinagem) motocicletas e veículos, ônibus, empreendimentos imobiliários entre outros. Estes ruídos são agentes patológicos, são a disfunção patológica ambiental nas cidades. Por isto, precisamos superar esta subcultura tóxica dos ruídos, decorrentes de tecnologias mecânicas ineficientes por uma cultura da eficiência acústica.

A cultura da eficiência acústica requer a atualização das normas jurídicas, ambientais, culturais para a contenção dos ruídos. Diversas razões para evolução do direito e sua aplicação prática: a proteção das pessoas, proteção da propriedade, proteção do bem estar social e proteção ambiental. O tema é mais urgente no contexto de cidades sustentáveis e inteligentes.

sustentabilidade ambiental acústica é condição fundamental para a qualidade de vida nas cidades. O poluidor não tem o direito de poluir acusticamente a cidade. Ao contrário, o poluidor tem comportamento antissocial. A título ilustrativo de mudanças ambientais importantes: lei de proibição de consumo de cigarro em ambientes fechados, lei que proibiu a utilização de fogos de artifícios barulhentos, lei que proibiu o consumo de álcool na direção veículos, lei que exige utilização de cinto de segurança em veículos, lei que impõe a utilização da capacete de segurança em motocicletas. Todas as leis servem como símbolos de mudança cultural e jurídica para a garantia do bem estar social, segurança no trânsito e proteção à saúde pública.

No caso dos ruídos, há legislação para a contenção dos ruídos, contudo a mesma não é aplicada na prática. Falta a efetivação desta legislação.  Por isto, precisamos atualizar a legislação e incorporar as inovações tecnológicas de controle de ruídos em tempo real. Há soluções de 5G e IoT para o monitoramento ambiental. Há radares acústicos para o monitoramento sonoro dos ruídos de automóveis e motocicletas. Dados geoacústicos são essenciais para o design da polícia ambiental efetiva com resposta em tempo real às demandas dos cidadãos. Dados sonoros em tempo real podem ser coletados e analisados na formulação das políticas públicas locais.

Outro aspecto a ser considerado é a segurança jurídica com a aplicação prática da legislação anti-ruído e, consequentemente, o estado de segurança ambiental. Neste aspecto da segurança jurídica há expectativas dos cidadãos quanto à aplicação da legislação para a proteção ao meio ambiente e saúde pública.  Estudos de ecopsicologia mostram a desconexão entre os seres humanos e natureza e os malefícios para psicologia coletiva e à saúde mental.[1] Estudos revelam o inconsciente político e cultural quanto à natureza humana e o meio ambiente, uma espécie de dissonância cognitiva entre as pessoas e o meio ambiente que os cerca.

Por estas razões, é fundamental a percepção que os ruídos produzidos por máquinas comprometem a qualidade de vida, bem como a saúde pública.[2]  Estados maníacos, autodestrutivo, obsessivos e neuróticos com a utilização de máquinas barulhentas não podem prevalecer sobre o direito e à saúde humana. Esta subcultura mecânica, artificial tóxica e de contaminação acústica, não pode prevalecer sobre o habitat humano e o meio ambiente natural. Estes ruídos são tóxicos ao meio ambiente e à saúde auditiva e mental das pessoas. Por isto, precisamos de políticas ambientais efetivas para a contenção da escalada dos ruídos nas cidades. Princípios a seguir esta força tarefa anti-ruídos são: prevenção, precaução e proibição do retrocesso ambiental.

Resumindo-se: o tema comporta diversas questões complementares. Primeira questão, o aspecto tecnológico. A ineficiência da tecnologia mecânica e sua incapacidade para produzir emissão sonora de baixo impacto.  Ruídos são uma anomalia mecânica. Especialistas apontam diversas técnicas para a eliminação, redução e/ou isolamento dos ruídos. Segunda questão, os ruídos negam o bem estar público, compreendido com a expectativa de quietude nas cidades, especialmente em áreas residenciais.  Ruídos simbolizam a cultura de mal estar e não de bem estar.  Terceira questão, os ruídos são modalidade de poluição ambiental atmosférica sobre impacto sobre a saúde pública. Há diversos estudos científicos que demonstram os efeitos nocivos dos ruídos sobre a saúde humana.[3] Quarta questão, os ruídos violam os direitos de propriedade e à moradia, ao restringir a esfera de autonomia privada de proprietários e moradores. Ruídos representam uma espécie de coerção ilegal à esfera da vida privada dos proprietários e moradores. Aqui, deve ser observado o princípio da não interferência na propriedade alheia. Quinta questão, a escalada da propagação de ruídos urbanos representa o estado de ilegalidade e inconstitucionalidade  na medida em o município se omite  de exercer o poder de polícia administrativa na contenção de ruídos outdoors e indoors. Neste aspecto, o direito administrativo sancionador e o direito ambiental devem ser aplicados para a contenção dos ruídos.[4] Sexta questão, ruídos causam lesão à sustentabilidade ambiental e o princípio do consumo sustentável acústico, negando-se as aspirações quanto às cidades sustentáveis e inteligentes.

Precisamos de mudança sociais para a contenção dos ruídos em respeito à natureza original marcada pela quietude. Os desajustados, no caso os poluidores acústicos, devem se submeter à legislação ambiental.[5] O ecodesign cultural das cidades deve partir de princípios de eficiência acústica na infraestrutura urbana, com o compromisso com a sustentabilidade ambiental e consumo sustentável. Precisamos superar a subcultura de intoxicação sonora das cidades pela cultura da quietude urbana, principalmente em áreas residenciais. Afinal, cidades sustentáveis são aquelas com práticas anti-ruídos.

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Ericson M. Scorsim. Advogado e Consultor em Direito Regulatório das Comunicações. Doutor em Direito pela USP. Autor do livro Jogo Geopolítico das Comunicações 5G: Estados Unidos, China e o Impacto no Brasil, Amazon. Autor do livro Geopolítica das Comunicações, Amazon.


[1] Roszak, Theodore (Editor). Ecopsychology. Restoring the earth. Healing the mind. Berkeley, 1995.Os autores mostram as relações de vícios e insanidade com as máquinas e a destruição da natureza e do ambiente natural.

[2] Sobre a cultura das máquinas, ver: Sennett, Richard. O artífice. Editora Record, Rio de Janeiro- São Paulo, 2021.

[3] World Health Organization. Burden of disease from enviromental noise. Quantificativo of healthy life year lost in Europe. European Comission, 2011.

[4] Capra, Fritjof e Mattei, Ugo. A revolução ecojurídica. O direito sistêmico em sintonia com a natureza  e a comunidade. São Paulo: Editora Cultrix, 2018.

[5] Ogburn, William Fielding. Social change with respect to culture and original nature. New York, 1923.

Crédito de Imagem: Portal Connected Smart Cities

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A insegurança ambiental causada por ruídos urbanos em desrespeito à qualidade de vida, saúde, trabalho e meio ambiente

Vivemos em estado de insegurança ambiental causados pelos ruídos. Ruídos representam ameaças à vida, à saúde e à qualidade de vida.  Ruídos contaminam a qualidade do meio ambiente. Ar poluído por ruídos é como se fosse ar poluído com dióxido de carbono. Ruídos impactam a saúde pública. Riscos causam doenças graves.[1] Ruídos causam risco de lesão à integridade física e psicológica das pessoas.  Ruídos são uma violência contras as pessoas. São armas acústicas. Por isto, há inclusive o aspecto criminal dos ruídos previstos como o crime de perturbação de sossego público e crime ambiental. São uma agressão acústica. É uma agressão ilegal, imoral e ilegítima.  

Esta nova percepção é fundamental para a proteção adequada das pessoas.[2] O estado de insegurança é nocivo à integridade física e psicológica.  Causam danos desnecessários e desconforto acústico. Ruídos decorrem de tecnologias ineficientes e ultrapassadas e inclusive geram epidemias de poluição sonora nas cidades. A escalada dos ruídos nas cidades é um fato de agravamento de saúde pública. Além disto, os ruídos violam o direito de propriedade e a garantia da inviolabilidade do domicílio.

Ora, um dos princípios do direito de propriedade é o princípio da não interferência por terceiros contra o proprietário e sua propriedade Outro princípio que deveria presidir as relações de vizinhança é do respeito mútuo. Porém, quando o condomínio opta por serviço ruidosos, evidentemente, há o desrespeito ao seu vizinho.  O ecossistema humano é impactado pelos ruídos indoor e outdoor. Ora, os proprietários e moradores, bem como cidadãos têm expectativas quanto à proteção de sua segurança ambiental.  Há expectativas de proteção às pessoas, às propriedades e ao meio ambiente em geral e ao meio ambiente do trabalho e ao meio ambiente cultural.

No entanto, os ruídos são fonte de justiça ambiental à medida que invertem a lógica sistemática, ao prevalecerem sobre o meio ambiente humano e meio ambiente natural.  Há uma tóxica hierarquização das máquinas sobre o ecossistema humano e natural.  Por todas estas razões, os ruídos são causa de insegurança ambiental. Inovações tecnológicas podem contribuir para a contenção dos ruídos.

Tecnologias eficientes podem eliminar, reduzir e/ou isolar os ruídos. Algumas medidas podem demandar a mudança no design acústicos das máquinas, outro as podem exigir a adoção de filtros acústicos.  Especialmente, em ambiente de trabalho é necessária a garantia da segurança ambiental dos colaboradores.  Por isto, a necessidade de evolução da redução progressivas ruídos em ambientes de trabalho, para garantir o conforto acústico.  Outro ponto é a extensão da segurança ambiental acústica para fins de contenção dos ruídos decorrentes do tráfego de veículos nas cidades. Neste aspecto, há o entrelaçamento entre a segurança do trânsito e a segurança ambiental sonora.

O estado de insegurança ambiental sonora, o qual causa a poluição sonora nas cidades, devem ser alvo de políticas públicas ambientais de contenção de ruídos. Precisamos eliminar, reduzir e/ou isolar quaisquer perigos à saúde pública, entre os quais: os riscos urbanos indoor e outdoor. Profissionais das áreas de psicologia ambiental e medicina ambiental e engenharia acústica pode contribuir – e muito – para conscientização dos riscos à saúde causados pelos ruídos. Este desajuste entre as tecnologia ineficientes e barulhentas e a nova cultura de proteção ao meio ambiente, proteção ao bem estar e à saúde pública.

Resumindo-se: ruídos são o símbolo de perigo à qualidade de vida, à saúde pública e ao meio ambiente. Por isto, ruídos são o atentado à segurança ambiental, representada pelo ecossistema ecologicamente equilibrado. Meras máquinas barulhentas não podem se sobrepor ao ecossistema humano e ambiental.  Por estas razões, a necessidade de conscientização e engajamento dos cidadãos quanto responsabilização dos poluidores sonoros.

O direito à quietude em áreas residenciais, inerente ao direito de propriedade e de moradia,  não pode ser sacrificado por máquinas barulhentas. Por isto, o melhor caminho é a proibição da fabricação, comercialização e utilização de máquinas barulhentas, por representarem tecnologias ineficientes acusticamente.

Atualmente, há diversas inovações tecnológicas com capacidade para eliminar, reduzir e/ou isolar os ruídos das máquinas. É necessário, no entanto, que as autoridades responsáveis como os municípios estejam empenhados em fazer valer a política ambiental anti-ruídos.

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Ericson M. Scorsim. Advogado e Consultor em Direito Regulatório das Comunicações. Doutor em Direito pela USP. Autor do livro Jogo Geopolítico das Comunicações 5G: Estados Unidos, China e o Impacto no Brasil, Amazon. Autor do livro Geopolítica das Comunicações, Amazon.


[1] World Health Organization Europe. Burden of disease from environmental noise. Quantification of healthy life year in Europe., 2011.

[2] Sobre a mudança da percepção da realidade e, respetivamente, a mudança cultural, ver o caso da lei que proibição de fumar em ambientes fechados. Por décadas, o cigarro foi considerado como não fazendo mal à saúde. Posteriormente, verificou-se que se tratava de uma falsidade, causando danos ao fumante e às pessoas ao seu redor,  razão pela qual diversos países proibiram fumar cigarros em ambientes fechados. Resumindo-se uma lei tem o poder de mudar a cultura de um país, substituindo-se uma subcultura tóxica e insana por uma cultura saudável.

Crédito de Imagem: Portal Acústica

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Poluição sonora dos sistemas de transporte coletivo de passageiros: opções regulatórias para a contenção dos ruídos

O sistema de transporte coletivo de passageiros municipal é uma das principais fontes de poluição acústica. Por isso, a necessidade de se repensar as políticas ambientais para a contenção desta espécie de ruídos urbanos.  A mobilidade urbana deve ser refletida no contexto da política ambiental de controle da poluição acústica. Aqui, algumas reflexões a partir da análise da cidade de Curitiba.

O sistema de transporte coletivo de passageiros é reconhecido globalmente. Porém, há um aspecto não conhecido, mas que merece atenção: os ruídos causados pelo sistema de transporte coletivo à cidade de Curitiba e os danos colaterais às áreas residenciais.[1]  Ruídos são o sintoma de um aspecto de subdesenvolvimento da cidade. Em contexto de cidades sustentáveis e inteligentes fazem-se necessárias medidas para a contenção dos ruídos. E, ainda, a política de controle da poluição atmosférica adotada no contexto das mudanças climáticas deve servir de inspiração para o controle da poluição sonora do sistema de transporte coletivo de passageiros.

No Plano Diretor da Cidade de Curitiba, há algumas referências sobre o transporte coletivo de passageiros com a previsão de plano de controle de poluição veicular. Porém, na prática, não há este controle da poluição acústica causada pelos ônibus do sistema de transporte coletivo de passageiros. Quanto ao sistema viário, de circulação e trânsito há  a referência ao bem estar da população. Para além disto, obviamente o sistema de transporte coletivo deve priorizar o conforto dos usuários deste serviço público municipal. Na parte referente ao patrimônio natural, o referido Plano Diretor faz menção ao objetivo de redução gradual de emissão de poluentes nocivos à saúde lançados no ar (art. 62, inc. XXI), o monitoramento da política municipal do meio ambiente (art. 62, inc. XXIV), promoção de estudos para a gestão do ruído urbano com a garantia da saúde e bem estar social e ambiental (art. 62, inc. XXVII), promoção do conforto ambiental na cidade (art. 62, inc. XXIV).  

Na Lei de Curitiba sobre zoneamento, uso e ocupação do solo urbano (Lei n. 15.511/2019), há as seguintes diretrizes: i) equilíbrio entre o ambiente natural e o construído (art. 2, inc. III); ii) identidade da paisagem urbana (art. 2, inc. V), iii) justa distribuição dos benefícios e ônus no processo de urbanização; iv) plena interligação e eficiência das funções da cidade e v) redução das vulnerabilidades socioeconômicas e ambientais (art. 2, inc. X).  

Por todas estas razões, há diversas ações para a contenção de ruídos produzidos pelo sistema de transporte coletivo, sob responsabilidade dos municípios e das empresas de transporte.  Há técnicas para a eliminação, substituição e isolamento acústico.[2] Primeiro, há demanda pela elaboração de um mapa de ruídos urbanos do sistema de transporte coletivo, mediante a instalação de uma rede de sensores acústicos.

Segundo, em áreas predominantemente residenciais, impactadas pelo sistema de transporte coletivo de passageiro, há o direito da coletividade às medidas de mitigação dos ruídos causados pelos ônibus. Dentre as opções regulatórias: i) redução da velocidade dos ônibus; ii) a mudança da rota do transporte coletivo, com a redefinição da trajetória geográfica; iii) a adoção de metas progressivas para a substituição de ônibus de combustíveis fosséis por ônibus elétricos, mais eficientes energeticamente e acusticamente; iv) compensações ambientais aos moradores das vias públicas atingidas pelos ruídos do sistema de transporte coletivo; v) implantação de radares acústicos para o monitoramento ambiental acústica das vias expressas.

Terceiro, há o direito dos usuários do sistema de transporte coletivo às condições de conforto acústico. Por isto, a responsabilidade do município, na condição de poder concedente, em estabelecer condições de conforto acústico nos ônibus.  

Quarto, há o direito dos trabalhadores do sistema de transporte coletivo (motoristas, cobradores em estações tubo) à salubridade acústica do ambiente de trabalho.  Deste modo, o órgãos de segurança ambiental no trabalho devem  estabelecer metas para a redução progressiva do nível de emissão sonora de equipamentos elétricos/mecânicos.

Quinto, há o direito dos cidadãos à quietude urbana. O sistema de transporte coletivo não pode causar a degradação ambiental acústica. Há o direito dos cidadãos ao desfrute da paisagem natural e cultural com quietude. Precisamos eliminar e/ou conter a cultura tóxica dos ruídos urbanos, substituindo-a pela cultura da quietude.  A política ambiental de contenção da poluição atmosférica, adotada no contexto das mudanças climáticas, serve como modelo de inspiração para a contenção dos ruídos urbanos.

As inovações tecnológicas devem ser aproveitadas para a efetivação da política ambiental de contenção de ruídos.

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Ericson M. Scorsim. Advogado e Consultor em Direito Regulatório das Comunicações. Doutor em Direito pela USP. Autor do livro Jogo Geopolítico das Comunicações 5G: Estados Unidos, China e o Impacto no Brasil, Amazon. Autor do livro Geopolítica das Comunicações, Amazon.


[1] A título ilustrativo, sobre um dos impactos, ver: Zannin, Paulo Henrique e David Queiroz Sant’Anna. Ruído ocupacional em estações de ônibus. Estudo de caso em estações tubo. Curitiba – Paraná – Brasil.  R. Ra’e Ga. Curitiba, v. 37, p. 110-130, agosto/2016.

[2] Bistafa, Sylvio. Acústica aplicada ao controle do ruído. Terceira edição, revista e ampliada. São Paulo: Blucher, 2018,.

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Primeira Turma decide que não incide ICMS sobre serviço de provimento de capacidade de satélite

Por entender que o serviço de provimento de capacidade de satélite não configura uma atividade de telecomunicação, a Primeira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu que não incide ICMS nesta operação. De forma unânime, o colegiado negou provimento a dois recursos da Fazenda estadual do Rio de Janeiro que buscavam a classificação desse serviço como atividade tributável.

A Fazenda destacou que a Lei Geral de Telecomunicações prevê que o ICMS incide sobre as prestações onerosas de serviços de comunicação, e que o serviço de provimento de capacidade de satélites para outras empresas se enquadraria nesse conceito.

Segundo o relator dos processos, o ministro Benedito Gonçalves, a atividade em questão não é um serviço de comunicação, mas sim um suplemento deste.

“Os satélites disponibilizados não passam de meios para que seja prestado o serviço de comunicação, sendo irrelevante para a subsunção tributária que se argumente no sentido que há retransmissão ou ampliação dos sinais enviados”, explicou o ministro.

Na origem, a Fazenda estadual tentou a cobrança de mais de R$ 500 milhões em ICMS que seria devido pela Claro S.A pela disponibilização dos satélites Star One para o uso de outras empresas de telecomunicações.

O pedido foi rejeitado pelo Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro sob o argumento de que os satélites são meros meios disponibilizados para que outras empresas efetuem serviços de telecomunicação.

Serviço suplementar ou atividade meio

Ao analisar o recurso especial da Fazenda, o ministro Benedito Gonçalves ressaltou que a Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel), em seus diversos regramentos, não considera o provimento de capacidade de satélite como um serviço de telecomunicações.

Ele disse que a jurisprudência do STJ é clara no sentido de que serviços suplementares e atividades meio não sofrem incidência do ICMS. No caso dos satélites, explicou, estes apenas espelham as ondas radioelétricas que sobre eles incidem além de não participarem do tratamento das informações emitidas nestas ondas.

“Conforme adverte a doutrina, o terceiro que se limita a fornecer, ainda que a título oneroso, os meios necessários à fruição dos serviços de comunicação já terão cumprido seu dever jurídico com a simples disponibilização de tais meios”, comentou o ministro ao citar o professor Roque Antonio Carraza.

Benedito Gonçalves mencionou entendimento do STJ no Tema 427 dos recursos repetitivos, segundo o qual o ICMS somente incide sobre o serviço de telecomunicação propriamente dito, e não sobre as atividades-meio e serviços suplementares.

Esta notícia refere-se ao(s) processo(s):

REsp 1473550

REsp 1474142

Fonte: Superior Tribunal de Justiça (STJ).